sexta-feira, 15 de julho de 2016





ORGANIZADAS NO COMANDO

E então uma mente brilhante chegou à conclusão que o problema da violência no futebol seria resolvido com a adoção de uma medida visceral: os clássicos teriam torcida única. Simples assim.
Muita gente ponderou que esta medida iria contra o espírito lúdico que cerca o esporte por aumentar o número de restrições que em nada contribuem para melhorar o nível do espetáculo, como a proibição de o torcedor portar bandeiras e entoar cânticos considerados provocativos, além do veto à inocente cervejinha vendida em copos de plástico.
No caso da partida entre São Paulo e Atlético Nacional (da Colômbia), disputada há uma semana no estádio do Morumbi, a presença de torcedores de apenas um clube se mostrou inócua.
Ali não foi aplicada a regra draconiana, nem precisava. Afinal, a torcida adversária estava a 4.500 km confortavelmente vendo a partida pela televisão em Medellin. Compareceram apenas uns poucos gatos pingados, uma gota num oceano de mais de 60 mil torcedores tricolores presentes.
E mesmo assim, o pior aconteceu.
Ao final da partida, com a derrota dos brasileiros, houve pancadaria e corre-corre nas imediações do estádio com direito a presos e feridos, assustando aqueles que foram prestigiar o São Paulo, inclusive mulheres e crianças.
O fato serve como recado ao Ministério Público que mete o bedelho onde não deve e toma medidas equivocadas: foi um jogo de torcida única, o que mostra a inconsistência da decisão tomada.
Mais uma vez fica patente que o problema da violência não está atingindo exatamente os estádios, mas as suas cercanias, ou até além, quando delinquentes comuns se encontram em estações de metrô ou nas principais vias de acesso.
E mais uma vez fica patente que o problema da violência não vem do torcedor, mas sim dos fora-da-lei que constituem as torcidas organizadas, sejam de qual clube forem. São bandidos comuns, muitos com passagem pela polícia e outros tantos foragidos da justiça. São apenas criminosos da pior espécie travestidos de torcedores.  
Para eles não existe a lei, e contra eles as autoridades baixam a guarda de uma forma covarde e incompreensível.
Depois dos incidentes da noite de quarta-feira, dirigentes e conselheiros do São Paulo pressionaram o presidente Carlos Augusto de Barros e Silva, o Leco, para que o clube rompesse com as organizadas, especialmente a Torcida Independente e a Dragões da Real, as duas maiores entre as sete existentes, mas o presidente recuou.
Sabe-se que as torcidas organizadas gozam de prestígio junto aos clubes, como ingressos e transporte grátis, ajuda financeira para a compra de material, entrada facilitada para os treinos do time e local para manter uma sede dentro das instalações dos estádios.  
Além disso, têm voz e voto nas decisões da diretoria, mesmo não estando previsto no estatuto do clube, ajudam a eleger presidentes, nomear diretores e demitir dirigentes e jogadores.
É uma verdadeira Máfia que age como uma eminência parda, usando o terror como ferramenta de trabalho, e é sabido também que muitos dos seus membros são envolvidos com outros tipos de crime, como tráfico de drogas e afins.
Ficou claro que o presidente Leco não quis abrir qualquer tipo de represália contra esse bando de facínoras porque teme por si, pela sua família e pelo seu patrimônio.
Enquanto dirigentes são reféns de bandidos e torcedores comuns têm que abdicar da ida ao estádio, as autoridades fazem de conta que medidas idiotas como a proibição de venda de bebida alcoólica em bares nas proximidades dos estádios e a divisão do estádio entre as torcidas adversárias irão resolver o problema.
As autoridades têm que fazer esses arruaceiros respeitarem a lei, colocar os marginais na cadeia ou pelo menos mantê-los longe dos estádios nos dias de futebol. A reincidência está demais e a população exige do poder constituído que medidas austeras sejam tomadas para a sua proteção.
Se diversidade de preferências, multidão ruidosa  e cerveja como descontração promovessem a violência gratuita o carnaval brasileiro seria a maior guerra civil.      



(Artigo publicado no caderno de Esportes do jornal O Imparcial de 15/07/2016)