O BONDE DA STELLA
Saiu nos jornais, na
televisão, na internet e nas redes sociais, com estardalhaço: cinco jogadores
do Flamengo foram pegos com a boca na garrafa e acabaram punidos com multa,
afastamento e treinamento em separado porque parece que houve um grande
desrespeito às cores do clube e à nação rubro-negra.
A primeira impressão que
fica é que a diretoria não está particularmente revoltada por saber que seus
jogadores também apreciam uma cerveja num dia de folga como todo legítimo
habitante do Rio de Janeiro, mas porque os jogadores não se limitaram a beber –
tiveram a infelicidade de registrar o fato.
Ocorre que o comando do
clube está batendo cabeça, pois o time não vai lá muito bem das pernas e
ninguém consegue explicar esta queda vertical de rendimento bem quando o
torcedor começava a acreditar que um novo milagre pudesse ocorrer, como aquele
de 2009, quando na reta final da disputa o time saiu de um décimo lugar para
conquistar um título épico.
Daí, a repercussão do fato
foi maior, e todas as frustrações pelo mau desempenho da equipe caíram como um
raio na cabeça dos cinco pecadores.
Como neste mundo tudo é
relativo, se fossem cinco jogadores do Corinthians, virtual campeão brasileiro
com onze pontos na frente do longínquo segundo colocado, os paparazzi
justificariam o fato como “um merecido lazer num dia de folga”.
Pior: ao denominarem a
festa de “Bonde da Stella”, compararam os jogadores a marginais comuns, pois
esta expressão é geralmente usada para rotular facções criminosas.
Alheia à execração dos
jovens, a Ambev deve estar festejando a propaganda gratuita da sua cerveja
premium, que com um pouco de imaginação dos homens de marketing poderá
brevemente ser anunciada como “a cerveja dos atletas”.
É claro que um
profissional, seja ele um jogador de bola, motorista de ônibus, cantor ou
agente de seguros, deve zelar pela sua vida particular para que o físico e a
mente possam garantir que o seu desempenho no trabalho não seja afetado por
causas externas – entre elas os pequenos prazeres da vida.
Mas isto não deve gerar
uma cartilha de comportamento nem um patrulhamento sistemático por parte do
empregador.
Os jogadores acreditavam
estar “pegando leve”, tanto que eles próprios publicaram fotos do grupo nas
suas redes sociais, e não se percebe nada de realmente desabonador nas imagens
postadas.
Mas é bom ir devagar com o
andor, não porque o santo seja de barro, mas porque a carreira de um jogador é
feita de barro e pode se desfazer a qualquer momento se não for bem conduzida.
Na verdade, duas ou três
geladinhas num momento de folga é uma diversão que não faz mal a ninguém.
Afinal, não é porque o seu time está na parte de baixo da tabela que as
pequenas alegrias da vida não possam ser vividas. Um pouco de descontração pode
até ajudar a melhorar o ambiente.
Assim, embora as más
línguas tenham pintado o cenário como se fosse uma orgia desenfreada, tudo
indica que os jogadores Pará, Alan Patrick, Éverton, Paulinho e Marcelo Cirino
não foram punidos por causa da cerveja, mas porque o time vai mal. Na cabeça
dos diretores, se eles estivessem rezando e tomando suco de frutas
provavelmente o Flamengo se reencontraria com a boa fase e chegaria num passe
de mágica ao desejado G4.
Ele podem até afirmar que
os jogadores bebiam água da bica quando o time embalou com a chegada de Oswaldo
de Oliveira, mas aí já é uma outra conversa.
Existe uma grande
diferença entre a festa improvisada que jogou os cinco jogadores às feras e as
presepadas etílicas de Adriano, o Imperador, e Ronaldinho, o Gaúcho, ambos –
aliás – ex-jogadores do Flamengo.
O exagero com que está
sendo tratado o caso nos faz supor que a diretoria do clube está aliviada por
conseguir encontrar não apenas um, mas cinco bodes expiatórios para justificar
ao torcedor que mostra sinais de impaciência pelo futebol ridículo que o
Flamengo está mostrando em campo com uma sequência histórica de insucessos.
(artigo
publicado no caderno Super Esportes do jornal O Imparcial de 06/11/2015)
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