quarta-feira, 22 de dezembro de 2021

 


    PÁGINAS ESCOLHIDAS

O FANTASMA DA FM (1992)
(Augusto Pellegrini)

A PREGUIÇA

A preguiça do Juvenal era proverbial.
Às vezes deixava de almoçar para não ter que ir até a cozinha preparar o prato, às vezes deixava de tomar banho para não despertar daquele gostoso torpor que a indolência lhe causava.

Tinha preguiça de amarrar os sapatos, e já tomara um tombo monumental ao enroscar os pés nos cordões, num dia de relativa pressa.

Já perdera uma namorada porque se negava a passear e preferia dormitar candidamente no seu colo com as mãos afagando suas loiras melenas, até que ela se enfadou com tanto enfado e foi procurar outro que pudesse agitar os seus dezesseis anos carentes.

A preguiça do Juvenal fizera com que ele deixasse de ir à casa lotérica do outro lado da rua pra levar um volante já preenchido – a fila longa não o encorajou ir ao encontro da sorte, e ele achou melhor ficar em casa dormitando sob o frescor do ventilador.

No domingo à noite na hora da zebrinha do Fantástico ele resolveu conferir o volante não jogado. Mesmo confundindo Bilbao com Guijón e CSA com CSE ele acertou a improvável vitória de uma Sanbenedettese contra o Milan e carimbou os treze pontos, como bem atestava o volante.

O volante que, por preguiça, ele não jogou.    

 

(Um breve estudo sobre o possíveis malefícios causados pela indolência)


 

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