segunda-feira, 8 de junho de 2020


               


ROUPÃO DE BANHO

A turba caminhava unida, coesa, gritando palavras de ordem enquanto se dirigia lentamente ao local do encontro, onde os caminhantes receberiam novas instruções e dariam prosseguimento ao plano estratégico que havia sido eleborado pela direção do movimento.
Muitos portavam bandeiras, faixas e cartazes e apenas agitavam os braços num gesto ensaiado, mas a maioria seguia calada e alguns – poucos, é verdade – traziam consigo bastões  de madeira  e canos de ferro que seriam usados oportunamente, no calor do evento, para quebrar vitrines e fachadas de banco.
Era uma cena que estava se tornando comum em diversos países do mundo, independentemente dos mais diversos motivos e tipos de reivindicações.
Apesar dos rogos da mãe e do desespero do pai, Carluccio deu-lhes as costas e foi se juntar com a turma, carregando um taco de madeira de lei dentro da mochila.  
A casa ficou para trás junto com o choramingo dos velhos, e tudo o que ele tinha que fazer agora era cumprir com mais esta missão.
-0-0-0-
O movimento foi ficando quente, e quando começou a ferver, Carluccio tirou o taco da mochila e começou a se movimentar em direção ao seu objetivo quando teve sua frente barrada por uma mulher que gritava coisas que ele não entendia, mas que seguramente atrapalhava o seu trabalho. A mulher, usando um lenço para cobrir a cabeça e vestindo um ridículo roupão de banho totalmente inadequado para aquele cenário, pôs-se resolutamente à sua frente para impedi-lo de prosseguir.
Ele procurou se desembaraçar a todo custo, empurrando a mulher e tentando dela se desvencilhar, mas era tudo em vão.
No auge do nervosismo e de uma forma impensada, ele manejou o taco com força na cabeça da mulher e a deixou caída, livre para prosseguir o seu caminho. Minutos depois, milhares de pedacinhos de vidro de espalhavam pela calçada iluminada pelas luzes do saguão do banco e ele se sentiu satisfeito com o dever cumprido.
-0-0-0-
Horas depois, com o movimento arrefecido, a turba se dispersou e cada qual seguiu seu rumo.
Carluccio foi pra casa e ao se aproximar notou um movimento estranho no portão, gente se aglomerando e uma ambulância parada ao meio-fio.
Alarmado, perguntou para uma vizinha, primeira pessoa que achou pela frente – “o que está acontecendo na minha casa”?
A vizinha explicou que depois que ele saira, seu velho pai sentiu-se mal e desfaleceu. Um vizinho médico foi chamado às pressas, disse que o caso era grave e chamou uma ambulância, mas a ambulância demorou a chegar por causa de alguma confusão que estava acontecendo nas ruas do centro.
“Sua mãe ficou tão nervosa que colocou o primeiro agasalho que encontrou à mão – um roupão de banho – e foi à sua procura para que viesse ajudar com o problema do seu pai...”, prosseguiu ela.


Nenhum comentário: