VIDA DE ARTISTA
(Excerto)
Tomei as devidas providências e também
as devidas precauções – afinal nunca se sabe ao certo em que terreno se está
pisando.
A ficha de emprego incluía data e local
do nascimento, filiação e escolaridade, e perguntava se eu já havia tido alguma
passagem pela policia ou alguma doença contagiosa.
Faltava o atestado de residência para
provar que eu residia e o atestado de vida para provar que eu vivia – o bafo
com hálito matutino e o beliscão no antebraço não tinham valor legal, mesmo se
providenciado com todas as firmas reconhecidas, selos, estampilhas, carimbos e
vistos colocados debaixo do nariz do escrevente do cartório e seus cartapácios
empoeirados.
Depois de quatro dias de espera sem muita
angústia, curtindo a paz do limbo dos pós-graduados, veio enfim o chamado da
empresa, e lá fui eu fazer a entrevista com o Chefe de Pessoal, senhor
Takashima, com o Gerente de Recursos Humanos João Tamarindo e finalmente com
Mister Pettiford da matriz, que me examinou como se examina um cãozinho num
canil, e decretou que eu fosse comprado.
O primeiro passo foi fazer um teste
psicológico para provar que eu não era louco. Devidamente comprovado que eu não
fazia o tipo terrorista nem tinha tendências homicidas, recebi então o crachá e
a assinatura na carteira de trabalho, um livreto sobre a empresa com informações
alentadoras e um folheto falando sobre um projeto também alentador no qual seria
enterrado um milhão de dólares para que fosse desenterrado um rico minério, a
fim de que todo mundo ganhasse bem e ficasse bem contente, do Takashima ao
Tamarindo e do Pettiford ao governador.... e eu.
Como bom cidadão, concordei com todas es
exigências sem muito questionamento, fiz os exames clínicos de praxe preenchendo
os devidos frascos, barbeei, tomei banho, arrumei a mala e tranquei no cofre do
passado um punhado de livros e discos, barzinhos, Irenes, Adelaides e
Elisabetas.
Mas não joguei a chave fora porque, no
futuro, quem sabe?...
Nenhum comentário:
Postar um comentário