sábado, 19 de dezembro de 2020

 


AS CORES DO SWING          
          (Livro de Augusto Pellegrini)

CAPÍTULO 22 - RESUMO DA DISCOGRAFIA

Benny Goodman (1909-1986)
            Nome completo – Benjamin David Goodman
            Nascimento – Chicago-Illinois-EUA
            Falecimento – Nova York-New York-EUA
            Instrumento – clarinete

Comentário – Benny Goodmam, notável bandleader, já era músico profissional aos treze anos, e despontava como um clarinetista prodígio, interpretando com a mesma facilidade as músicas de jazz originárias do sul dos Estados Unidos como as partituras clássicas de compositores eruditos. Ainda criança, Benny aprendeu música numa sinagoga, e mais tarde, adolescente, ele tocou em orquestras, em programas de rádio e nos palcos da cidade, participando inclusive de gravações com cantoras de renome, como Bessie Smith e Billie Holiday. Ele tinha dezesseis anos quando ingressou na orquestra de Ben Pollack, e aos vinte já havia participado de muitas gravações de sucesso. Foi quando decidiu tentar a sorte em Nova York como músico freelancer. Depois de realizar muitos trabalhos de estúdio ou de apoio, Benny resolveu formar a sua primeira orquestra em 1930. A data coincidiu com o início da “Era do Swing”, da qual ele veio se tornar a maior sensação, conforme atesta o título de “Rei do Swing” que em 1935 lhe foi outorgado pelos críticos, admiradores e outros músicos. Goodman foi um dos primeiros bandleaders que misturou na mesma orquestra músicos negros e brancos, mantendo sob o seu comando expoentes do jazz como Lionel Hampton, Teddy Wilson, Harry James e Gene Krupa. Goodman comandou indistintamente tanto uma grande orquestra quanto pequenos combos, e em ambos os casos valorizou o swing de uma maneira decisiva para que o estilo viesse a atravessar décadas. Benny Goodman foi também um dos responsáveis por tornar o jazz popular em locais onde este gênero de música não tinha penetração, depois de se apresentar no Teatro Carnegie Hall, normalmente utilizado para óperas, concertos eruditos e peças teatrais. Finalmente, foi um dos maiores responsáveis pela “swingmania” que tomou conta do país, ao mesmo tempo em que conduzia uma orquestra profundamente jazzística. Manteve-se musicalmente ativo desde 1920 até 1970.

 

Alguns dos principais músicos que participaram da orquestra – Bunny Berigan (trompete), Charlie Christian (guitarra), Charlie Shavers (trompete), Ernie Caceres (sax-barítono), Gene Krupa (bateria), Harry James (trompete), Jess Stacy (piano), Lionel Hampton (vibrafone), Lou McGarity (trombone), Louie Bellson (bateria), Nick Fatool (bateria), Teddy Wilson (piano), Vernon Brown (trombone), Ziggy Elman (trompete), Zoot Sims (sax-tenor).

 

Resumo da discografia (gravações no período de 1926 a 1949)

 

A Jazz Holiday (Walter Melrose)

After You’ve Gone (Turner Layton-Henry Creamer)

All The Cats Join In (Eddie Sauter-Alec Wilder-Wolfe Gilbert)

And The Angels Sing (Ziggy Elman-Johnny Mercer)

Blue Room (Richard Rodgers-Lorenz Hart)

Blue Skies (Irving Berlin)

Bluebirds In The Moonlight (Leo Robin-Ralph Grainger)

Bugle Call Rag (Jack Pettis-Billy Meyers-Elmer Schobel)

China Boy (Dick Winfree-Phil Boutelje)

Don’t Be That Way (Benny Goodman-Edgar Sampson-Mitchell Parish)

Down South Camp Meeting (Fletcher Henderson-Irving Mills)

Fascinating Rhythm (George Gershwin-Ira Gershwin)

Flying Home (Sid Robin-Benny Goodman-Lionel Hampton)

Have You Met Miss Jones? (Richard Rodgers-Lorenz Hart)

Honeysuckle Rose (Fats Waller-Andy Razaf)

I Cried For You (Abe Lyman-Gus Arnheim-Arthur Freed)

