A COPA E AS COISAS QUE A
TV NÃO MOSTRA
ARTIGO PUBLICADO NO
CADERNO “SUPER ESPORTES” DO JORNAL “O IMPARCIAL” DE 19/11/2014
Dentro
do campo de jogo, a Copa brasileira está sendo um notável espetáculo de
participação popular.
O
problema é o que acontece nos bastidores de uma festa que deveria ser perfeita,
dado o investimento feito, mas que peca na organização como se fosse uma
simples quermesse de bairro.
O
Brasil não é pioneiro nessa esculhambação – isso já aconteceu, por exemplo, na
África do Sul – mas de qualquer forma isto não é desculpa para que os problemas
sejam aceitos sem discussão. Afinal, está em jogo o falado “padrão Fifa” e a
promessa de que esta seria “a Copa das Copas”.
No
estádio da abertura faltou energia elétrica durante certo tempo, caiu a
internet e não havia rede wi-fi para comunicação. Lá mesmo um problema
hidráulico inundou o vestiário visitante, e os torcedores que estavam nas
arquibancadas móveis foram aconselhados a não exagerar na vibração porque a
estrutura não parecia confiável.
Em
Natal, a Arena das Dunas foi aberta para o público sem a liberação do Corpo de
Bombeiros, o que seria uma irresponsabilidade se não estivéssemos em um país onde
laudos parecem ser simples formalidades. Quase todos os estádios ainda têm
algum acabamento para ser feito e a famosa área do entorno continua mantendo o
aspecto de um canteiro de obras.
Assim,
se nas chamadas quatro linhas as coisas vão se sucedendo com muita animação (embora
com algumas decisões arbitrais bastante discutíveis), com espetáculos que
passam muita emoção desembocando em um número de gols acima da média, a gente
começa a perceber que sobram problemas na outras dependências dos estádios.
Os
serviços “padrão Fifa” deixam a desejar, desde a dificuldade para conseguir
entrar no estádio até a falta de refrigerante, cerveja e comida. Os voluntários
responsáveis pelo abastecimento das cabines de transmissão e das salas dos
jornalistas parecem ter sido mal treinados e demoram horas para providenciar um
simples copo de água mineral – sem dúvida muito necessária para ajudar a
espantar o calor de quase trinta graus na maioria das arenas.
Constatou-se
no Itaquerão que quem comprar ingresso para uma determinada parte das
arquibancadas móveis terá apenas 25% de visão do campo de jogo, tendo que se
contentar em admirar uma frondosa viga de concreto.
Do
lado de fora das chamadas arenas e das áreas mais ou menos delimitadas para a
circulação do público torcedor, manifestantes continuam tentando chamar a
atenção da imprensa internacional, a polícia continua reprimindo, as prisões
acontecendo e o discurso segue confuso.
As
manifestações misturam greves por melhores salários com reivindicações
políticas, mas já estão perdendo o apoio da população, que começa a demonstrar cansaço
e deseja retomar a liberdade de locomoção e acabar com os transtornos que a
situação está causando. Como a imprensa, preocupada com a festa de sons e cores
que se desenrola em função do evento, não está mais dando muita cobertura ao
movimento, a tendência é acontecer um certo esvaziamento nos protestos.
As
manifestações poderão crescer depois que a febre do torneio terminar, mas nesta
altura do campeonato parece ser bastante inócuo, para não dizer estúpido, sair
quebrando tudo empunhando faixas com dizeres “Não vai ter Copa” ou “Fora Fifa”.
Nas
cidades sede, alheios a tudo isso e devidamente protegidos por uma muralha que
separa os dois Brasis – o da festa e o do protesto – turistas fantasiados e
extrovertidos se confundem com os brasileiros que querem aproveitar este
momento único e procuram se divertir e deixar a tristeza pra lá, mesmo quando
as suas seleções não vão bem ou ficam dando vexame.
Há
uma intensa vibração pela Copa e pelo copo e uma grande preocupação das
autoridades para que nada de anormal ocorra durante o período, principalmente
com os turistas.
Enquanto
isso, a seleção brasileira vai empatando com o México deixando o torcedor com a
pulga atrás da orelha. Uma pulga do tamanho de um elefante.
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