FUTEBOL DE UMA SÓ
TORCIDA
(ARTIGO PUBLICADO NO
CADERNO “SUPER ESPORTES” DO JORNAL “O IMPARCIAL” DE 27/02/2015)
Nos
dias que antecederam o primeiro clássico paulista deste ano, entre Palmeiras e
Corinthians, o Ministério Público criou uma grande polêmica ao exigir que o
jogo fosse realizado com o estádio abrigando apenas a torcida do time mandante,
no caso o alviverde.
O
promotor usava como argumento que a segurança dos torcedores estaria ameaçada
com a presença de torcedores dos dois clubes, mesmo obedecendo à atual
determinação de que o time visitante somente contasse com cota de 10% dos
ingressos.
O
Palmeiras, é claro, não se manifestou, mas o Corinthians e boa parte da
imprensa bateram o pé, evocando o direito de o torcedor pagar o seu ingresso e
assistir ao jogo in loco, e acusaram o Ministério Público de estar fazendo
demagogia porque o Estado perdeu a capacidade de exercer segurança sobre
qualquer agrupamento de pessoas que exceda a uns poucos indivíduos.
Para
o Estado, a melhor forma de o cidadão ficar em segurança é ele não sair de
casa, muito embora nem isso funcione cem por cento.
O
cidadão está prejudicado no seu direito de ir e vir e de fazer as coisas mais corriqueiras,
como ir a um caixa automático, estacionar em via pública, passear num parque, sair
à noite para tomar algumas, usar o seu celular ou abrir o portão de casa.
Os
especialistas em segurança do Estado, ao invés de nos dar segurança, nos dão
conselhos ou impõem restrições ao nosso comportamento, proibindo o uso de
celulares dentro de bancos, desautorizando seguranças particulares a portar
armas, nos orientando a fazer tudo o que o bandido mandar e agora querendo
proibir a nossa ida a um estádio de futebol por causa da “violência que campeia
entre os torcedores”.
Violência
por violência, a atual conjuntura da sociedade faz ocorrer coisas estranhas:
alguns torcedores corintianos que estavam entre os 10% que tiveram seu lugar
reservado no Allianz Parque acabaram brigando entre si, sem a participação de
um palmeirense sequer.
Confrontos
também poderiam ter acontecido em frente ao estádio, nas ruas adjacentes, numa
estação de metrô ou até num ponto de ônibus a cem quilômetros do local do jogo,
porque muitos torcedores são realmente violentos, mas também porque a nossa
força policial não está preparada para fazer cumprir a lei.
A
polícia perdeu a autoridade, o cidadão perdeu o respeito e ambos perderam a
compostura.
Continuando
desse jeito, logo as nossas crianças terão que estudar em casa, porque será
perigoso ir à escola, teremos que comprar laranjas, ovos e tomates pela
internet porque será perigoso ir ao supermercado ou ao shopping, e deveremos
ter uma capela em casa para fazer as orações à guisa de igreja ou assistir à
santa missa pela televisão!
Alguns
poderão dizer que a violência é um problema mundial, citando como exemplo as
intermináveis guerras, os constantes atentados e a desvalorização do ser humano
por toda parte, mas não estou falando de manifestações políticas nem de
retaliações religiosas, apenas de futebol.
Existem
leis reguladas pela Justiça comum e pelo Estatuto do Torcedor que penalizam
agressores e baderneiros. Se forem cidadãos independentes, que se curvem à
força da lei que prevê prisão para atos de tumulto e vandalismo. Se forem
torcedores das torcidas organizadas, que sejam punidos não apenas os
desordeiros, mas também e empresa que os acoberta, inclusive os dirigentes de
clubes que lhes dão guarida.
O
que não pode acontecer é o torcedor desejar assistir a um espetáculo – como o
faria num circo ou num cinema – e ser impedido de frequentar o estádio por
causa de uma minoria de baderneiros que a segurança pública do Estado não tem
competência de controlar e punir.