EU
E A MÚSICA
ESSE
TAL DE ROCK AND ROLL
Um
abraço no Gilberto Mineiro – Parte II
Era sábado, e naquele dia, graças às artimanhas do
diligente produtor, estava sendo realizado no Equator não uma festa de reggae, como seria de se supor, mas um festival
de rock como a gente sonhava, com
diversas bandas locais se apresentando, algumas mais ativas e experientes e
outras ainda com o rótulo de garage bands,
contando com a presença de um público jovem bastante participativo.
As garage bands eram formadas por
jovens adolescentes que se reuniam nas suas casas depois das aulas e não tinham
um grande conhecimento musical teórico nem qualquer ambição profissional,
embora alguns deles tivessem seguido a carreira da música, mesmo se paralela a
alguma outra atividade acadêmica.
Menos participativos do que o público jovem, alguns homens e mulheres maduros que
assistiam ao festival davam a impressão de que lá estavam apenas por conta dos
seus pimpolhos que soltavam provavelmente seus primeiros gorjeios em público,
mostrando aos presentes aquela guitarra e aquele baixo recém-adquiridos, sem as
marcas ou os riscos causados pelo uso.
Aparentemente os meninos se divertiam mais durante o acerto do som das
guitarras e do “um-dois-sssommmm” ao
microfone do que quando se punham realmente a tocar.
As apresentações haviam começado às quatro da tarde misturando alguns trabalhos
autorais esforçados com alguns covers
bem ensaiados, e a expectativa era a de que mais gente chegasse durante o
transcorrer dos shows, sendo previsto o seu gran
finale apenas lá para as dez da
noite.
O Equator Rock Festival foi mais um evento produzido por Gilberto Mineiro,
radialista e produtor musical com uma vida dedicada ao rock, que tinha a seu encargo um programa semanal de rádio que
mantém até hoje, embora com outro nome e em outra emissora. Mais tarde ele
passaria também a trabalhar com música alternativa, drum & bass, som do
mangue, acid jazz, world music, nova MPB e outras coisas do
gênero.
Gilberto Mineiro é o que se pode chamar de uma cabeça pensante, inteligente e
provocador seja na música ou fora dela, embora geralmente procure canalizar as
suas discussões para o campo da qualidade musical, sendo implacável com aquilo
que ele considera de baixo nível. Com ele, sempre temos a garantia se uma boa
conversa.
Como apreciador do velho e bom rock and
roll eu também lá estava, totalmente envolvido por aquele recital de
guitarra, baixo e bateria no meio de jovens cabeludos, a maioria trajando
preto, alguns portando correntes e outros adereços punk, outros dançando as suas gingas e cabeçadas, mas tudo dentro
de muita alegria e – pasmem! – muita paz e ordem, ao contrário do que certamente
temiam os pais e acompanhantes, e também os donos de bar mal avisados.
Aquilo foi o início de uma nova era.
Hoje em dia, as bandas de rock maranhense saíram da toca e se apresentam em diversos bares, pubs, restaurantes e casas noturnas, praias
e praças, puro em qualquer dos seus estilos ou na forma de blues, e ao contrário de que temiam os proprietários dos locais, a
distorção das guitarras e o frenesi da bateria seguem atraindo público de todos
os matizes.
Graças à teimosia de bandas pioneiras como Digital 4, Daphne, Alcmena, Whydia,
Camisa de Força e Paul Time, e mais tarde Página 57, The Mads, Pandha S.A. e tantas
outras, e graças ao trabalho de produção e divulgação de Gilberto, o rock passou a ser participante da cena
musical da cidade.
Enquanto eu acompanhava o entusiasmado balanço de uma das bandas daquele Equator
Rock Festival, um jovem com não mais do que quatorze anos me observava,
curioso.
Trajando roupas sem qualquer espalhafato e sem nenhuma parafernália que
denunciasse sua apreciação pelo que estava acontecendo no local, ele tomou
coragem e fez a pergunta que o estava intrigando, dada a minha idade avançada
para aquelas estripulias: “Mas, tio, você
gosta mesmo disso?!...”
Eu respondi com toda a sinceridade histórica que o momento merecia: “Meu filho, quando ‘isso’ começou a
acontecer, eu tinha mais ou menos a sua idade. E nunca mais parei de ouvir e de gostar...”
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