quinta-feira, 20 de novembro de 2014






O FANTASMA DA COPA 

(ARTIGO PUBLICADO NO CADERNO “SUPER ESPORTES” DO JORNAL “O IMPARCIAL” DE 20/11/2014) 

Depois da fracassada campanha de um hexacampeonato que deveria ter acontecido, mas não aconteceu, sobraram especulações de todo tipo.
O povo demonstrou o seu descontentamento de uma maneira fúnebre. O ufanismo foi pro brejo, e sobraram nas ruas vazias o chão pintado de verde e amarelo e as bandeirolas flanando ao sabor do vento.
Na sequência, houve por parte da própria CBF a execração pública de Felipão e da psicóloga Regina Brandão, que admitiu ter havido um pânico geral no grupo de jogadores e que não soube como evitá-lo.
Adicione-se a isso que o sintoma de desconforto emocional já se manifestara através de um choro coletivo e convulsivo dos jogadores durante a execução do Hino Nacional antes do confronto com o México em Fortaleza (tal atitude foi creditada pela psicóloga ao efeito causado pelo Hino Nacional cantado à capela mesmo depois de a banda ter encerrado a parte musical).
O fato é que às vésperas da Copa os jogadores não se sentiam confiantes – o reserva Dante acaba de admitir isso – e muitos deles se confessavam assustados pela enorme responsabilidade de disputar o torneio em casa, sob a cobrança de uma torcida entusiasmada por toda a expectativa que foi gerada pelo evento.
A ausência de jogadores experientes para segurar a barra – Ronaldinho, Robinho, Kaká, sei lá – foi sentida e percebida pela comissão técnica quando já era tarde, pois a convocação já havia sido anunciada e sacramentada.
Foi Parreira, um veterano de Copas do Mundo (e não Felipão nem a psicóloga) quem detectou o problema, tão logo os jogadores se apresentaram em Teresópolis.
Ele cogitou inclusive que a seleção mudasse o local da hospedagem para um hotel, cenário ideal para jogadores acostumados a se concentrar antes de partidas pelos seus clubes, mas a CBF de pronto vetou a ideia.
Todos se lembram de que durante uma entrevista coletiva antes da estreia contra a Croácia, Parreira afirmou que o ambiente era ótimo, que a disposição dos jogadores era excelente, que o Brasil disputaria uma Copa sem problemas e que “já estávamos com uma mão na taça”.
Há alguns dias, o mesmo Parreira foi entrevistado em um canal de televisão, onde declarou que a seleção brasileira não era tecnicamente superior a alguns concorrentes nem estava psicologicamente preparada para enfrentar um desafio daquele tamanho. Ele diz que havia problemas com a organização, deixando transparecer nas entrelinhas que temia algumas seleções, como Alemanha, Holanda, Argentina, Espanha e Itália, e que aquela declaração sobre “a mão na taça” havia sido uma tentativa de injetar um pouco de ânimo nos jogadores amedrontados.
A nova seleção, agora “sob nova direção” – como costuma ser anunciado em postos de gasolina e churrascarias à beira da estrada – vem cumprindo o seu papel. Foram 6 vitórias em 6 amistosos disputados, com 14 gols marcados e apenas um sofrido, o que qualifica o ataque e também a defesa.
Por conta de uma contusão de Thiago Silva, ele perdeu a posição para Miranda e a faixa de capitão para Neymar. Voltou a ser chamado e agora é banco, mas não perdeu a mania de chorar, o que faz a gente pensar que possivelmente o baixo astral que tomou conta da melancólica seleção da Copa emanava dele.
Dunga está tentando ser político à sua maneira, mas com certeza não gostou nem um pouco da reclamação do zagueiro que chegou aos seus ouvidos através da imprensa, e declarou laconicamente que “ninguém é dono de nada” e que “cada um tem o direito de expressar a sua opinião e de assumir aquilo que fala”. Mas durante o jogo contra a Áustria, acabou colocando o chorão no lugar de Miranda e substituindo Neymar para dar ao zagueiro a faixa de capitão.
Dunga estava indo bem no comando da nova seleção e acaba de dar a primeira escorregada, o que faz estremecer a sua liderança e traz de volta o fantasma da Copa, que parecia ter sido exorcizado. O mal-estar volta a rondar a seleção.

