sexta-feira, 12 de julho de 2019




Mais uma letra de música. Esta é uma marcha-rancho

NAMORADA 
1965
(Augusto Pellegrini)

Parques, jardins
E a praça cheia de gente
Bate o sol do mesmo jeito
Mas o tempo passou, sem sentir
Meses, semanas
Tanto encontro em tantas horas
Nos caminhos que decoram
De leveza e também noites claras
Quase brincando
Como voa a coisa boa
Que é este tempo de morena
De pequena e de passeios
Mesmo embora envelhecendo
Sem vontade

Sem saudade desmaiada
Sem sofrer nas madrugadas
Pois o encanto se supera
A cada dia e em cada tarde
Vem chegando a namorada
Nas vitrines, na calçada
Vou passando pela esquina
Vou dizendo, vou de vida
Vou de encontro, vou de brisa
Vou vencendo, indo

Vendo, chegando
Sem ter nunca que ir embora
Pelos cantos que devoram
De tristeza o restante do mundo
Vendo, chegando
E ficando, sem partida
Mesmo o tempo já passado
Em cores lindas pintou

quinta-feira, 11 de julho de 2019






A CORDA
(excerto - II)

De repente, a corda se distendeu mais do que devia e depois afrouxou. Ao mesmo tempo soou um grito, parecia uma sirene, foi se distanciando e terminou com um baque sinistro. Lá em baixo, um corpo retorcido no solo, esborrachado como um tomate.
-0-0-0-
“Eu fui pra praia sexta-feira à noite” – começa Zacarias a contar. “A noite estava clara, quente, e eu suarento. Peguei minha roupa de banho e de baixo, apanhei o ônibus e fui pra praia. Não tenho testemunhas, mas estava lá. A praia estava quente, clara, e eu suarento. Era noite, mas mesmo assim tomei um banho de mar – você já fez isso? – é uma beleza! As ondas estavam altas, a orla deserta e a água subia até o fim da areia, a lua parecia maior no seu contraste com o céu de fundo negro. Água de coco gelada, cheiro de mar”.
“Tudo estava maravilhoso, eu havia até esquecido meu apartamento com meus livros, minhas gravuras, meus anjos de porcelana, meus problemas. Mas uma armação de madeira, dessas enormes feitas para colar cartazes, trouxe-me à mente o meu drama”.  
“Estão pintando o lado de fora do edifício onde moro, onde armaram uns andaimes de madeira e corda pra acomodar os pintores com as suas tintas. Existe inclusive uma corda descendo na vertical bem em frente à minha janela. Uma corda grossa, cheia de nós, para segurar a madeira e o pintor sentado nela”.
“Fugi de casa e fui pra praia porque estou ficando maluco”, continuou Zacarias. “Cada vez que acordo à noite e olho a corda penso escutar a polícia batendo na minha porta para me levar aos berros pelo corredor cheio de eco, me atirando no elevador e depois numa cela, ditando a minha sentença”.
“Cortaram a corda, professor, cortaram a corda bem na cara da minha janela!”.  


terça-feira, 9 de julho de 2019






THE GRAMMAR BIBLE

ENGLISH IN DROPS
      Copyright Michael Strumpf & Auriel Douglas)

(ver tradução abaixo)


MRS. MALAPROP  
Writing for the magazine Smithsonian, James J.Kilpatrick added to the lore of hospital solecisms with this report.
“I commend to your patients” charts in any hospital in the nation, and you will find Mrs. Malaprop alive and well. The lode is inexhaustible.
·         “He was eating his tray, so I didn’t examine him.”
·         “For impotence, we will discontinue the meds, and let his wife handle him.”
·         “He was advised to force fluids through his interpreter.”
·         “Patient has an electric chair for transportation.”
·         “She slammed the phone down on the nurse.”
·         “When she fainted, her eyes rolled around the room.”
·         “Patient walks six blocks now. The doctor told him it may take a year to come back.”


TRADUÇÃO

SRA. DUPLO SENTIDO

Obs.: “Malaprop” significa o uso ou a combinação de palavras que podem alterar o sentido da comunicação, o que geralmente resulta em um texto engraçado e sem sentido. Assim, quando as frases forem relacionadas abaixo, nós vamos distinguir “aquilo que o autor quis dizer” de “aquilo que o leitor pode entender”.

James J.Kilpatrick (jornalista, escritor e gramático americano) ao escrever para a revista “Smithsonian” mostra uma seleção de solecismos encontrados em relatórios hospitalares.
Analisando relatórios medicos em qualquer hospital do país, você perceberá que a Sra. Duplo Sentido está sempre presente, firme e forte. Trata-se de uma coleção inesgotável de jóias da redação.

·         He was eating his tray, so I didn’t examine him.
A intenção foi: “Eu não o examinei porque ele estava almoçando”.
Mas pode ser entendido como: “Ele estava comendo a bandeja, então eu não o examinei”.

