A FIFA CONTRA-ATACA
Jerome
Valcke, Secretário Geral da Fifa, voltou ao Brasil com a corda toda.
Antes
de conduzir a chatíssima cerimônia de sorteio dos grupos, ele concedeu uma
entrevista que entrou em choque com a postura politicamente correta do seu chefe
Joseph Blatter.
Blatter
vem ultimamente se preocupando em elogiar o Brasil e está engrossando a
corrente patriótica do Comitê Organizador local, buscando convencer o povo em
manifestação a curtir as férias de junho-julho aplaudindo o futebol e deixando
o quebra-quebra e o inconformismo para a época das eleições – isso ele não
disse, mas deixou implícito.
Recentemente,
em julho, Blatter chegou a derrapar ao dizer que “a entidade pode ter se
equivocado ao escolher o Brasil como sede da Copa 2014”, mas agora,
prudentemente, revê o seu discurso.
Mas,
se Blatter procura fazer o jogo do contente, Valke passou com o seu trator em
cima do protocolo e da diplomacia ao defender a Fifa das acusações que lhe são
imputadas, principalmente aquelas referentes aos gastos exagerados com a Copa.
Ele
declarou para quem quisesse ouvir que a Fifa não pode ser culpada pelos
problemas de educação, saúde e transporte público e que, portanto, as
manifestações não devem ser dirigidas contra a entidade. Acrescentou que ela não
pode ser responsabilizada pelo atraso social do país. “Este recado é para os
políticos brasileiros”, disse ele.
Ele
também declarou que nunca houve a exigência por parte da Fifa de que a Copa
fosse disputada em 12 sedes nem que novos estádios fossem construídos. Valke confirmou que a exigência era
simplesmente a escolha de 10 sedes e a reforma necessária para adequação dos
estádios existentes aos padrões da Copa, além dos detalhes comerciais de praxe.
De
acordo com o Secretário, a ideia de aumentar o número de cidades-sede, de
derrubar o Maracanã e de construir estádios novos onde talvez não houvesse
necessidade partiu dos ex-presidentes Lula – do Brasil – e Ricardo Teixeira –
da CBF. Desta forma, a Fifa não aceita que lhe seja imputada responsabilidade pelo
gasto excessivo de dinheiro público na obras da Copa ao invés de investir em
escolas, hospitais, saneamento e mobilidade urbana.
É
bom lembrar que em março de 2012, Valcke já havia jogado pesado por causa da
morosidade do andamento das obras – “As coisas não estão funcionando. Muitas
coisas estão atrasadas. O Brasil merece um chute no traseiro” – o que gerou uma
pronta reação de Aldo Rebelo, Ministro dos Esportes, que ameaçou pedir a sua
substituição no Comitê Organizador e proibir a sua entrada no país.
Enquanto
Valcke morde, Blatter assopra e exerce o papel de um homem de relações públicas
a serviço do Brasil.
No
sorteio dos grupos ele apareceu apenas no início da cerimônia e se mostrou claramente
mais preocupado em aparar arestas do que em aproveitar o deslumbramento da
ocasião, fazendo um discurso previsível no qual exortou o patriotismo do povo
brasileiro, a nossa costumeira hospitalidade e a paixão pelo futebol.
Foi,
no entanto, mais objetivo do que a presidente Dilma, que timidamente tartamudeou
o óbvio, como é do seu feitio sempre que se vê obrigada a improvisar um
discurso.
Falha
da organização, que poderia tê-la feito ler um texto redigido por um
profissional da sua assessoria, o que não chegaria a afrontar com a
informalidade do evento, mas daria um toque de legitimidade e poderia mostrar
para os olhos do mundo que o Brasil é, sim, um país sério.