NO BICO DO CORVO
O Rio de Janeiro continua
lindo e, como canta Gilberto Gil, continua sendo o Rio de janeiro, fevereiro e março,
banhado pelo sol, pelo verão e pelo carnaval, mas sob o olhar desconfiado do
Redentor, pois se o Rio não cuidar do seu destino, aquele abraço!
Com uma administração
estadual e municipal ineficientes – Pezão de um lado e Paesão do outro – o Rio
está no bico do corvo.
A saúde pública está um
caos. Hospitais públicos não atendem a população por falta de profissionais,
materiais e equipamentos. Os habitantes da região serrana têm que acender velas
a todos os orixás cada vez que ameaça uma tempestade, pois os serviços de
contenção prometidos pelo Estado depois que a ajuda humanitária em tragédias
recentes ficaram no discurso. Os reparos também.
As praias estão cada dia
mais inseguras, com marginais atacando turistas ou moradores – já não faz
diferença – em plena luz do dia, fruto de um policiamento deficiente e de um intenso
tráfico de drogas que assola a cidade, particularmente na poética zona sul.
O mar da Guanabara está há
anos impróprio para banhistas apesar dos milhões destinados para a sua
recuperação, vorazmente engolidos sem que haja qualquer saneamento, o que é um
atentado contra o bom senso, considerando a quantidade de turistas que apesar
de tudo não cessam de vir à cidade para se divertir e deixar o seu dinheiro.
O leitor poderá apontar
que de positivo não se tem tido notícias dos costumeiros tiroteios nas áreas
“pacificadas”, mas com certeza isso se deve mais a uma trégua dos traficantes
do que a uma estratégia do governo, ou seja, mais dia menos dia as balas
perdidas voltarão a acertar a cabeça dos desprotegidos.
Falta dinheiro para as
coisas mais urgentes, mas o custo dos Jogos Olímpicos – e Paralímpicos – deverá
chegar aos 40 bilhões de reais (41% mais caro que a Copa de Mundo).
Os Jogos apresentam ainda
uma série de incertezas, que vão da qualidade das edificações à ameaça de
boicote de atletas de diversos países.
A cidade – como de resto o
país – vive a angústia de se ver derrotada por um mosquito, e a seis meses das
competições muitas obras cuja previsão de entrega seria setembro de 2015 – como
o Velódromo e o Estádio de Remo da Lagoa – ainda não foram concluídas. Em
situação pior estão o Centro de Tênis, na Barra, e o Centro de Hipismo, em
Deodoro, pois as obras se encontram paralisadas devido a pendências entre a
Prefeitura e a construtora responsável.
No futebol, a situação não
é diferente.
Com o Campeonato Carioca
em pleno andamento, os dois estádios principais não estão sendo utilizados. O
Engenhão está interditado há três anos, e só deverá ser utilizado pelos clubes
depois das Olimpíadas. Isso se for solucionado o impasse sobre a quem caberá a
sua administração.
Quanto ao Maracanã, o
velho estádio que era um verdadeiro templo do futebol – posto que um cartão
postal da cidade, construído numa linha arquitetônica retrô dentro de um projeto
apresentado em 1947 – foi demolido, dando lugar ao Novo Maracanã, filho sem pai
que surgiu como uma imposição da Fifa e foi cedido à administração particular
depois de ser pouco usado na Copa de 2014.
O estádio também está
fechado para jogos e aqui também as Olimpíadas são usadas como desculpa, mas os
clubes têm feito grande restrição em lá jogar por causa de divergências com os
administradores com respeito às taxas cobradas, de modo que os jogos do
campeonato estão sendo disputados em São Januário, Macaé e Volta Redonda.
Com isso, as arrecadações
caíram drasticamente por causa do público diminuto, e pela primeira vez em 104
anos um Fla x Flu foi disputado fora do Rio de Janeiro.
Assim, a administração do
futebol se junta à administração da cidade e do estado, restando ao carioca
rezar para que o Cristo Redentor, braços abertos sobre a Guanabara, assuma as
rédeas da situação e promova um milagre de ressuscitar a Cidade Maravilhosa e o
estado que lhe dá o berço.
Amém.
(artigo
publicado no caderno Super Esportes do jornal O Imparcial de 26/02/2016)
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