A FORÇA DO VANDALISMO
Mais
uma confusão entre torcidas organizadas, desta vez envolvendo palmeirenses e
corintianos, movimentou a opinião pública e, mais do que isso, movimentou a ação
das autoridades paulistanas.
Isto
aconteceu há duas semanas numa rodada em que Palmeiras e Corinthians não estavam
se enfrentando, portanto, a confusão aconteceu fora dos estádios e das cercanias
deles.
Desta
vez os baderneiros se digladiaram em três pontos diferentes e distantes entre
si, o que mostra uma estratégia criminosa bem planejada.
Todas
as escaramuças tiveram como palco a zona leste de São Paulo, sendo duas em praças
centrais e importantes que normalmente recebem um afluxo muito grande de
pessoas e a outra numa estação de metrô. Há algum tempo esta passou a ser uma
prática comum dos membros das torcidas organizadas, deixando expostos
transeuntes e passageiros que circulam pelos locais.
Nos
três lugares, os delinquentes travestidos de torcedores estavam fortemente
armados de paus, barras de ferro, rojões e de também pelo menos um revólver,
cuja bala resultou na morte de um cidadão que não tinha nada a ver com as
torcidas e talvez até detestasse futebol.
Mais
uma vez tivemos dezenas de presos dos dois lados que se declararam inocentes e disseram
que reagiram apenas por terem sido atacados. Na delegacia, eles levaram uma
carraspana do delegado, assinaram um termo de bom comportamento e foram soltos
sem qualquer pagamento de fiança ou garantia de que os danos causados ao
patrimônio público fossem algum dia ressarcidos. Na próxima oportunidade eles estarão
aterrorizando em outros lugares, com o firme propósito de mostrar ao mundo a sua
sanha assassina.
Entre
os detidos se encontravam dois torcedores da Gaviões da Fiel que estavam entre
aqueles que causaram a morte do garoto Kevin, na Bolívia, há três anos.
Isto
é que se chama impunidade em dose dupla.
Esta
impunidade vergonhosa é uma das razões que estimulam esses marginais a agirem
como agem. No dia seguinte eles possivelmente irão rever os seus atos e
comentar as suas bravatas olhando as imagens mostradas na televisão,
possivelmente tecendo comentários sobre a sua coragem, e desdenhando a atuação
dos homens que deveriam fazer prevalecer a lei e a ordem.
Estes
torcedores, fortemente armados, foram filmados por câmeras de segurança –
portanto podem ser facilmente identificados – depredando vagões do metrô e
disparando rojões contra os adversários e contra policiais, mas continuam à
solta, prontos para continuar espalhando o terror pela cidade, escudando seu
comportamento animalesco por detrás de uma camisa esportiva.
Apesar
de as agressões terem acontecido muito longe de qualquer estádio, o Ministério
Público do Estado de São Paulo determinou que até o final do ano os clássicos
paulistas recebam apenas torcedores do time mandante, talvez na esperança de
que as torcidas organizadas – que não representam o clube para o qual alegam
torcer – melhorem o comportamento em 2017.
Esta
é uma solução que beira ao ridículo porque expõe a fraqueza da lei e a falta de
autoridade dos responsáveis em fazê-la cumprir, e lembra a piada do marido que
mandou queimar o sofá da casa ao se saber traído naquele móvel.
A
primeira sugestão, felizmente descartada, havia sido ainda pior: o MP, por não
ter a competência de resolver um problema causado por algumas dezenas de
desordeiros, queria que os clássicos fossem disputados com portões fechados, em
prejuízo a dezenas de milhares de verdadeiros torcedores. Como o futebol tem
por trás de si toda uma estrutura financeira bancada por patrocinadores, esta
solução seria um tiro de misericórdia no profissionalismo do esporte.
De
um lado organizações bandidas bancadas e reconhecidas pelos clubes, cujos
dirigentes usam os seus líderes como massa de manobra para serem eleitos,
amedrontando adversários e desafetos. Do outro lado uma segurança pública
inepta e incompetente, sustentada pelo contribuinte que se vê à mercê do medo e
da violência.
No
meio, uma federação perdida, sem voz e sem ideias para propor soluções com os
clubes e com o governo.
Ocorrências
como esta passaram a ser rotineiras no Brasil, mas são muito raras no resto do
mundo.
Para
onde caminha o futebol brasileiro?
(artigo
publicado no caderno Super Esportes do jornal O Imparcial de 15/04/2016)
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