Na
impossibilidade de conseguir um editor para publicar o meu novo livro de
contos, vou continuar publicando as histórias em capítulos no Facebook e no
blog www.augustopellegrini.blogspot.com.br.
Se algum dia surgir um editor, os contos serão devidamente ordenados.
O ATOR
(PRIMEIRA PARTE – ABERTURA)
Estou
novamente desempregado.
Como
o leitmotiv da minha vida sempre foi
o palco, não sei se atribuo esta infelicidade à força do destino, como dramatizado
por Giuseppe Verdi, ou à força das circunstâncias, coisa que pode acontecer com
qualquer mortal envolvido nas farsas do dia-a-dia.
No
momento, sou mais um personagem da vida real à procura de uma persona no palco, saudoso do camarim que
guarda aquele silêncio que antecede o espetáculo e daquele calafrio que
antecede a entrada triunfante em cena.
Tenho
parte da culpa neste destino por enquanto inglório, mas na verdade me considero
mais uma vítima do enredo, que foi tramado à minha revelia.
A
história que ora reproduzo poderá algum dia, se escrita pelas mãos hábeis de um
roteirista, se transformar numa épica obra shakespeariana, tal é a natureza das
personalidades envolvidas, o drama e a ironia contidos na trama, o ranço
operístico e a mensagem bufa.
Essa
história começa com o lirismo de uma poesia e termina com a tragédia dos
grandes épicos.
-0-
Assim
foi desde o princípio, e parece que assim será per omnia saecula, saeculorum,
amém: os momentos que antecedem a entrada ao palco são de extrema tensão, de
intensa agonia, de uma expectativa doentia, de uma sensação febril.
Agora
sei como se sentiam os prisioneiros de Auschwitz-Birkenau quando chegava a hora
de adentrar a câmara de gás, uma alternativa indolor – ainda que não inodora –
de cumprir com a derradeira tarefa mundana antes de alcançar a vida eterna.
E
olhem que muitos deles não tinham consciência do que estavam fazendo, ao
contrário de mim. Eu sei a hora de entrar e a hora de sair de cena – eles não
sabiam a hora de entrar e só saíam de lá mortos e com os pulmões intoxicados de
cianureto, mas pelo menos não tinham que enfrentar o julgamento dos carrascos da
plateia.
Como
Edwin Booth, eu sinto o coração oprimido quando enfrento o olhar inquisitivo do
público que se refestela nas cadeiras a cinco metros de mim, e não duvido que o
mesmo tenha ocorrido com Sir Lawrence Olivier com toda a sua arrogância, ou com
Sarah Bernhardt com toda a sua aura cativante. Ou com Gassman, algum dia.
Mas
Booth, Olivier & Cia. não tinham os problemas que eu tinha – eles eram os
astros principais, não um mero coadjuvante, como eu – nem tinham que aturar
Timóteo, não o da Bíblia, mas aquele intragável diretor que só tinha palavras
idiotas na ponta da língua.
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