segunda-feira, 10 de novembro de 2014





EU ACREDITO !!! 

 (ARTIGO PUBLICADO NO CADERNO “SUPER ESPORTES” DO JORNAL “O IMPARCIAL” DE 10/11/2014) 

Diz o dito popular que um raio não cai duas vezes no mesmo lugar. A realidade provou, no entanto, que pelo menos no que diz respeito ao futebol, ele pode cair duas vezes e produzir a mesma comoção e o mesmo estrago, dentro de condições iguais de pressão, temperatura e volume. Até pelo mesmo placar.
São coisas que a razão não explica, e que por isso passam a fazer parte das lendas do futebol.
O cronista, jornalista e dramaturgo Nelson Rodrigues torcia pelo Fluminense, portanto não tinha nada a ver com o Flamengo ou com o Atlético Mineiro, clubes que disputavam uma vaga de finalista da Copa do Brasil no meio da semana passada.
No entanto, se vivo fosse, ele talvez estivesse no Mineirão em virtude do seu trabalho como jornalista, e se assim o fosse estaria provavelmente acompanhado pelos seus personagens – Gravatinha, que morrera em 1958, mas nunca deixara de ir aos estádios, sempre trajando terno e gravata borboleta, e também o Ceguinho Torcedor, que ia de bengala ao estádio e discutia se aquele lance duvidoso teria sido pênalti ou não apesar de não enxergar patavina. E o mais performático deles, o Sobrenatural de Almeida.
Sobrenatural de Almeida era um fantasma que, como seu criador, torcia pelo Fluminense, portanto estaria no Mineirão para atormentar o Flamengo, seu maior rival. Ninguém, no entanto, imaginava que sua influência pudesse chegar a tal ponto. 
Dirão os mineiros que quem estava presente não era nenhum fantasma, mas sim um público frenético de carne e osso que mesmo depois de ver o time sofrer o primeiro gol continuou entoando o seu mantra – “eu acredito!!!” – grito que já se provara eficiente quinze dias antes, contra o Corinthians, numa situação exatamente igual, e também como no ano passado, no Estádio Independência, no Horto, quando o Galo faturou de forma heroica a Copa Libertadores.
Lá, o incentivo vinha acompanhado da expressão “caiu no Horto, tá morto”, uma rima pouco eficaz em se tratando do Mineirão, e portanto deixada de lado.
Cada bola era disputada pelos jogadores atleticanos como se fosse a última jogada de suas vidas, fazendo o time virar de um 0 x 1 com 34 minutos de jogo – uma ducha para qualquer time que precisa ganhar por três gols de diferença – para um improvável 4 x 1.
O lado tragicômico do espetáculo ficou por conta de Luiz Penido, locutor da Radio Globo do Rio de Janeiro quando Éverton marcou o gol rubro-negro: “É finalista!!! Flamengaço classificadaço!!!” – berrou ele, e foi além dizendo “...agora, só se o Galo fizer quatro! É ruim, hein? Não vai fazer mesmo!!”, mostrando que o palhaço Chacrinha tinha razão ao mencionar que um programa só acaba quando termina.
A final mineira será inédita como decisão de um título nacional.
A impressão que o desempenho dos dois times causa ao analista é que o Cruzeiro, embora muito próximo de ganhar o bicampeonato brasileiro, se encontra cansado, em dificuldades para manter a mesma equipe dois jogos seguidos e em rota descendente de produção.
O Atlético, ao contrário, parece reunir forças para ficar entre os quatro primeiros do Brasileirão e muito embalado para a decisão da Copa do Brasil, com possibilidades de chegar à Copa Libertadores por um dos dois caminhos.
Na versão doméstica, em 13 disputas pelo Campeonato Mineiro o Cruzeiro venceu 8 e o Atlético 5, mas nesta hora estatísticas não contam.
E, apesar do slogan “eu acredito” ser marca registrada dos atleticanos, nada impede que os cruzeirenses também acreditem num titulo que pode representar não apenas um triunfo memorável contra o tradicional rival, mas também a tríplice coroa, com a conquista do Campeonato Mineiro – já decidido – do Campeonato Brasileiro – que está mais próximo a cada rodada – e da quarta conquista da Copa do Brasil.
Caso a Radio Globo desloque a sua equipe do Rio para Belo Horizonte, aconselha-se que o locutor escalado não seja Luiz Penido, por motivos óbvios.

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