sexta-feira, 1 de dezembro de 2017





O MURO

(Parte Um)

(Conto escrito para o livro “À noite, todos os gatos”, publicado em 1998)

Penso, logo existo.
A frase pode não ser original, mas retrata o meu estado de espírito.
Eu não apenas penso, mas também observo e perscruto as mazelas de um mundo desmazelado, pelo menos o meu mundo, que alcança a miserável distância de uns doze metros, incluindo o portão, com árvores frondosas tapando a minha visão periférica à direita e à esquerda, qual poderosos antolhos balançantes.
Felizmente não falo, o que me impede de incorrer em certas bobagens que já causaram o pranto, o ódio, a guerra e a discórdia desde que se vez o verbo.
Na minha quietude e discrição vejo o mundo desfilar à minha frente como se eu estivesse acomodado em um sólio sobre um palanque ou numa vitrine, analisando os espertos e os tolos, os educados e os sujos, os ricos e os pobres, pessoas, animais e objetos.
-0-
O dia de hoje amanheceu alegre, risonho e cheio de sol.
Um passarinho saltita sobre o meu lado direito, perto do portão enorme de madeira de lei, e um entregador de jornais passa pedalando a sua bicicleta.
A empregada do vizinho amontoa um punhado de folhas que caíram da árvore do lado direito durante a noite, soltas qual lágrimas tocadas pelo vento ou pela natureza.
O gordo passa bufando no seu exercício matinal antes de voltar pra casa e comer feito um abade, dois meninos e uma menina caminham para a escola, eles chutando uma lata vazia, ela apertando a mochila contra o busto liso, e o arbusto plantado há poucos dias do outro lado da rua tem que suportar o fedor do saco plástico cheio de lixo que alguém depositou ao seus pés.
Sou branco -  e aqui não cabe preconceito algum – como poderia ser rosa, azul e até amarelo, já vi alguns semelhantes à distância que eram marrom e já vi alaranjado, embora nunca tenha visto um muro pintado de preto.
Tive a sorte de ter sido cuidadosamente rebocado, pintado e retocado há apenas alguns dias, e também tive a sorte de não receber nenhum adorno medieval como cacos de vidro, pregos ou fieiras de arame farpado como numa penitenciária.
Originalmente nasci nu como todo bom nascituro que se preze, obviamente nu e mal-acabado, pois meu criador, quer por economia, quer por desconhecimento, resolveu me rechear com pedaços irregulares de tijolos e usar barro como argamassa, me deixando com aquela sensação de vazio nas entranhas e com aquela dolorosa cor de terra.
Aí então a casa foi vendida e o novo proprietário resolveu me embelezar, pois afinal tudo estava sendo pintado e retocado com a melhor das tintas e com o melhor dos apuros, incluindo a construção de caramanchões onde futuramente flores deveriam florir, e a varanda larga e espaçosa onde futuramente o chão deveria brilhar, e o gramado onde a grama deveria futuramente se alcatifar em meio a aráceas e rododendros, e então eu fui novamente pintado de branco, um branco angelical.   
Engraçado, como me sinto independente.
Ouço frequentemente falarem sobre o dono da casa, o dono do jardim, o dono do terreno e até mesmo o dono da rua, mas ninguém jamais mencionou “o dono do muro”, apesar de eu estar morando no limiar de uma moradia, defendendo a sua privacidade com a imponência de uma sentinela e ajudando a compor o visual do imóvel com o meu branco virginal.
Ah, o meu branco virginal...
Alguns dias depois que os pintores se retiraram com os seus apetrechos para outras paragens, passaram por mim dois rapazolas muito mal-encarados, desses que atraem latidos e rosnados de todos os cães de toda a vizinhança e começaram a escrever impropérios em péssima caligrafia com uma lata de tinta spray.    
Escreveram meia dúzia de palavrões, desses que a gente sente vergonha só de pensar, a filha do dono da casa leu e fingiu que não viu, embora sorrisse de si para si com uma cara de safada, a mulher do dono da casa leu e ficou indignada, mais preocupada com a opinião dos vizinhos do que com a minha moral, o dono da casa praguejou e chamou outro pintor para dar alguns retoques pensando mais em gastar pouco dinheiro do que numa restauração de verdade, e eu me senti como se sente um guerreiro ferido, vivo sim, mas com a alma cheia de cicatrizes que só o bálsamo do tempo poderá curar.

