quinta-feira, 19 de junho de 2014





A COPA E AS COISAS QUE A TV NÃO MOSTRA


ARTIGO PUBLICADO NO CADERNO “SUPER ESPORTES” DO JORNAL “O IMPARCIAL” DE 19/11/2014

 

Dentro do campo de jogo, a Copa brasileira está sendo um notável espetáculo de participação popular.
O problema é o que acontece nos bastidores de uma festa que deveria ser perfeita, dado o investimento feito, mas que peca na organização como se fosse uma simples quermesse de bairro.
O Brasil não é pioneiro nessa esculhambação – isso já aconteceu, por exemplo, na África do Sul – mas de qualquer forma isto não é desculpa para que os problemas sejam aceitos sem discussão. Afinal, está em jogo o falado “padrão Fifa” e a promessa de que esta seria “a Copa das Copas”.
No estádio da abertura faltou energia elétrica durante certo tempo, caiu a internet e não havia rede wi-fi para comunicação. Lá mesmo um problema hidráulico inundou o vestiário visitante, e os torcedores que estavam nas arquibancadas móveis foram aconselhados a não exagerar na vibração porque a estrutura não parecia confiável.
Em Natal, a Arena das Dunas foi aberta para o público sem a liberação do Corpo de Bombeiros, o que seria uma irresponsabilidade se não estivéssemos em um país onde laudos parecem ser simples formalidades. Quase todos os estádios ainda têm algum acabamento para ser feito e a famosa área do entorno continua mantendo o aspecto de um canteiro de obras.
Assim, se nas chamadas quatro linhas as coisas vão se sucedendo com muita animação (embora com algumas decisões arbitrais bastante discutíveis), com espetáculos que passam muita emoção desembocando em um número de gols acima da média, a gente começa a perceber que sobram problemas na outras dependências dos estádios.
Os serviços “padrão Fifa” deixam a desejar, desde a dificuldade para conseguir entrar no estádio até a falta de refrigerante, cerveja e comida. Os voluntários responsáveis pelo abastecimento das cabines de transmissão e das salas dos jornalistas parecem ter sido mal treinados e demoram horas para providenciar um simples copo de água mineral – sem dúvida muito necessária para ajudar a espantar o calor de quase trinta graus na maioria das arenas.
Constatou-se no Itaquerão que quem comprar ingresso para uma determinada parte das arquibancadas móveis terá apenas 25% de visão do campo de jogo, tendo que se contentar em admirar uma frondosa viga de concreto. 
Do lado de fora das chamadas arenas e das áreas mais ou menos delimitadas para a circulação do público torcedor, manifestantes continuam tentando chamar a atenção da imprensa internacional, a polícia continua reprimindo, as prisões acontecendo e o discurso segue confuso.
As manifestações misturam greves por melhores salários com reivindicações políticas, mas já estão perdendo o apoio da população, que começa a demonstrar cansaço e deseja retomar a liberdade de locomoção e acabar com os transtornos que a situação está causando. Como a imprensa, preocupada com a festa de sons e cores que se desenrola em função do evento, não está mais dando muita cobertura ao movimento, a tendência é acontecer um certo esvaziamento nos protestos.
As manifestações poderão crescer depois que a febre do torneio terminar, mas nesta altura do campeonato parece ser bastante inócuo, para não dizer estúpido, sair quebrando tudo empunhando faixas com dizeres “Não vai ter Copa” ou “Fora Fifa”.
Nas cidades sede, alheios a tudo isso e devidamente protegidos por uma muralha que separa os dois Brasis – o da festa e o do protesto – turistas fantasiados e extrovertidos se confundem com os brasileiros que querem aproveitar este momento único e procuram se divertir e deixar a tristeza pra lá, mesmo quando as suas seleções não vão bem ou ficam dando vexame.
Há uma intensa vibração pela Copa e pelo copo e uma grande preocupação das autoridades para que nada de anormal ocorra durante o período, principalmente com os turistas.
Enquanto isso, a seleção brasileira vai empatando com o México deixando o torcedor com a pulga atrás da orelha. Uma pulga do tamanho de um elefante.