I Got Rhythm (George Gershwin-Ira Gershwin)

I’ve Got A Gal In Kalamazoo (Mack Gordon-Harry Warren)

Jersey Bounce (Robert Bruce-Buddy Feyne-Edward Johnson)

June Is Bustin’ Out All Over (Richard Rodgers-Oscar Hammerstein II)

Let’s Dance (Gregory Stone-Joseph Bonime)

Make With The Kisses (Johnny Mercer-Jimmy Van Heusen)

Memories Of You (Eubie Blake-Andy Razaf)

Night And Day (Cole Porter)

On The Alamo (Isham Jones-Gus Kahn)

One O’Clock Jump (Count Basie)

One Sweet Letter From You (Leslie Clarke-Harry Warren)

Ridin’ High (Cole Porter)

Roll ‘em (Mary Lou Williams)

Runnin’ Wild (Joseph Grey-Leo Wood-Arthur Gibbs)

Seven Come Eleven (Benny Goodman-Charlie Christian)

Sing, Sing, Sing (Louis Prima)

Slipped Disc (Benny Goodman)

Stealin’ Apples (Fats Waller-Andy Razaf)

Stompin’ At The Savoy (Benny Goodman-Chick Webb-Edgar Sampson)

Sweet Georgia Brown (Ben Bernie-Maceo Pinkard-Kenneth Casey)

Sweet Lorraine (Carter Burwell-Mitchell Parish)

Teach Me Tonight (Sammy Cahn-Gene DePaul)

Them There Eyes (Maceo Pinkard-WilliamTracy-DorisTauber)

Three Little Words (Bert Kalmar-Harry Ruby)

Tiger Rag (Nick LaRocca-Tony Sbarbaro-Eddie Edwards-Henry Ragas-Larry Shields)

Why Don’t You Do Right (Kansas Joe McCoy)

You Turned The Tables On Me (Sydney Mitchell-Louis Alter)

 

 

quinta-feira, 17 de dezembro de 2020

 


CALUDA!
(Augusto Pellegrini)

Bom dia!
Diz a cliente matutina
E é prontamente atendida
Pela esperta manicure
Simpática e prestativa

Depressa!
Cuida dos meus pés primeiro
E vem a imersão quentinha
No líquido emoliente
Os dois pés dentro da tina

Zoada!
As mulheres que conversam
Num volume muito alto
São gralhas impertinentes
Cacarejando no ambiente

Cultura!
A incansável manicure
Lê alta literatura
E faz uso das palavras
Que o bom português apura

Caluda!
Pensa alto a manicure
É um pensamento sonoro
Que lhe escapa de repente
Ao contemplar o pé da cliente

Grosseira!
Grita a cliente ofendida
Achando que tal palavra
Fora a ela dirigida
E foi queixar-se ao gerente

Burrinha!
Pensa o gerente consigo
Entendendo toda a trama
Mas em nome do negócio
Pede desculpas à dama

Canalha!
A manicure está tensa
Pois pensava que ele fosse
Explicar o acontecido
Mostrando o mal-entendido

Que coisa!
Murmuram as outras clientes
Frente ao fato inusitado
Sem entender coisa alguma
Do que tenha se passado

Camões!
A manicure pede ajuda
Sempre creu no bom falar
Pois a palavra “caluda”
Significa “silenciar”

Paciência!
Murmura então com tristeza
Estou onde não devia
Isto é um salão de beleza
Não reunião da Academia

 

Dezembro 2020

 

 

 


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AS CORES DO SWING
            (Livro de Augusto Pellegrini)

CAPÍTULO 22 - RESUMO DA DISCOGRAFIA

Durante a apresentação deste livro, o leitor teve contato com vários nomes de band leaders que ajudaram a construir a história do swing desde os seus primórdios até a sua consolidação. Estes band leaders e seus músicos fantásticos se tornaram uma parte importante da história da música norte-americana e mundial e contribuíram com a sua arte para o sucesso, o crescimento e o cultivo do jazz no âmbito nacional e internacional.