 

 

segunda-feira, 17 de novembro de 2014





O FUTEBOL NA ROTA DO CRIME 

 (ARTIGO PUBLICADO NO CADERNO “SUPER ESPORTES” DO JORNAL “O IMPARCIAL” DE 17/11/2014) 

“A vida imita a arte muito mais do que a arte imita a vida” é uma tirada filosófica do dramaturgo, poeta, pensador e escritor irlandês Oscar Wilde feita em 1889, e pode ser analisada sob diferentes ângulos.
Hoje em dia convencionou-se dizer apenas que “a arte imita a vida”, que pode ser a antítese de Wilde, mas é a ideia que melhor se aplica à realidade.
No caso do artigo Gol de Placa, como lidamos com um tipo especial de arte (ou entretenimento, se assim o preferirem), podemos dizer que o futebol está imitando os fatos políticos e econômicos que se sucedem no país, felizmente ainda sem a mesma contundência.
Um pacote de denuncias, negações, gravações e depoimentos toma conta da vida mundana com uma frequência dinâmica, quase diária, gerando a cada investida mais denuncias, negações, gravações e depoimentos, e levando às barras da justiça figuras do mais alto escalão da República e do coração financeiro do Brasil.
Nunca antes na história deste país tantos políticos e figurões de colarinhos imaculados foram presos, algemados, cassados, expostos à humilhação e à execração pública, nunca os ministros do Supremo Tribunal tiverem que desvendar tanta sujeira e nunca caríssimos advogados daqui e dali tiveram tanto trabalho.
E o futebol, como se contaminado por um vírus invisível aos olhos, mas sensível à percepção, entra também na rota policial – denuncias, negações, gravações e depoimentos – acrescentando mais um capítulo que culmina com a exumação dos restos mortais da Portuguesa de Desportos, sepultada há duas semanas com a promessa de ressuscitar na terceira divisão em março do ano que vem.
Vale a pena lembrar resumidamente os fatos ocorridos na última rodada do Campeonato Brasileiro de 2013.
Dependendo dos resultados, um destes clubes – Portuguesa, Fluminense ou Flamengo – seria despachado para a Série B, fazendo companhia para o Náutico, a Ponte Preta e o Vasco da Gama.
O Fluminense havia vencido o Bahia em Salvador, mas não se livrou do rebaixamento porque a Portuguesa havia empatado com o Grêmio e manteve uma pontuação superior ao tricolor carioca.
Só um milagre poderia reverter a situação, e o milagre aconteceu: por ter escalado um jogador irregular, a Lusa perdeu quatro pontos e livrou a cara não só do Fluminense como também do Flamengo, que também havia perdido quatro pontos pelo mesmo motivo. 
Foi levantada na época uma hipótese fantasiosa de que a Portuguesa – ou alguém profundamente identificado com o clube – havia “vendido a vaga” por uma quantia de dinheiro que faria Judas morrer de inveja com as suas míseras trinta moedas.
A Lusa caiu, o presidente Manoel da Lupa caiu, o advogado do clube caiu, a Lusa caiu de novo, e de repente, no mar revolto das acusações surge um fato novo: uma investigação profunda e silenciosa feita pelo Ministério Público indica que o ex-presidente e alguns ex-dirigentes da Portuguesa receberam dinheiro para escalar propositalmente o meia Héverton, que estava irregular. O órgão procura desvendar agora quem pagou – e quanto – para que o clube fosse punido e rebaixado.
De acordo com o órgão federal que investiga o caso, os valores da transação podem variar entre 4 a 20 milhões de reais, e os principais suspeitos do pagamento seriam pessoas ligadas ao Flamengo e ao Fluminense, que se beneficiaram com a irregularidade cometida pela Lusa.
A investigação inclui a quebra de sigilo bancário de funcionários e ex-funcionários da Portuguesa, o que ajudaria a rastrear a origem do dinheiro.
Da Petrobras ao Canindé, existe muita gente que precisa prestar contas das suas ações, muita cadeia com a porta aberta e muita lei a ser cumprida.