domingo, 13 de novembro de 2022

 


PÁGINAS ESCOLHIDAS

Extraído de um livro de contos que ainda não foi publicado
(Augusto Pellegrini)

O CONTADOR DE HISTÓRIAS

No número 341 da Rua da Misericórdia há uma placa que serve de chamariz e indicativo para a cura de problemas – PROFESSOR GALBA – e em letras menores – QUALQUER QUE SEJA O SEU PROBLEMA, ELE SERÁ RESOLVIDO.

Este professor, cujo verdadeiro nome é Dorindo Farik Galbarini, filho de pai siciliano e de mãe libanesa, já havia ganhado a vida trabalhando como auxiliar de açougueiro, porteiro de prédio e vendedor de livros, até que aprendeu a lidar com a força das palavras.

Magro, calvo e muito tranquilo, ele passa a impressão de ser um monge tibetano, o que nada tem a ver com sua descendência árabe-italiana.

Dorindo se utiliza de um método insólito e invulgar de curar problemas, sejam eles de ordem psicológica, familiar, amorosa, profissional, financeira ou mesmo de saúde: ele conta histórias aos seus pacientes.

Estimulado pelas suas raízes libanesas e pelas proezas de Sherazade, que contando histórias por mil e uma noites seguidas salvou a própria vida e curou o rei Xeriar da loucura e do ódio pelas virgens as quais desposava, Dorindo formulou um estratagema pseudocientífico que consistia em fazer o paciente reconhecer e curar certas fobias – que no seu modo leigo de entender eram responsáveis por todo tipo de moléstia física ou mental que alguém pudesse ter – fazendo o cliente ingressar num mundo de fantasia onde ele se identificava com determinado personagem e mudava a sua atitude em relação aos medos e à vida. O comportamento do paciente era modificado de tal forma que se transformava numa porta aberta para o sucesso, mesmo com respeito ao lado profissional e financeiro. Como se vê, um psicoterapeuta moderno, embora sem diploma nem mestrado.

O professor recebe o paciente e o conduz a uma saleta banhada por uma luz minúscula, se acomoda em uma confortável poltrona ao som quase imperceptível de uma dessas músicas utilizadas em terapias de meditação – canto de pássaros, sons do mar, farfalhar de folhas, música para a alma, ou o que mais se queira – e pede que ele conte detalhadamente o seu drama. O professor ouve atenta e pacientemente, somente interrompendo se e quando absolutamente necessário.

Enquanto toma consciência do problema, Dorindo – agora transformado em professor Galba – começa a rebuscar no arquivo inesgotável do seu cérebro uma história  que realmente convenha para o caso.

Decisão tomada, a história é contada numa voz grave e pausada, com ares de dramaturgia, envolvendo o paciente numa aura de misticismo hipnótico.

Tiro e queda.

Depois de cinco ou seis sessões o paciente estará curado. Satisfação garantida ou seu dinheiro de volta.

 

 

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