É justo que o leitor tenha informações mais precisas a respeito destas pessoas, das gravações realizadas e do trabalho feito por esta equipe de artistas – bandleaders, compositores, letristas, arranjadores, e intérpretes. A maioria das gravações abaixo relacionadas ocorreu dentro do período compreendido entre 1920 e 1940, mas existem registros que se estendem até o final da década de 1950, quando o swing já havia sofrido transformações.

A lista está dividida, separando as orquestras que tiveram um impacto maior dentro da história do swing das que de alguma forma acompanharam a tendência, embora não tenham sido predominantes para o estabelecimento do estilo (e que nem por isso devem ser consideradas menos importantes).

Como todos os músicos aqui relacionados possuem o mesmo valor histórico, não estamos estabelecendo qualquer ordem de importância ou prioridade na sequência de cada lista. Estes artistas, que com a qualidade da sua música contribuíram para a alegria de uma nação e de milhões de aficionados ao redor do mundo, estão aqui registrados em ordem alfabética, de acordo com o seu primeiro nome.

Cada orquestra tem uma infindável quantidade de músicas gravadas. Estamos, portanto, limitando a lista a algumas gravações mais conhecidas, que também foram colocadas em ordem alfabética, com a inclusão do nome dos compositores – músicos e letristas.

Finalmente, como o swing apareceu em função de um estilo de jazz orquestrado que existiu antes da (e durante a) transposição dos anos 1920 e 1930, e como este jazz orquestrado é a célula mater do outro jazz orquestrado que o sucedeu após os anos 1950, nada mais justo e correto do que trazer informações também sobre algumas orquestras pré e pós-swing, como o leitor verá abaixo.

Portanto, algumas bandas que interpretavam o dixieland, a música de salão, o bebop e o jazz progressivo também estão sendo relacionadas ao lado das big bands de swing, sem prejuízo do conteúdo.

No entanto, orquestras de cunho romântico ou sinfônico, como as de Andre Kostelanetz, David Rose, Frank Chacksfield, Frank De Vol, Frank Pourcel, George Melachrino, Glen Gray, Leroy Anderson, Les Baxter, Mantovani, Mitch Miller, Otto Cesana, Paul Mauriat, Paul Weston, Percy Faith, Victor Young e Waldo de los Rios, e outras big bands que faziam o estilo mais popular como Bert Kaempfert, Billy Vaughan, Helmut Zacharias, Henry Jerome, Henry Mancini, Herb Alpert e Lawrence Welk ficaram fora desta lista pela sua menor proximidade com a história do jazz e com os seus elementos.

Resta explicar que a última revisão do texto foi feita em 2020. Isto se torna relevante na medida em que as minibiografias abaixo descritas citam alguns ícones que ainda se encontravam vivos na época da revisão.

As orquestras mais influentes

ARTIE SHAW (1910-2004) 

Nome completo – Arthur Jacob Arshawsky

Nascimento – Nova York-New York-EUA

Falecimento – Thousand Oaks-Califórnia-EUA

Instrumento – clarinete

 

Comentário – Dizem os biógrafos que Artie Shaw provavelmente não tenha alcançado um lugar mais elevado entre as big bands de jazz por causa da sua personalidade oscilante. Após gravar a música “Begin The Beguine” em 1938, ele tinha tudo para assumir o lugar de Benny Goodman na preferência popular, mas não conseguiu manter a orquestra tocando regularmente, pois costumava encerrar abruptamente as suas atividades para reiniciar com uma nova equipe alguns meses depois. Sua instabilidade emocional também se revelou na vida particular. Desde pequeno, Shaw se mostrou muito inquieto, embora fosse bastante disciplinado quando o assunto era música: tocava clarinete e sax-alto com perfeição e estreou na orquestra dançante de Johnny Cavallaro aos quinze anos, em 1925, para mais tarde tocar com a banda de Austin Wylie e finalmente ingressar na Irving Aaronson’s Commanders em 1930. Shaw trabalhou com pequenos conjuntos até que montou a sua famosa orquestra em 1938, para em questão de semanas se destacar no cenário nacional. Muito charmoso e elegante, Shaw foi casado oito vezes, sempre com mulheres belíssimas – entre elas, as atrizes de Hollywood Lana Turner, Ava Gardner e Evelyn Keyes e a novelista Kathleen Winsor. Durante a Segunda Guerra Mundial, ele levou a orquestra a se apresentar no front do Pacífico para ajudar na motivação dos soldados. Em 1952, dois anos antes de encerrar precocemente as atividades de bandleader, Artie Shaw escreveu sua autobiografia, também precoce, pois foi escrita aos quarenta e dois anos, intitulada “Trouble With Cinderella” (Encrencas com Cinderela), na qual ele conta os problemas de relacionamento com todas as ex-esposas até então. Artie Shaw manteve-se musicalmente ativo durante os anos 1930 até os anos 1950, e depois disso apenas esporadicamente concordava em se apresentar em público para um evento musical ou uma entrevista.

