ORGANIZADAS NO COMANDO
E
então uma mente brilhante chegou à conclusão que o problema da violência no
futebol seria resolvido com a adoção de uma medida visceral: os clássicos
teriam torcida única. Simples assim.
Muita
gente ponderou que esta medida iria contra o espírito lúdico que cerca o
esporte por aumentar o número de restrições que em nada contribuem para melhorar
o nível do espetáculo, como a proibição de o torcedor portar bandeiras e entoar
cânticos considerados provocativos, além do veto à inocente cervejinha vendida
em copos de plástico.
No
caso da partida entre São Paulo e Atlético Nacional (da Colômbia), disputada há
uma semana no estádio do Morumbi, a presença de torcedores de apenas um clube
se mostrou inócua.
Ali
não foi aplicada a regra draconiana, nem precisava. Afinal, a torcida
adversária estava a 4.500 km confortavelmente vendo a partida pela televisão em
Medellin. Compareceram apenas uns poucos gatos pingados, uma gota num oceano de
mais de 60 mil torcedores tricolores presentes.
E
mesmo assim, o pior aconteceu.
Ao
final da partida, com a derrota dos brasileiros, houve pancadaria e corre-corre
nas imediações do estádio com direito a presos e feridos, assustando aqueles que
foram prestigiar o São Paulo, inclusive mulheres e crianças.
O
fato serve como recado ao Ministério Público que mete o bedelho onde não deve e
toma medidas equivocadas: foi um jogo de torcida única, o que mostra a
inconsistência da decisão tomada.
Mais
uma vez fica patente que o problema da violência não está atingindo exatamente os
estádios, mas as suas cercanias, ou até além, quando delinquentes comuns se
encontram em estações de metrô ou nas principais vias de acesso.
E
mais uma vez fica patente que o problema da violência não vem do torcedor, mas
sim dos fora-da-lei que constituem as torcidas organizadas, sejam de qual clube
forem. São bandidos comuns, muitos com passagem pela polícia e outros tantos
foragidos da justiça. São apenas criminosos da pior espécie travestidos de
torcedores.
Para
eles não existe a lei, e contra eles as autoridades baixam a guarda de uma
forma covarde e incompreensível.
Depois
dos incidentes da noite de quarta-feira, dirigentes e conselheiros do São Paulo
pressionaram o presidente Carlos Augusto de Barros e Silva, o Leco, para que o
clube rompesse com as organizadas, especialmente a Torcida Independente e a
Dragões da Real, as duas maiores entre as sete existentes, mas o presidente
recuou.
Sabe-se
que as torcidas organizadas gozam de prestígio junto aos clubes, como ingressos
e transporte grátis, ajuda financeira para a compra de material, entrada
facilitada para os treinos do time e local para manter uma sede dentro das
instalações dos estádios.
Além
disso, têm voz e voto nas decisões da diretoria, mesmo não estando previsto no
estatuto do clube, ajudam a eleger presidentes, nomear diretores e demitir
dirigentes e jogadores.
É
uma verdadeira Máfia que age como uma eminência parda, usando o terror como
ferramenta de trabalho, e é sabido também que muitos dos seus membros são
envolvidos com outros tipos de crime, como tráfico de drogas e afins.
Ficou
claro que o presidente Leco não quis abrir qualquer tipo de represália contra
esse bando de facínoras porque teme por si, pela sua família e pelo seu patrimônio.
Enquanto
dirigentes são reféns de bandidos e torcedores comuns têm que abdicar da ida ao
estádio, as autoridades fazem de conta que medidas idiotas como a proibição de
venda de bebida alcoólica em bares nas proximidades dos estádios e a divisão do
estádio entre as torcidas adversárias irão resolver o problema.
As
autoridades têm que fazer esses arruaceiros respeitarem a lei, colocar os
marginais na cadeia ou pelo menos mantê-los longe dos estádios nos dias de
futebol. A reincidência está demais e a população exige do poder constituído
que medidas austeras sejam tomadas para a sua proteção.
Se
diversidade de preferências, multidão ruidosa
e cerveja como descontração promovessem a violência gratuita o carnaval
brasileiro seria a maior guerra civil.
(Artigo
publicado no caderno de Esportes do jornal O Imparcial de 15/07/2016)