AS CURVAS DA ESTRADA DE
SANTOS
(ARTIGO PUBLICADO NO
CADERNO “SUPER ESPORTES” DO JORNAL “O IMPARCIAL” DE 23/10/2014)
Infelizmente,
volta e meia o cronista tem que voltar ao mesmo assunto e destacar a violência
que campeia no futebol. Desagradável,
mas necessário.
A
violência grassa dentro dos estádios, do lado de fora dos portões, nas suas
cercanias, nas vias de acesso, nas sedes dos clubes e até em pontos distantes e
insuspeitos, como na Via Anchieta, estrada que liga São Paulo ao litoral
paulista e que foi palco de atropelamento com morte na tarde de domingo.
Atropelamentos
em estradas são geralmente provocados por imprudência do pedestre ou negligência
do motorista, mas este aqui foi um ato criminoso, pois teria sido uma resposta
ao apedrejamento de um ônibus que transportava a Torcida Jovem do Santos. O ônibus
foi emboscado por torcedores palmeirenses numa resposta a outra emboscada
semelhante feita pelos santistas na partida do primeiro turno. E o motorista
atropelador era um torcedor santista que aparentemente escoltava o ônibus.
Assim,
como se vê, não existe diferença entre agredidos e agressores, pois todos são delinquentes
do mesmo naipe.
Este
é o terceiro caso de morte de torcedor registrado este ano (quarto, se
contarmos com o torcedor pernambucano que foi atingido por um vaso sanitário na
saída do Estádio do Arruda, em Recife), e a Justiça continua agindo a passo de
tartaruga.
No
início do ano, um santista morreu o ser espancado por são-paulinos numa parada
de ônibus. Há menos de três meses foi a vez de um palmeirense ser morto numa
batalha travada com corintianos na cidade de Franco da Rocha, município
localizado na região metropolitana de São Paulo.
No
caso deste fim de semana, além do palmeirense morto, outros dois também foram
atropelados, e há um relato de que também houve feridos a bala por disparos
feitos por ninguém sabe quem.
Junto
com os torcedores palmeirenses foram encontrados rojões, pedaços de pau e
facas, o que demonstra que os torcedores se dirigiam ao Estádio do Pacaembu com
intenções nada pacíficas.
Apesar
das repetidas ocorrências de violência, as torcidas organizadas de todos os
clubes continuam a receber o apoio logístico e financeiro dos clubes, por
diversos motivos.
Em
primeiro lugar, seus membros são eficientes cabos eleitorais que ajudam a
eleger presidentes e a nomear dirigentes. Alguns dirigentes de clubes são, eles
próprios, ex-integrantes de facções organizadas. Além do mais, os cartolas têm
medo deles e das represálias que eles representam, mas ao agir como se nada estivesse
acontecendo se tornam cúmplices dos assassinatos cometidos.
As
torcidas organizadas também representam público – muito embora não representem
lucro, porque via de regra estes torcedores entram de graça – num campeonato
tão carente de torcida por causa da banalidade do excesso de jogos e do preço
dos ingressos. E da violência, é bom lembrar.
O
Brasil ocupa neste momento a triste liderança mundial no ranking de violência
no futebol, tendo ultrapassado a Argentina e a Itália neste quesito, e
apresenta números estarrecedores: 155 mortes desde 1988, o que significa uma
média de 5,7 mortes por ano, um verdadeiro absurdo.
É
claro que a escalada da violência não se limita ao futebol e é atualmente uma
praga nacional, fazendo parte do cardápio de uma população cada vez mais
desrespeitosa com a segurança e com os direitos dos seus semelhantes. As
ocorrências se multiplicam nas escolas, no trânsito, nas manifestações e nos
grandes aglomerados e têm nos jovens – rebeldes com ou sem causa, não vem ao
caso – os seus principais incentivadores.
E
assim, entre paus e pedras, a vida humana vai ficando cada vez mais fragilizada
e a lei – ora, a lei – continua figurando nas páginas do código penal.
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