 

Alguns dos principais músicos que participaram da orquestra – Al Cohn (sax-tenor), Bernie Glow (trompete), Billy Butterfield (trompete), Buddy Rich (bateria), Dave Tough (bateria), Dodo Marmarosa (piano), Don Fagerquist (trompete), George Auld (sax-tenor), Hot Lips Page (trompete), Jimmy Raney (guitarra), Johnny Guarnieri (piano), Ray Conniff (trombone), Roy Eldridge (trompete), Sy Zentner (trombone), Tony Pastor (sax-tenor), Zoot Sims (sax-tenor).

 

Resumo da discografia (gravações no período de 1936 a 1946)

 

All Things You Are (Oscar Hammerstein II-Jerome Kern)

Any Old Time (Artie Shaw)

April In Paris (Vernon Duke-Edgar “Yip” Harburg)

Back Bay Shuffle (Teddy McRae-Artie Shaw)

Begin The Beguine (Cole Porter)

Concerto For Clarinet (Artie Shaw)

Cross Your Heart (Buddy DeSylva-Lewis Gensler)

Dancing In The Dark (Howard Dietz-Arthur Schwartz)

Deep In A Dream (Eddie De Lange-Jimmy Van Heusen)

Deep Purple (Peter DeRose-Mitchell Parish)

Don’t Take Your Love From Me (Henry Nemo)

Frenesi (Alberto Dominguez-Leonard Whitcup)

Hindustan (Harold Weeks-Dave Wallace)

How Deep Is The Ocean (Irving Berlin)

I Get A Kick Out Of You (Cole Porter)

I’ll Remember April (Don Raye-Gene DePaul-Pat Johnson)

In The Still Of The Night (Cole Porter)

Indian Love Call (Oscar Hammerstein II-Otto Harbach-Rudolf Friml)

It Had To Be You (Gus Kahn-Isham Jones)

I’ve Got You Under My Skin (Cole Porter)

Just Kiddin’ Around (Ray Conniff)

Let’s Walk (Artie Shaw-George Siravo)

Jungle Drums (Charles O’Flynn-Carmen Lombardo-Ernesto Lecuona)

Moonglow (Eddie DeLange-Irving Mills-Will Hudson)

My Blue Heaven (George Whiting-Walter Donaldson)

My Heart Belongs To Daddy (Cole Porter)

Night And Day (Cole Porter)

Nightmare (Artie Shaw)

Nobody Knows The Troubles I’ve Seen (tradicional)

‘S Wonderful (Cole Porter)

Smoke Gets In Your Eyes (Otto Harbach-Jerome Kern)

Sometimes I Feel Like A Motherless Child (tradicional)

Stardust (HoaglandHoagy” Carmichael-Mitchell Parish)

Summit Ridge Drive (Artie Shaw)

Temptation (Arthur Freed-Nacio Herb Brown)

The Continental (Herbert Magidson-Con Conrad)

The Donkey Serenade (Rudolf Friml-Herbert Stothart-Bob Wright-Chet Forrest)

Yesterdays (Otto Harbach-Jerome Kern)

You Do Something To Me (Cole Porter)

What Is This Thing Called Love? (Cole Porter-Jerry Gray)

 

quarta-feira, 16 de dezembro de 2020

 


UMA AVENTURA DE NATAL

(Augusto Pellegrini) 

Nem bem tinha fechado os olhos quando o relógio o despertou.

Dez e meia da noite.

O sono lhe fora pesado e curto.

