O BRUXO DE CONCEPCIÓN
(Excerto)
Tudo começou quando El Gran Gachot, um ilusionista
venezuelano que andava pelo México afora, precisou de um assistente para
auxiliar nos seus truques.
Aos dezesseis anos, Emerenciano Ycaplán,
que era esperto e expedito, apesar de robusto e bem cevado, assumiu a tarefa
com tamanha perfeição que logo passou a comandar parte da cena, ficando para
Gachot apenas o lado mais complexo do espetáculo.
Fazer sumir e reaparecer lenços de seda
coloridos e graciosas pombas brancas, colocar moedas atrás da orelha e retirá-las
da boca, multiplicar cigarros acesos por entre os dedos roliços fazendo-os
desaparecer no ar e encantar o público com um baralho chinês eram algumas das
maravilhas que Emerenciano fazia sem pestanejar.
As mãos se moviam como duas aranhas
transformando um relógio de ouro num punhado de papel picado para depois fazê-lo
reaparecer no bolso de um espectador abobalhado.
Finalmente, ele passou a adivinhar
datas, pensamentos e nomes a ponto de roubar o espetáculo para si, a despeito
do velho Gachot.
El Brujo Emerenciano era a nova sensação
do momento, realizando junto com seu mestre os mais incríveis milagres – água se
transformando em qualquer bebida ou fazendo levitar um pesado baú cheio de
tralhas circenses.
Certo dia. El Gran Gachot viajou sozinho
para a Venezuela e nunca mais voltou, deixando para El Brujo todos os trastes e
serventias, junto com um público fiel que o acompanhava.
Logo ele passou a ser consultado sobre problemas
comezinhos, previsões futuristas e curas milagrosas.
Fazer curas com ervas e raízes não era
nenhuma mágica, era simplesmente invadir o mundo maravilhoso do avô paterno. Na
verdade, ele não sabia como a coisa funcionava, mas ao ouvir os reclamos do
consultado agia por instinto e recomendava chá de bugre como tônico cardíaco,
cipó almécega para o lumbago, arnica do mato para cólicas e tayuyá como
diurético, e sempre acertava na mosca.
A fama de santo milagreiro se espalhou
pela região e começou a extrapolar fronteiras. A vida de curandeiro ambulante
estava se tornando lucrativa, pois sua carroça cheia de tralhas agora também
comercializava mel, canetas, almanaques e outras tralhas que levavam a marca do
Brujo.
Emerenciano já estava se tornando um
curador de doenças, e a sua fama finalmente chegou ao Conselho de Medicina.
Na capital, os doutores resolveram
investigar.
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Emerenciano foi chamado para uma conversa
que se transformou num grande interrogatório.
A inquisição tomou corpo e foi minando a
confiança do Brujo, pois os doutores lhe mostraram cientificamente os grandes
riscos aos quais ele submetia os seus pacientes. A falta de uma medicação
adequada e de um diagnóstico correto podia mascarar uma doença grave e levar
pessoas à morte. O charlatanismo – ele jamais ouvira tal palavra – poderia levá-lo
para trás das grades e provocar o confisco de todos os seus bens, considerados
objetos de operação de uma atividade proibida.
Feita a devida advertência, os doutores
o liberaram.
Emerenciano partiu desorientado. Todo o
seu otimismo fora por água abaixo. Iria, a partir de agora, reabilitar o
surrado baú do Gran Gachot e voltar a brincar com moedas, pombos e lenços. Os
doutores haviam sabiamente demonstrado o quanto espinhosa pode ser a vida de um
curador de doenças.
O ônibus alcançou a autopista para iniciar
a viagem de volta em direção a Concepción Del Oro, onde parentes e amigos o
aguardavam com as possíveis boas notícias trazidas da capital.
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