A Revolta dos Malês
A
Revolta dos Malês foi um movimento que ocorreu na cidade de Salvador em 1835,
protagonizado por negros islamitas que, apesar de não serem escravos e de exercerem
suas profissões livremente – alfaiates, artesãos, carpinteiros – sentiam-se discriminados
por serem negros e professarem tal religião.
Com
a revolta, eles reivindicavam a aceitação da sociedade branca e cristã e a
possibilidade de ascender socialmente.
Eles
não conseguiram nem uma coisa nem outra, pois a insurreição não deu certo. Os
malês foram presos, os seus líderes mortos, e a vida seguiu em frente.
Os
malês do século 21 também são livres e exercem a sua profissão – jogar futebol –
e ao contrário dos revoltosos da época do império, têm a aceitação da sociedade,
ascendem socialmente e os signatários são mais bem providos financeiramente do que
seus pares do passado.
Entre
eles se encontram jogadores jovens, outros em fim de carreira, alguns
selecionados e outros selecionáveis, todos dispostos a lutar por direitos que
dizem respeito à sua profissão, à sua carreira e à sua saúde.
O
grupo, formado por 75 atletas, assinou um manifesto solicitando um encontro com
as federações e os clubes para discutir o calendário futebolístico do Brasil,
principalmente no que diz respeito aos chamados clubes grandes, que são aqueles
que têm uma maior quantidade de jogos para jogar e de torneios para participar.
Na
pauta, o horário dos jogos noturnos imposto pela Rede Globo, inconveniente
tanto para os jogadores como para o público que frequenta estádios.
Fazem
parte do levante alguns jogadores de grife, como Alexandre Pato, Rogério Ceni,
Alex, Zé Roberto e Juninho Pernambucano, que contam com o apoio de alguns técnicos,
como Dunga e Muricy. Felipão não se manifestou.
O
documento prevê até uma greve geral durante o mês de dezembro próximo se os insurretos
não forem atendidos, o que poderia paralisar o Campeonato Brasileiro na reta
final e colocar em risco a participação do Atlético Mineiro no Mundial de
Clubes da Fifa, em Marrocos.
Mas,
como é possível que jogadores de futebol regiamente pagos, incensados pela
mídia e supervalorizados no mercado possam se sentir escravos a ponto de se
revoltarem contra os donos do sistema?
O
problema com o calendário é que os jogadores se veem forçados a atuar até cerca
de oitenta partidas por ano, passando boa parte do tempo em aeroportos e
aviões, sem tempo para treinamentos táticos ou técnicos, para a desintoxicação
ou o repouso muscular.
Com
isso, cai o rendimento em campo, aumentam os riscos de contusão e carreiras são
encerradas precocemente.
A
CBF ainda não se manifestou, mas é bem provável que o presidente Marin aceda ao
desejo dos jogadores e se coloque à disposição para discutir o assunto (eu disse
“discutir”, não “resolver”), tentando aparar as arestas.
Alguns
dirigentes de clubes, porém, já deram a sua opinião a respeito. Para eles, “os
jogadores estão chorando de barriga cheia”.
O
problema é que o futebol se transformou em uma máquina de fazer dinheiro, com
um universo de patrocinadores, emissoras de televisão que trazem a reboque mais
patrocinadores, torneios que distribuem altas somas em dinheiro e a necessidade
de uma frequente exposição da mercadoria – os jogadores – para com isso
produzirem mais dinheiro em transações mirabolantes e nem sempre muito bem
explicadas.
E
com isso, os malês modernos acabam se tornando escravos por via indireta.