Os dias de tensão, as noites de vigília, a semana inteira ordenando as ideias, cigarro após cigarro pensando na noite de Natal, na importância da noite de Natal, no presente de Papai Noel.

Pensou em ficar ainda mais um pouco deitado, dormitando, bem agora que o corpo havia encontrado a posição ideal, nenhum mosquito pra incomodar, aquela preguiça, aquela lassidão.

Mas não podia, queria, mas não podia, o dever gritava nos seus ouvidos – hoje é noite de Papai Noel!

Ergueu-se como uma mola.

Se continuasse deitado iria dormir de novo, iria perder a hora e então, adeus sonho, adeus Papai Noel.

No canto, amarfanhada, a roupa vermelha e uma ridícula barba branca.

Dentro da cabeça a expectativa crescendo, tremendo, fremindo, nesta noite de pura emoção. Outro cigarro aceso.

Lá fora, a grande noite, o céu estrelado, o vento brando, alguns foguetes espocando aqui e ali, prenúncio de uma grande noite de Natal.

Aqui, a túnica vermelha com alguns fios esgarçados pelo uso, os apliques brancos, a bota preta precisando de uma demão de graxa. No canto, dependurada num prego na parede, a barba branca continuava sorrindo aquele sorriso sem boca, aquele sorriso de Papai Noel.

Aos quarenta e dois anos, mais do que nunca, ele acreditava em Papai Noel. E nunca Papai Noel lhe fora tão importante, nunca marcara sua vida com tanta tinta como nesta noite de Natal, como uma pintura impressionista.

Olhou as horas e analisou o conteúdo do saco. Tudo certo.

Lá fora um cachorro late, e ouve-se ao longe o som melódico de canções de Natal tocadas com harpa paraguaia, meio fora de moda, gosto duvidoso.

Onze e quarenta e cinco. Está na hora de sair.

Puxa o saco não tão pesado para os ombros e levanta os olhos para o teto como se mirasse a abóboda da Capela Sistina, pedindo aos céus que esta noite fosse, de fato, a noite mais feliz da sua existência.

Aproxima-se da porta.

Então, o vendaval.

A porta se abre para dentro com um estrondo, o mundo desabando sobre a sua cabeça, as estrelas da Sistina dançando ao seu redor, homens gritando, armas, mãos para o alto, “quieto, se não quiser morrer!”

Papai Noel com as mãos na parede, somente agora ele notou que tinha se esquecido de calçar as luvas, os olhos esbugalhados, o suor escorrendo por dentro da barba, o rim doendo pela pancada da coronha bem manejada, no rosto o ricto doloroso.

“Tá preso, assaltante safado!”

O plano havia sido descoberto.

No chão, o saco revirado mostra algumas ferramentas, algumas folhas de jornais velhos, uma pistola trinta e oito, dois rolos de esparadrapo, uma bomba caseira de má fabricação e seu amuleto da sorte, uma ferradura de verdade com uma fita vermelha amarrada num dos furos.

O cachorro ainda late, mas agora se ouve o Messias de Händel.

Batem as badaladas da meia-noite na noite de Natal.

Na esquina, próxima ao edifício de um banco imponente, todo revestido de mármore preto, um rapaz está encostado ao poste. Ajeita o boné para frente e enfia a mão no bolso, nervosamente. Olha para os lados atentamente, como um gato.

A uns cem metros, ao lado de uma placa de estacionamento proibido, junto ao meio-fio pintado de amarelo, dentro de um carro escuro, dois homens se questionam – “não está na hora? – e fumam impacientes, a fumaça toldando o espelho retrovisor.

Em frente ao banco passa vagarosamente um outro rapaz, disfarçando alguma coisa, olhando para os lados, ansioso. Consulta o relógio sob a luz do poste, os sinos batendo e os ponteiros se encontrando.

Todos estão esperando por Papai Noel.

Ao longe, os sinos continuam repicando, se confundindo com o som da sirene que se aproxima.

 

 

 

 

terça-feira, 15 de dezembro de 2020

 

                                  Foto: John Mc Laughlin e Chick Corea


AS CORES DO SWING
            (Livro de Augusto Pellegrini)

CAPÍTULO 21 - O NEO SWING
            (final)

Por trás da inventividade do neo-swing e das bandas que mesclam techno e swing sem o menor pudor existe um embrião muito forte, concebido no início dos anos 1970: as “rock big bands”.