SEGUE

   





SINOPSE DO PROGRAMA SEXTA JAZZ DE 08/05/2015
RÁDIO UNIVERSIDADE FM - 106,9 Mhz
São Luís-MA

INSTRUMENTALISTS 

O mundo das gravadoras é um universo à parte, com seus segredos e seus mistérios. Algumas vezes, divergências e procedimentos internos interferem na edição de determinada sessão de gravação e muitas horas de estúdio ficam relegadas ao arquivo e praticamente proibidas de serem divulgadas para o público. O Sexta Jazz desta semana vai mostrar uma série de gravações que foram extraídas dos arquivos e compiladas em um único disco sem jamais terem feito anteriormente parte de gravações comerciais, tratando-se portanto de material inédito lançado em 1993 sem fazer parte de nenhum álbum de catálogo. O disco, prestando uma homenagem aos instrumentistas de jazz, se chamou "Instrumentalists". Entre as músicas, algumas que marcam a produção musical do estilo, como "Brownie Speaks", "Ain't Misbehavin", "Love For Sale", "Well You Needn't" e "Bag's Groove", sob a responsabilidade de instrumentistas do naipe dos saxofonistas Coleman Hawkins e Pony Poindexter, do pianista Tommy Flanagan, do guitarrista Wes Montgomery, dos trombonistas Slide Hampton e J.J.Johnson, dos bateristas Max Roach e Dave Bailey e dos trompetistas Clark Terry e Johnny Coles. Trata-se de gravações de jazz ao estilo hard-bop com pitadas de bebop como seria natural.

Sexta Jazz, nesta sexta, oito da noite, produção e apresentação de Augusto Pellegrini


quinta-feira, 30 de novembro de 2017





O ESTUDO COMO FORMA DE CRESCIMENTO

Este artigo foi escrito para os adolescentes que acham que as coisas caem do céu – e as nossas escolas estão repletas deles – e foi publicado num jornalzinho interno de uma escola de inglês. A finalidade foi despertar nos jovens leitores – embora provavelmente leitores apenas ocasionais – a extrema necessidade de se preparar para o futuro, porque muito em breve eles terão que enfrentar uma batalha entre os mais fortes. Sem a menor intenção de ter escrito outro abominável texto de autoajuda, tenho plena consciência de que este artigo é também dirigido aos adultos irresponsáveis que pensam em enriquecer apenas materialmente – certamente apostando em loterias – se esquecendo que sem um suporte cultural os novos ricos não passam de ricos idiotas. 

Certa vez, há muitos anos, mesmo sem jogar lá essas coisas eu resolvi fazer do xadrez o meu passatempo predileto.
Para tanto, combinei com um amigo para que praticássemos um pouco todo final de dia. Ele era o que se pode chamar de “um bom jogador”.
Então, diariamente, depois das cinco, as partidas se desenrolavam naturalmente e eu, é claro, perdia todas!
A coisa tomou tal dimensão e as derrotas se tornaram tão rotineiras e contundentes que eu decidi que era chegada a hora de mudar o rumo da minha história sobre o tabuleiro.  
Como Bóris – este era o seu nome – teve que viajar, tivemos uma pausa de quinze dias, tempo necessário para eu comprar dois ou três livros e começar a estudar, dedicando parte do meu tempo para as aberturas, parte para o desenvolvimento e parte para os finais de partida.
Aprendi muito com Ruy Lopez, Alekhine, Capablanca e outros mestres, e então chegou a hora de testar meu novo perfil contra o meu amigo.
Para minha surpresa – e a dele – comecei sistematicamente a ganhar as partidas, algumas até sem muita dificuldade. Após algumas derrotas, Bóris questionou o meu súbito crescimento xadrezista.  
Expliquei o que havia feito e também lhe mostrei os livros. Após as explicações de praxe, ele coçou a cabeça e declarou solenemente que iria também começar a estudar.
Este episódio, apesar de nada especial, me deixou duas lições.
Primeira, por mais que você acha que sabe, sempre existe espaço para saber um pouco mais, ou seja, somos todos ignorantes e as portas do conhecimento são inesgotáveis. “A única coisa que eu sei é que eu nada sei”, disse Aristóteles.
Segunda, quanto mais você aprimora o seu conhecimento, maiores são as possibilidades de você se tornar um vencedor. Isto acontece com o xadrez, isso acontece com qualquer matéria da vida, inclusive no que diz respeito ao aprendizado de uma língua estrangeira.  
Toda forma de estudo é primordialmente uma questão de vontade.
Diferentemente de outro tipo de estudo – química, física, biologia – que requer muita leitura, alguma memorização e uma boa dose de paciência, estudar idiomas é mais uma questão prazerosa de se manter ligado às coisas que nos cercam.  
Você aprende inglês diariamente assistindo TV, lendo cartazes, apreciando vitrines e fachadas comerciais, ouvindo música, navegando na internet ou tentando entender o manual de instruções daquele novo implemento eletrônico que você acabou de adquirir.
E tem mais: ao se integrar numa sala de aula você pratica o idioma com o professor e com os seus colegas, descobre curiosidades e particularidades de uma cultura diferente e se diverte ao descortinar coisas novas. Em outras palavras, você se diferencia do comum e se torna uma pessoa com o futuro mais resolvido e se diverte ao descortinar coisas novas, começando realmente a fazer parte do mundo globalizado em que estamos vivendo, pronto para aceitar desafios aqui ou em qualquer parte do mundo,
O negócio é não e conformar com os nossos reveses só porque aquele outro alguém está tendo mais sucesso. Temos é que estudar, qualquer que seja a forma e o método, para garantir um lugar na sociedade competitiva em que vivemos.
Foi desta forma que eu equilibrei as forças com o meu amigo Bóris.


