PRIMEIRA LIGA A PERIGO
Em
quase todos os países do mundo onde se pratica um futebol de competição os
torneios e campeonatos são administrados por uma liga que representa os clubes,
e não pela confederação nacional, que existe apenas para cuidar dos negócios
das suas seleções.
O
Brasil é então uma honrosa exceção, posto que a CBF não quer perder o controle
da situação – que lhe rende, aliás, além de muita influência política, também uma
polpuda soma de dinheiro – e não tem jeito de desocupar a mata.
Historicamente,
a CBF mantém o domínio da situação e mantém os clubes na palma da mão, sempre usando
da brasileiríssima prática do “toma lá, dá cá”, tratando os presidentes das
agremiações de maneira paternalista e aparelhando devidamente toda a máquina do
futebol a seu bel prazer.
Para
tanto, mantém sob rédea curta o Supremo Tribunal de Justiça Desportiva e a
Comissão de Arbitragem, duas entidades que podem admitir dois pesos e duas
medidas dependendo de para onde o vento da CBF soprar.
Mantém
também sob controle todas as Federações do país e, por extensão, os presidentes
de clubes de todas as divisões nacionais.
Em
alguns momentos da história alguns poucos dirigentes tentaram fundar a sua
própria liga e trabalhar na organização dos eventos de futebol entre os próprios
clubes, mas a falta de união entre os representantes sempre fez naufragar as
ideias e a administração continuou concentrada na CBD ou na CBF.
Acomodados
com a situação, dirigentes dos clubes se baseiam em exemplos malsucedidos, como
a cisão que enfraqueceu a seleção nacional em 1930 e 1934 e a necessidade de
ser fazer um torneio alternativo em 2000 – a Copa João Havelange – que criou um
impasse na realização do Campeonato Brasileiro. Preferem, portanto, deixar a
coisa como está.
O
problema gerado em 2000 fez surgir o Clube dos 13, cujo nome oficial é União
dos Grandes Clubes do Futebol Brasileiro, e que na prática funciona apenas para
negociar cotas de patrocínio com as emissoras de televisão. Por causa dessa
disfunção, o Clube dos 13 perdeu as características iniciais e não demorou em
congregar 20 clubes, que foram escolhidos tendo como base um ranking apresentado
pela CBF, o que de per si já é um imenso contrassenso para quem queria ser
independente.
Enquanto
os clubes parecem ser dirigidos por trapalhões – e só essa possibilidade
justifica a penúria por que passa a maioria deles – a CBF é muito rica e
dirigida por delinquentes, e isto fica claro considerando a prisão do seu
ex-presidente e as investigações em outros dirigentes do mesmo quilate.
Evidentemente
algo precisa ser feito para dar qualidade, credibilidade e conforto financeiro
para os clubes brasileiros que disputam alguns dos mais importantes torneios do
mundo. A fundação de uma liga sólida, bem dirigida e isenta pode ser um bom
começo.
Assim
surgiu a Primeira Liga, uma rebelião encabeçada pelo Coritiba que contou com a
adesão do Atlético Paranaense e de alguns clubes do Rio, Minas, Santa Catarina
e Rio Grande do Sul, começando com a disputa da Copa Sul-Minas-Rio entre 27 de
janeiro e 31 de março deste ano.
O
torneio começou cheio de gás, mas não se sabe se irá terminar.
A
Primeira Liga foi considerada irregular pela CBF por invadir as datas do seu
calendário a partir de fevereiro. A CBF diz tratar os jogos até aqui realizados
como simples amistosos e ameaça recorrer à Fifa caso os clubes fundadores da
liga resolvam ir adiante, prometendo punições seríssimas se eles insistirem no
assunto.
A
Confederação aceita a ideia de uma liga independente gerir torneios
independentes, mas prefere que isto aconteça a partir de 2017, pois acha que o
assunto foi tratado de forma intempestiva e que merece um estudo mais aprofundado,
inclusive no que diz respeito às taxas de arbitragem, taxas de administração
dos estádios onde ocorrerem as partidas, taxas disso, taxas daquilo e a
importante cerimônia do beija-mão.
Em
outras palavras, a CBF quer uma liga autônoma que conte com o seu
consentimento.
Está
mesmo na hora de os clubes formarem uma liga para gerir seus próprios destinos,
mas o assunto é complexo e na realidade merece um estudo mais detalhado para
que uma cisão abrupta não venha a entornar de vez o caldo já ralo e sem sabor
em que está se transformando o futebol tupiniquim.
(Artigo publicado no caderno SuperEsportes do
jornal O Imparcial de 05/02//2016)
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