sábado, 6 de dezembro de 2014






FUTEBOL – NEGÓCIO OU ESPETÁCULO? (PARTE I) 

(ARTIGO PUBLICADO NO CADERNO “SUPER ESPORTES” DO JORNAL “O IMPARCIAL” DE 04/12/2014) 

Nos meados do século 19, o futebol era simplesmente uma competição esportiva. Jogava-se pelo prazer de praticar o esporte e pelo prazer ainda maior de vencer o adversário.
Naquele tempo, pouca gente acreditava que essa diversão pudesse algum dia despertar tanto interesse no público, mas na medida em que isto foi acontecendo, as pessoas começaram a acreditar no esporte como disputa e a investir na parte financeira, construindo estádios fechados – onde poderia haver cobrança de ingressos – e mais tarde na profissionalização dos atletas.
Com o tempo, surgiram novas fórmulas para fazer do futebol um exercício lúdico e ao mesmo tempo um entretenimento popular que, como tal, deveria gerar receita, assim como acontecia no teatro e nas tabernas.
Descobriu-se enfim que o futebol poderia se constituir num excelente negócio, desde que fossem proporcionados espetáculos incentivando a presença do público, quer pela rivalidade entre as equipes, quer pela qualidade da exibição.
Com o passar do tempo, a organização e o mercantilismo cresceram a tal ponto que infelizmente os dirigentes deixaram de preservar a matéria prima – os atletas – em nome de uma desenfreada busca de fortuna para cobrir os custos milionários da competição e, é claro, embolsar muito dinheiro.
Assim, ao mesmo tempo em que se desenvolvem em todo o mundo os torneios domésticos nas suas várias formas e categorias, as Confederações procuram cada vez mais incrementar a quantidade de amistosos entre seleções que, ao reunir os melhores jogadores de cada país, lotam os estádios, mas privam os clubes da sua presença.
Há cerca de um ano, alguns jogadores começaram no Brasil um movimento rebelde chamado Bom Senso F.C., que visa entre outras coisas reduzir o excesso de trabalho a que eles são expostos, pois muitos atletas atuam duas a três vezes por semana sem tempo para desintoxicar a musculatura ou preservar a condição física. Alguns não chegam a ter um mês de folga durante as férias.
Agora, embora por outras razões, esta conscientização começa a chegar aos clubes.
As datas Fifa foram criadas para que as seleções nacionais disputem amistosos a fim de que a Fifa e as Confederações envolvidas embolsem um bom dinheiro através dos patrocinadores e dos governos que bancam os custos de cachê, viagem, hospedagem e prêmios de delegações inteiras, a ponto de dois vizinhos – no caso Brasil e Argentina, recentemente – se deslocarem dezoito mil quilômetros para se enfrentarem na China!
Trata-se de uma logística absurda que inclui o desgaste de uma viagem aérea cheia de escalas, a diferença de fuso horário, e a exposição dos jogadores a contusões devido ao cansaço muscular e a gramados de má qualidade.
Nesse negócio, as Confederações ganham muito e os clubes só perdem.
Perdem porque continuam a pagar o salário do jogador mesmo quando ele está a serviço da seleção, perdem porque sempre entregam o jogador em boas condições físicas com o risco de recebê-lo contundido e perdem porque continuam jogando as suas partidas oficiais desfalcados dos jogadores que estão servindo a seleção.
Nesse ponto, os clubes perdem duas vezes, pois o interesse do público torcedor fica reduzido com a ausência dos craques, causando queda na arrecadação, e porque enfraquece o seu poder de fogo, correndo o risco de perder pontos importantes para a sequência do torneio que estão disputando.
Em outros países, as Federações e Ligas tomam o cuidado de suspender os jogos locais nas tais datas Fifa, a fim de não prejudicar os times que estão cedendo graciosamente seus jogadores para que essas entidades possam lucrar. 
Mas no Brasil o calendário futebolístico ainda é um caso de polícia.

