ENTREVISTAS, PAINÉIS E SALTO ALTO
ARTIGO PUBLICADO NO
CADERNO “SUPER ESPORTES” DO JORNAL “O IMPARCIAL” DE 09/11/2014
Os
dias que antecedem uma Copa do Mundo são de uma intensa chatice jornalística,
pois não há nada mais complicado do que relatar o anteclímax de um evento.
A
imprensa se alimenta de fatos, e quando os fatos inexistem ou estão escondidos
resta apenas a especulação, que todos procuram evitar, pois o risco de praticar
o antijornalismo é muito grande se o profissional atentar apenas para os boatos e as meias-verdades.
Na
falta do que fazer, as emissoras de televisão estão juntando o útil ao
agradável – embora inútil e desagradável para os telespectadores na maioria das
vezes – apresentando longas e entediantes entrevistas com os jogadores.
O
contrato das emissoras com a CBF obriga a entidade a disponibilizar as suas
celebridades cujas entrevistas são mais ou menos direcionadas pelo assessor de
imprensa Rodrigo Paiva. Obriga também as emissoras a fazer a cobertura, se não
para informar, pelo menos para mostrar a logomarca dos patrocinadores,
estrategicamente colocadas num painel amarelo como pano de fundo.
Assim,
o telespectador pode entrar em contato visual com os responsáveis pela
transmissão das partidas da Copa. E dá-lhe Guaraná Antártica, Vivo, Banco Itaú,
Volkswagen, Sadia, Nestlé, Mastercard, Samsung, Gol, Seguros Unimed, Extra,
Gilette e Nike, cada qual responsável por uma gorda fatia do faturamento da
Fifa, da CBF e das emissoras.
É
bom que fique claro para todos que ao declinar estes nomes o autor deste artigo
não tem acesso a nem um tostão da verba e que faz menção a eles somente para
que o leitor possa imaginar o custo x benefício das fastidiosas entrevistas.
Nas
primeiras delas foram entrevistados Felipão, seu escudeiro Murtosa e o
coordenador Parreira, que encheram a bola dos jogadores afirmando que o Brasil
ganhará a Copa. Depois veio o médico Doutor Runco com a sua entourage tratando
os jornalistas com casca e tudo – alguma coisa tinha que sobrar da era Dunga.
Só depois os jogadores foram comparecendo, aos pares, dia após dia.
Entrevistas
deste tipo não acrescentam nada a quem quer realmente saber sobre as coisas do
futebol. Os mesmos repórteres fazem sempre as mesmas perguntas e os atletas dão
sempre as mesmas respostas pasteurizadas.
É
como se fosse um ritual ensaiado onde não faltam afirmações sobre o ânimo das
atletas, o clima de amizade existente entre eles, a confiança no “professor” e
nos resultados positivos para a conquista do título e o respeito aos
adversários. E não podia mesmo ser diferente, até porque para a maioria dos jogadores
faltam o brilho e a eloquência discursiva e sobram recomendações para que roupas
sujas não sejam lavadas em público – caso as roupas precisem mesmo ser lavadas,
que o sejam no mais íntimo recesso da concentração, de preferência com a
participação apenas dos envolvidos e dos seus chefes.
As
declarações dos jogadores são sempre os mesmos e manjados chavões, restando ao
torcedor uma réstia de esperança de que algum deles tropece e fale alguma coisa
fora do script. Mas, entrevistas e painéis à parte, parece ser impossível que
não se instale na concentração um clima de oba-oba, pois o entra-e-sai de
pessoas ligadas aos patrocinadores, de astros da televisão, familiares e
ex-jogadores faz com que a concentração crie um ar de descontração,
transformando tudo em uma grande desconcentração.
Segurar
a taça antes do tempo e comemorar os gols antes deles ter saído pode ter um
efeito muito negativo.
Está
faltando a observância de uma regra que sirva para todos – dirigentes,
jogadores e até alguns jornalistas mais engajados: evitar o perigoso discurso
do “já ganhou”.
A
história mostra precedentes perigosos, pra não dizer fatais.
Augusto Pellegrini
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