Num determinado ponto da história do jazz, durante os anos 1970, começou a inevitável fusão do jazz com o rock.

Esta fusão teve várias e diferentes direções.

Uma delas penetrava diretamente no mundo dos instrumentos eletrônicos ou sintetizados. A semelhança com o rock era conceitual, e se limitava à parte da melodia e dos arranjos. Ao contrário do que normalmente acontece com o rock, este tipo de jazz-rock não previa um cantor.

O núcleo desta música possuía elementos estruturais do jazz, com fortes pinceladas de rock.

Este estilo, denominado “fusion”, utilizava instrumentos eletrificados e originou grandes intérpretes, como Jean-Luc Ponty, Chick Corea, John McLaughlin, Weather Report, Jeff Beck e Pat Metheny, e modificou a trajetória de alguns jazzistas como Miles Davis, Herbie Hancock, Larry Coryell e Stanley Clarke.

A outra direção apontava para um rock que abdicava do seu som ácido e agrupava sob o mesmo denominador comum instrumentos eletrônicos e acústicos convencionais, produzindo um som forte e vigoroso, e criando uma harmonia peculiar sem comprometer a musicalidade.

Adicionou-se a voz áspera e cortante do vocalista, que era revestida de blues, mas transmitia um bocado de agressividade, o que dava à música um tom de rebeldia, que é uma parte integrante da essência do rock.

Neste caso, o núcleo da música possuía elementos estruturais do rock, com fortes pinceladas de jazz.

As rock big bands foram uma consequência direta desta forma de fusão, e conseguiram unir dois públicos que caminhavam em direções opostas, por professarem filosofias diferentes, embora baseadas na mesma origem – o blues.

As principais bandas responsáveis por este fenômeno foram Blood, Sweat & Tears, comandada pelo cantor David Clayton-Thomas; a Chicago, que possuía uma pegada mais pop, liderada pelo cantor Peter Cetera; a Dreams, mais jazzista, liderada pelo baterista Billy Cobham e pelo trompetista Randy Brecker; Pink Floyd e seu rock psicodélico: ou ainda Frank Zappa e Soft Machine, que economizaram nos metais, mas mantiveram o mesmo padrão.

Com as rock big bands ficou garantida uma continuidade no desenvolvimento do jazz orquestrado, onde big bands aparentemente convencionais começaram a utilizar as tendências e os elementos do rock and roll e da música popular contemporânea da época.

A passagem das rock bands para as bandas de neo-swing foi apenas uma questão de tempo, pois ambas possuíam a mesma proposta e eram cultivadas pelo mesmo tipo de público.

Para aqueles saudosistas que já haviam se conformado em lamentar a morte do swing, o neo-swing trouxe uma injeção de estímulo e uma sensação de volta ao passado. Pode não ser a mesma coisa ter ouvido Count Basie nos bons tempos de Kansas City e ouvi-lo agora com uma roupagem diferente, mas tudo não passa de uma questão de costume.

Com o tempo, os novos ouvidos e os seus humores irão se rendendo aos poucos à novidade, e a descoberta de um novo riff ou de uma menção estilizada de uma passagem que havia se tornado inesquecível poderá tranformar um saudosista teimoso num novo swingster convicto.

Para os ainda renitentes sempre restará o recurso de se trancar no quarto, usar a sua aparelhagem de som ou programar uma música com a orquestra da sua preferência, fechar os olhos e se transportar para o mundo mágico dos salões. Ou procurar num vídeo ou num registro do youtube alguma coisa que possa fazê-los retornar no tempo. Ou ainda então ingressar no admirável mundo novo do swing revival.

É sempre possível sonhar, pois como dizia Duke Ellington, a música não é mais do que um sonho.