segunda-feira, 16 de junho de 2014







COMEÇOU A GRANDE FESTA DO FUTEBOL
 

(ARTIGO PUBLICADO NO CADERNO “SUPER ESPORTES” DO JORNAL “O IMPARCIAL” DE 16/11/2014)

 

Foi dada a largada para a maratona da Copa, e vamos ter um mês inteiro mesclando euforia e choradeira, críticas e elogios, surpresas e constatações.
A festa do futebol é grande, e os estádios lotados com gente de todas as raças e todas as camisas são prova disso. Tradicionalmente, como ocorre em todas as Copas, os torcedores, sejam amigos ou adversários, se respeitam e confraternizam, numa demonstração que o esporte pode – e deve – ser um catalizador de energias positivas.
O colorido dos estádios e o alarido produzido pela massa em festa traduzem a importância do espetáculo. É como um carnaval fora de época com maior duração, que tende a ficar mais e mais vibrante na medida em que as fases são ultrapassadas, adquirindo um sabor especial se o Brasil continuar caminhando rumo à final.
Por isso, há que se separar o aspecto lúdico e esportivo desta competição do que acontece do outro lado do muro, como passeatas, desordem pública e repressão policial.
Eu sou um apaixonado pelo futebol e acompanho a Copa do Mundo desde 1954 (em 1950 participei timidamente da tristeza da família). A transmissão era precariamente feita pelo radio e a emoção ficava por conta do que passavam os locutores.
Em 1958 o radio ainda foi o grande responsável pelo sentimento dos torcedores, mas eles já se aglomeravam em praças públicas ao redor de painéis sonoros.
Em 1962, dada a proximidade do Chile, onde se realizava o torneio, as partidas eram gravadas em vídeo-tape e as fitas eram despachadas por avião para serem mostradas na televisão dois dias depois dos jogos. Em branco e preto.
Somente em 1970 tivemos a alegria de assistir aos jogos em tempo real – alguns poucos ungidos conseguiram ver a Copa em cores! – e isto colaborou para a grande festa proporcionada pela torcida que foi presenteada com o título.
A partir daí aconteceu uma evolução tecnológica que chega aos dias atuais com transmissões diretas de todas as partidas para todos os lugares do mundo, um verdadeiro banquete para quem gosta de futebol.
A Copa do Mundo possui uma magia toda especial, pois reúne as melhores seleções do mundo – pelo menos aquelas que sobreviveram à dura prova das Eliminatórias – e também os melhores jogadores, com exceção daqueles que se lesionaram ou que atuam em países que não estão presentes.
Sendo um torneio de curta duração a ordem é errar o mínimo possível nestas primeiras rodadas, pois uma derrota pode custar a possibilidade de seguir adiante. Aqui conta tudo, sejam os pontos obtidos, seja o saldo de gols.
A Copa do Mundo é pródiga em surpresas, podendo castigar os favoritos e reabilitar os desacreditados. Por isso os detalhes são tão importantes.
E tudo tem que funcionar à perfeição. Os jogadores têm que se doar ao máximo, mas dosar as energias e o físico para não caírem de produção, os técnicos têm estudar cada detalhe do adversário a ponto de transformar o jogo numa partida de xadrez, e as disputas de bola devem ser viris, mas não violentas, buscando preservar a integridade dos atletas.
As arbitragens também são um fator importante e ponto de equilíbrio no desenvolvimento sadio da competição.
Por isso, erros absurdos como os que aconteceram nos dois primeiros jogos são inconcebíveis e mostraram que o tão exigido “padrão Fifa” está passando longe deste quesito. Na abertura, o Brasil foi claramente beneficiado e ganhou o jogo por conta disso. No segundo jogo, o México foi claramente prejudicado e deixou de estabelecer um saldo de gols que lhe poderá fazer falta mais adiante.
Uma competição esportiva não pode ter a sua credibilidade manchada por absurdos cometidos por profissionais a quem foi entregue a responsabilidade de arbitrar de acordo com as regras. Infelizmente a Fifa candidamente apenas admite que errar é humano, justifica as barbaridades cometidas pelos trios de arbitragem e o barco segue navegando em águas plácidas como se nada tivesse acontecido.