·         For impotence, we will discontinue the meds, and let his wife handle him.
A intenção foi: “Como se trata de um caso de impotência, nós vamos parar com os medicamentos e deixá-lo aos cuidados da esposa”.
Mas pode ser entendido como: Como se trata de um caso de impotência, nós vamos parar com os medicamentos e deixar que a esposa o manuseie”.

·         He was advised to force fluids through his interpreter.
A intenção foi: “Informamos ao seu intérprete que ele devia eliminar os fluidos”.
Mas pode ser entendido como: “ Ele foi aconselhado a eliminar os seus fluidos em cima do seu intérprete”.

·         Patient has an electric chair for transportation.
A intenção foi: “Para ser transportado, o paciente usa uma cadeira movida a eletricidade”.
Mas pode ser entendido como: “O paciente será transportado numa cadeira elétrica”.

·         She slammed the phone down on the nurse.
A intenção foi: “Ela desligou o telefone na cara da enfermeira”.
Mas pode ser entendido como: “Ela jogou o telefone na cara da enfermeira”.

·         When she fainted, her eyes rolled around the room.
A intenção foi: “Quando ela desmaiou, seus olhos reviraram”.
Mas pode ser entendido como: “Quando ele desmaiou, seus olhos saíram rolando pelo quarto”.

·         Patient walks six blocks now. The doctor told him it may take a year to come back.”
A intenção foi: O paciente já consegue andar seis quadras. O médico disse que ainda pode levar um ano para a total recuperação”.
Mas pode ser entendido como: “O paciente já andou seis quadras. O medico disse que pode levar um ano para ele voltar”.






domingo, 7 de julho de 2019





CHEGA DE SAUDADE
(excerto)

Agosto de 1958. Um dia que iria mudar a história do mundo...
As músicas apresentadas naquele programa da hora do almoço pela Rádio Nacional eram anunciadas na ordem inversa, começando pelo décimo até chegar ao primeiro lugar, com o locutor Hélio de Alencar gritando bem ao seu estilo: “Em décimo lugarrr – Chega de Saudade, com João Gilberto, uma novidade em primeira mão!!!”.
João Gilberto? Quem seria? Nunca tinha ouvido este nome. Que diabo de música seria essa?
A resposta veio em seguida, e a partir daí a música brasileira nunca mais foi a mesma: a flauta mágica de Nicolino Copia, o Copinha, começa a introdução que me deixa estático. Não é samba, não é choro, não é samba-choro.
O violão acompanha com uma batida nunca antes utilizada, com uma divisão estranha adornada por acordes dissonantes, funcionando como um suave acolchoado para acomodar as notas da flauta.
De repente surge a voz, intimista como Chet Baker, preguiçosa como um solo de Lester Young, clara, nítida e articulada como Sinatra, e emitida como um sopro, como a voz de Julie London, sem o menor esforço.
Pronto, acabei de ser apresentado a João Gilberto, que descobriria mais tarde tratar-se de um gênio, não devido à minha avaliação, mas a um conceito universal que regula o bom gosto musical.
Nas décadas seguintes, ele iria tomar conta do mundo e seria considerado uma unanimidade nos Estados Unidos, na Europa e no Japão, pelo seu modo de interpretar e de tocar violão. Músicos de jazz e da música standard se curvariam à sua maneira não convencional, inventiva e absolutamente discreta de mostrar a sua arte.
No Brasil, surpreendentemente, sempre existiu um divisor de águas entre aqueles que o idolatram – pela sua genialidade – e aqueles que o desprezam – quer por não entenderem seu modo de interpretar quer por estranharem sua maneira de interagir com o público.
João Gilberto é o avesso do pop-star e representa a música discreta que precisa ser ouvida em silêncio e degustada como um conhaque importado.
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Almocei às pressas o feijão da minha mãe com todos os acompanhamentos, saí de casa, apanhei o ônibus e fui até o chamado centro da cidade – Rua Barão de Itapetininga – em direção à loja Breno Rossi para adquirir no ato o disco “Chega De Saudade” (Antonio Carlos Jobim e Vinícius de Moraes), com João Gilberto, sua voz e violão em 78 rotações, selo Odeon, arranjos e direção musical de Antônio Carlos Jobim. No lado B, “Bim Bom” (João Gilberto). O LP correspondente seria lançado em 1959 incluindo outras preciosidades, como “Desafinado” (Antonio Carlos Jobim e Newton Mendonça), “Lobo Bobo” (Carlos Lyra e Ronaldo Bôscoli) e “Brigas, Nunca Mais” (Antonio Carlos Jobim e Vinicius de Moraes).
Esta é a história que, mutatis-mutandis, teve o efeito da chegada do Anjo da Anunciação para os ditos milhões de pessoas que incluem a mim, os amigos da adolescência, a galera carioca do Sinatra-Farney e do Dick Haymes-Lucio Alves Fã Clubes, Roberto Menescal, os amigos do jazz, o pessoal de Ipanema e outros bem-aventurados que sentiam estarem sendo abertas naquele momento as portas do Reino do Céu.