 

segunda-feira, 14 de dezembro de 2020

 


DÚVIDA
(Augusto Pellegrini)

Com um olho aprova, com outro fulmina
Maldita sina

Com um pé me segue, com outro me chuta
Me catapulta

Um olho me vê, outro me nega
E não me enxerga

Uma mão me afaga, outra me espanca
E me desbanca

Um braço abraça, outro me empurra
Me trata às turras

O peito suspira e arrota forte
O bafo da morte

O olhar me adula, o olhar condena
À pesada pena

Sorri de amor, sorri de escárnio
Riso do diabo

O gesto benze, o semblante enxota
Me vê de costas

Sinto paixão, sinto ódio intenso
Mas me convenço

Que o lado certo, o lado primeiro
É o que me cabe

E o lado segundo, reles e imundo
É o que não vale

Inconsequente, só vejo aquilo
Que me interessa

E em meio à dúvida tiro proveito
Do que me resta.  


 


SINOPSE DO PROGRAMA SEXTA JAZZ DE 28/12/2018
RÁDIO UNIVERSIDADE FM - 106,9 Mz
São Luís- MA

RICHIE VITALE - VITALOGY

Seguindo uma linhagem de trompetistas que marcaram a história do instrumento nas páginas do jazz, Richie Vitale, um veterano de 64 anos, mostra todo o seu estilo e faz o hard-bop renascer com toda a sua pompa em pleno século 21. Vitale apresenta seu novo trabalho neste álbum chamado Vitalogy - um jogo de palavras entre o seu próprio nome e a palavra latina "vita" (“vida”) – numa clara analogia ao brilho e à alegria da interpretação dos músicos do seu quinteto. A história de vida de Richie Vitale inclui uma passagem pelo grupo de Miles Davis e Philly Joe Jones e incursões com os iluminados Frank Sinatra, Tony Bennett, Buddy Rich, James Taylor e Sting, sem contar seus bem-sucedidos shows na Broadway e inúmeras turnês pela Europa, Japão, Coréia e Oriente Médio. Neste álbum, o grupo executa seis músicas de autoria do próprio Richie Vitale, gravadas em estúdio no Brooklin-Nova York em setembro de 2011.       

Sexta Jazz, nesta sexta, oito da noite, produção e apresentação de Augusto Pellegrini

                                                                                                                                    

domingo, 13 de dezembro de 2020

 


AS CORES DO SWING
            (Livro de Augusto Pellegrini)

CAPÍTULO 21 - O NEO-SWING
            (continuação)

A banda Big Bad Voodoo Daddy, comandada por Scott Morris (cantor e guitarrista) e Kurt Sodergren (baterista e percussionista), tem uma pegada caribenha. Gravou alguns álbums importantes como “Big Bad Voodoo Daddy”, “This Beautiful Life” e “Save My Soul”, e emplacou algumas músicas em paradas internacionais, como ”Mambo Swing”, “Go Daddy O”, “You And Me And The Bottles Makes Three Tonight”, “Why Me?” e “Mr. Pinstripe Suit”.

A banda Cherry Poppin’ Daddies é comandada pelo cantor e guitarrista Steve Perry, pelo baixista Dan Schmid, e pelo tecladista Dustin Lanker. Possui entre os seus álbuns “Ferociously Stoned”, “Rapid City Muscle Carr”, “Soul Caddy” e o mais recente White Teeth, Black Thoughts”, e chegou às paradas com os singles “Zoot Suit Riot”, “Drunk Daddy”, “Brown Derby Jump”, “The Babooch” e a tradicionalíssima “Fly Me To The Moon”. Seu estilo é bastante swingado.

A banda The Royal Crown Revue, é comandada pelo cantor Eddie Nichols e pelo saxofonista-tenor Mando Dorame. Gravou diversos álbuns, entre os quais “Kings Of Gangster Bop”, “Mugzy’s Move” e “Passport To Australia”, sendo conhecida pelas músicas “Barflies At The Beach” (uma versão adaptada de “Sing Sing Sing”), “Hey, Pachuco”, “Inner City Swing”, “Zip Gun Bop” e por uma leitura moderna de “Something’s Gotta Give”.

A banda The Squirrel Nut Zippers, comandada pelo cantor e guitarrista James “Jimbo” Mathus e pela cantora, banjoísta e tocadora e ukelele Katharine Whalen, tem registrados os álbuns “The Inevitable” e “Hot”, e alguns singles de sucesso, como “Hell”, “Evening At Laffite’s”, “Put A Lid On It”, “Lover’s Lane” e “The Suits Are Picking Up The Bill”. A banda tem uma pegada que remete ao som do jazz tradicional dos anos 1920, e toca com bastante humor e competência.