   


terça-feira, 28 de novembro de 2017




INFINITO


Misterioso como a noite
O teu infinito
Gostaria de mergulhar
No fundo dos teus olhos

domingo, 26 de novembro de 2017




O GRÊMIO E A LIBERTADORES


Na próxima quarta-feira o Grêmio estará em Buenos Aires na busca do título da Copa Libertadores 2017. Para tanto, precisa de tão somente um empate diante do Lanús ou de perder por um gol de diferença e tentar a sorte nos pênaltis.
Com a vitória apertada sobre os argentinos na quarta-feira por um solitário 1x0, os gaúchos deram um importante passo para chegar ao tricampeonato da Copa Libertadores, podendo se igualar ao Santos (campeão em 1962, 1963 e 2011) e ao São Paulo (campeão em 1992, 1993 e 2005) entre os clubes brasileiros que venceram a competição por três vezes.
O Grêmio Foot-Ball Portoalegrense foi campeão em 1983 e 1995 em disputas contra o Peñarol (Uruguai) e Atlético Nacional (Colômbia) respectivamente.
Em 1983 a competição contou com 20 clubes de 10 países - o Brasil foi representado pelo Grêmio e pelo Flamengo (respectivamente vice-campeão e campeão brasileiro).
Naquele tempo a tabela agrupava cinco grupos de quatro times cada. No grupo do Grêmio estavam o Flamengo e dois clubes bolivianos -  Bolivar e Blooming - e o tricolor gaúcho se classificou com facilidade, abrindo cinco pontos para o Flamengo, segundo colocado.
Nas semifinais os gaúchos eliminaram o Estudiantes (Argentina) e o América de Cali (Colômbia) com duas vitórias em casa e dois empates no campo dos adversários.
A final reuniu Grêmio e Peñarol (Uruguai), com um empate de 1x1 em Montevidéu e uma vitória tricolor por 2x1 no Estádio Olímpico em Porto Alegre.  Ambas as partidas tiveram um público superior a 70 mil pessoas, sendo a partida final realizada no dia 28 de julho, data em que o Grêmio comemorava 80 anos de fundação, o que só fez aumentar a festa.
O Grêmio jogou com Mazaropi;  Paulo Roberto, Baidek e De León;  Casemiro, China, Osvaldo e Tita; Renato, Caio (Cesar) e Tarcísio, com o técnico Valdir Espinosa. 
A imagem do jogo foi a do capitão De León - zagueiro do Grêmio que havia defendido o Nacional, arqui-rival do Peñarol - erguendo a taça com a testa ensanguentada. Os gols brasileiros foram anotados por Caio, aos 10 minutos de jogo, e Cesar aos 31 minutos do segundo tempo, cinco minutos depois dos uruguaios terem empatado.
Em 1995, doze anos depois, o Grêmio conquistaria a sua segunda Copa, numa competição com 21 clubes, repetindo a fórmula de 1983, mas incluindo o campeão do ano anterior. O Brasil foi representado pelo Grêmio (campeão da Copa do Brasil) e pelo Palmeiras (campeão brasileiro).
A tabela novamente agrupava cinco grupos de quatro times cada. No grupo do Grêmio estavam o Palmeiras e o Emelec (Equador) e as três equipes se classificaram. O quarto time era o El Nacional (Equador), que foi eliminado nesta fase.
 A fase final se constituiu de um mata-mata com 16 clubes se eliminando a partir de uma tabela com 8 jogos. Na sequência, o Grêmio eliminou o Olimpia (Paraguai) com duas vitórias, o Palmeiras, no saldo de gols, com uma vitória e uma derrota , e o Emelec, com uma vitória e um empate.
Nas duas partidas finais o Grêmio se defrontou com o Atlético Nacional, vencendo a primeira partida no Estádio Olímpico, em Porto Alegre, por 3x1 e empatando a segunda por 1x1 no Estádio Anastasio Girardot, em Medellin, Colômbia.
O título veio com um gol de pênalti assinalado por Dinho aos 40 minutos do segundo tempo. Os heróis da jornada foram Danrlei; Arce, Rivarola, Adilson e Roger; Dinho, Luís Carlos Goiano e Carlos Miguel; Paulo Nunes, Jardel e Arilson, com o técnico Luís Felipe Scolari. 
Além do Santos e do São Paulo, ambos tricampeões e do Grêmio, bicampeão na busca pelo terceiro título, o Brasil possui outros nove títulos que são: Cruzeiro (1976 e 1997), Internacional (2006 e 2010), Flamengo (1981), Vasco da Gama (1998), Palmeiras (1999), Corinthians (2012) e Atlético Mineiro (2013). São 17 títulos, 7 a menos que os argentinos, que têm 24, e 9 a mais de o Uruguai, que tem 8. Os outros países vêm bem abaixo: Colômbia e Paraguai têm 3 conquistas, Chile e Equador tem apenas uma cada um e Peru, Bolívia e Venezuela nunca venceram o torneio.