 

  

 

 

 

 

segunda-feira, 1 de dezembro de 2014





TWITTER COM PAGODE 

 (ARTIGO PUBLICADO NO CADERNO “SUPER ESPORTES” DO JORNAL “O IMPARCIAL” DE 01/12/2014) 

Algumas pessoas não concordaram com o teor do meu artigo escrito no mês passado e intitulado “O fantasma da Copa” por acharem que eu estou implicando demais com o zagueiro Thiago Silva, capitão da seleção derrotada na última Copa e que agora está tendo mais uma chance com Dunga.
Em primeiro lugar, quero deixar bem claro que considero Thiago Silva um jogador de raros predicados técnicos, e que tanto a sua convocação como a sua efetivação como titular pelo então treinador Felipão foi absolutamente justa.
Obviamente, o que aconteceu com a seleção não foi culpa dele. O que ocorreu foi uma série de circunstâncias que acabaram por tê-lo como pano de fundo, não apenas por ele ser considerado um dos pilares da equipe como também – e principalmente – porque era o capitão do time.
Ocorre que a seleção tremeu quando não devia, chorou na hora errada, demonstrou fraqueza de ânimo quando mais precisava se fortalecer e culminou com o apagão geral na goleada contra a Alemanha na semifinal. Depois, ao perder o terceiro lugar para a Holanda, houve desacerto e apatia, sem dúvida provocado pela goleada desanimadora contra os alemães.
E no centro de tudo faltou a presença de Thiago Silva, que ao ostentar a braçadeira de capitão, deveria ter colocado os nervos da equipe no devido lugar, e fez exatamente o contrário.
Mas a minha crônica anterior mostra meu desapontamento contra a atitude tomada por Thiago não pelo desencontro dos malfadados 7 x 1, mas pela falta de humildade e de inteligência ao reclamar agora publicamente da posição de reserva e da consequente perda da faixa de capitão nesta nova era da seleção.
A seleção pós-Copa pretende juntar os cacos, fazer uma faxina geral, arejar o pensamento e reconquistar a posição que o Brasil merece aos olhos do mundo, devidamente credenciado por cinco títulos mundiais.
As coisas estão caminhando bem com o novo comando da seleção, e é preciso preservar o bom ambiente e o companheirismo entre os atletas. Ao reclamar intempestivamente, Thiago Silva mostrou falta de respeito ao comandante Dunga (responsável pela convocação e escalação dos jogadores), ao jogador Miranda (que vem fazendo um papel fundamental no bom desempenho da zaga brasileira, que passou mais de 500 minutos sem sofrer gol), ao atual capitão Neymar e, de resto, a todo o elenco.
A história é pródiga em situações que mostram humildade e respeito.
Campeão mundial e capitão do Brasil em 1958, Hideraldo Luís Bellini foi substituído na Copa seguinte pelo seu reserva Mauro Ramos de Oliveira. Mauro herdou em 1962 não só a posição como também a faixa de capitão, e Bellini jamais reclamou da reserva na conquista do bicampeonato.
Ainda em 1958, o endeusado Djalma Santos teve que se conformar em ser reserva de De Sordi, tecnicamente inferior, mas jamais fez qualquer queixa ao treinador Vicente Feola ou alguma reclamação aos companheiros. Por linhas tortas, Djalma Santos acabou jogando a final, conquistou o título e foi eleito o melhor lateral do torneio mesmo tendo atuado apenas 90 minutos!
Capitão que se preza não se desespera nem mostra desalento como fez Thiago Silva em mais de uma partida da Copa 2014.
Capitão que merece a braçadeira impõe a sua liderança nos gestos, nas palavras e nas atitudes.
Ainda na Copa 1958, o maestro Didi – que não era o capitão – mostrou como se faz.
Quando o Brasil tomou o primeiro gol da Suécia, dona da casa, ele colocou a bola debaixo do braço, caminhou calmamente até o meio do campo, pôs os nervos da equipe no lugar, e comandou uma goleada por 5x2, sem maiores sustos.  
Talvez Thiago Silva e muitos outros jogadores sequer saibam quem foram Bellini, Mauro, Djalma Santos, De Sordi ou Didi, mas um pouco de cultura e história do futebol pode ajudar muito mais do que simplesmente ficar curtindo twitter com pagode na concentração.