Lavay Smith é uma cantora de jazz e blues que formou a banda Red Hot Skillet Lickers e ingressou no swing revival com dois álbuns que emplacaram nas paradas, “One Hour Mama” e “Everybody’s Talkin’ ‘Bout Miss Thing”, apresentando as músicas “Big Fine Daddy”, “Gee, Baby, Ain’t I Good To You?”, “Everybody’s Talkin’ ‘Bout Miss Thing” e as velhas “Blue Skies” e “Between The Devil And The Blue Sea”. O grupo praticamente não utiliza recursos eletrônicos, sendo mais voltado para o jazz convencional e para o blues, e a voz de Lavay possui a marca das grandes cantoras de swing.

The Brian Setzer Orchestra, comandada pelo guitarrista Brian Setzer, que congrega vinte e dois músicos, possui diversos álbuns de qualidade, apresentando um swing com a marca do rhythm & blues. Entre eles se destacam “The Brian Setzer Orchestra”, “Boogie Woogie Christmas” e “Wolfgang’s Big Night Out”, e as músicas “Jump Jive And Wail” “Stray Cat Strut”, “Rock This Town”, “We Are The Marauders” e a velha conhecida “In The Mood”, numa versão cantada.

A banda Ingrid Lucia and The Flying Neutrinos é original de Nova Orleans. Comandada pela cantora Ingrid Lucia e pelo trombonista e cantor Todd Londagin, ela se diferencia das demais por voltar a sua inspiração aos tempos do jazz estilo new orleans, conforme atestam os seus álbums “I’d Rather Be In New Orleans”, “Live In New Orleans” e “Child Hotel” executando com arranjos próprios, num estilo tradicional, músicas já consagradas como “Bourbon Street Parade”, e outras menos antigas como “Mr Zoot Suit”, “Getting Some Fun Out Of Life”, “They Play Jazz In Heaven” e “Sunny Afternoon”. Ingrid Lucia possui o timbre e a sensualidade que fazem lembrar a malícia e a languidez de Billie Holiday.

O neo-swing e o swing revival se espalharam de costa a costa nos Estados Unidos, e a exemplo do modelo original, também pela Europa e resto do mundo. Existem diversas cadeias de rádio especializadas que podem ser ouvidas pela Internet e é atualmente – estamos falando de 2015 – um importante ingrediente para quem procura diversão de uma forma similar àquela dos seus avós.

Da mesma forma que o Cotton Club, o Alhambra ou o Savoy Ballroom produziam e abrigavam os seus espetáculos musicais e dançantes por volta de 1930, outros locais especializados na produção deste novo swing estão atualmente atraindo verdadeiras multidões.

Do lado leste de Nova York estão o The North River Bar e o Live Psychic, e do lado oeste está o badalado Sullivan’s. No Don Hill’s e no Coney Island High os mais tradicionalistas podem dançar o neo-swing exibindo exatamente os mesmos passos do lindy hop.

Muitos outros logradouros se transformaram em ponto de encontro e diversão dos swingsters e dos neo-lindyhoppers, entre os quais se sobressaem o New Village Gate, o Louisiana Community Bar & Grill, o Rodeo Bar, o Irving Plaza e o Le Bar Bat, colocando no mesmo barco universitários bem comportados, jovens da geração grunge, casais de meia-idade, homossexuais, frequentadores do Harlem, financistas de Wall Street, apreciadores da dança, noctívagos, viciados e bêbados em geral.

Na Califórnia, os principais clubes que abrigam o novo swing são o Bimbo’s 365 Club, o Pearl’s, o Café du Nord, o Enrico’s, o Moe’s Alley e o Hi-Ball Lounge em San Francisco, e o The Derby, o The Baked Potatoe, o Whisky a Go Go e o House of Blues em Los Angeles. Em Chicago, o jazzófilo parceiro da noite pode escolher entre o Hide Out, o Constellation, o Katerina’s ou o Andy’s Jazz Club. Entre outros.