O TOCADOR DE TUBA
(Excerto)
Por fim, falante e convincente como era
bem do seu feitio, Cleófas ganhou a parada e carregou consigo o pacato Josefino
para lhe mostrar o lado boêmio da vida.
E lá se foram eles para o Recanto da
Inês, onde os aguardava um punhado de mulheres prontas para socializar o
aumento repentino que Josefino teve com a mudança de cargo na repartição, junto
com uma coleção de músicas de qualidade inferior que jamais seriam tocadas por
uma tuba apaixonada, algumas doses de uísque importado do Paraguai e todo um
carrossel de emoções.
Josefino foi, viu e esqueceu o mundo lá
fora, como se tivesse atravessado um Rubicão fecundo.
Dançou com Elvira, sentou no colo de
Sandrinha, beijou Suzana, bolinou Salete, bebeu com Margarida, saracoteou com
Estela, riu das piadas de Dorotéia, deu duas notas de cinquenta para Dolores e
acabou todo manchado pelo batom de Frutuosa.
Experimentou o aperitivo da casa, bebeu
generosas doses do uísque do cavalinho, degustou moela de frango, deu uns goles
no xarope amargo de alcachofra e finalizou a alucinante noitada entornando
conhaque Palhinha na goela e na camisa suada.
Lá pelas quatro, fedendo mais do que fundo
de bar, quando o galo já ensaiava suas primeiras traquinagens vocais, Josefino
pagou a conta com um cheque ainda sem fundos para ser compensado na semana
seguinte – aí incluídas as despesas de Cleófas e toda a safra de sirigaitas, e
finalmente se lembrou de ir para casa, onde iria se defrontar com a temida
mulher, Adelina.
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Josefino sentou-se resignadamente no
meio-fio empunhando a sua tuba e, olhando com os olhos tristes para a sua casa
totalmente às escuras, resolveu fazer uma serenata para a meiga Adelina.
Ou ele entrava em casa para curar a
carraspana ou ficaria aporrinhando a comunidade com aquele som sem tom, mugindo
como um bovídeo com dor de dentes, até o sol nascer.
Era necessário tomar uma medida, então
lá se foram os vizinhos da desditosa figura socar a porta de Adelina intimando-a
para que deixasse Josefino entrar em casa mesmo que depois ela o fizesse
engolir a maldita tuba.
“Deixa ele entrar!!!” – “Não deixo!!!” –
“Deixa entrar ou arrebentamos essa merda!!!” – “Não deixo!!!” – “Deixa entrar ou
nós matamos o desgraçado!!!” – “Podem matar!!!” – e a tuba continuava troando
pela madrugada na mais pura expressão da alma atormentada do tocador.
Lá longe, já se podia ouvir o som estridente
da sirene da rádio-patrulha diligentemente convocada por algum telefonema
inteligente, para mediar a contenda.