NASCIMENTO
(Excerto)
Já quase percebo uma luz no fim do túnel.
Pressinto a morte, e uma terrível tensão
se apodera de mim. Quero agarrar-me às paredes lisas que me cercam, mas elas se
movem e me repelem e me empurram, prontas para me atirar rumo ao desconhecido.
Parece ser inevitável esta ruptura, esta
tragédia, já penso ouvir rumores estranhos, sons de vozes e uma expectação
agoniada me abraça.
No princípio era o tédio, a imobilidade,
a escuridão constante e eu procurando entender o que eu era, o que fazia e o
que de mim se esperava, encolhido e surdo.
Me assusta a ideia do inevitável, de passar
para outra esfera, de ser numerado, rotulado e colocado para competir com
milhares de outros. Milhares, milhões. Parece que já vivi essa outra vida, pois
alguma coisa dentro de mim me provoca arrepios, adivinhando os momentos
terríveis que me esperam, a angústia e o ódio, a solidão e o medo, o caos.
Tenho vontade de me agarrar a algo, mas
as paredes continuam a me expulsar, lisas e pulsantes.
Hei de lutar até o fim contra esta
agressão, esta prepotência, contra esta natureza, quero continuar a viver assim
como sou, mesmo sendo um parasita inútil. Antes ser inútil agora do que
enlouquecer depois.
Há uma expectativa no ar: sinto que do
outro lado outros seres também estão tensos, nervosos, agitados e preocupados
com meu evento.
Já percebo enfim a luz no fim do túnel e
sei que estou me aproximando da minha próxima morada.
Sinto um mal-estar inexprimível, estou zonzo,
cego, a cabeça me segue apertada como se por um torniquete, a luz ficando mais
forte e um grito rouco escapando do meu peito, num protesto inútil e alucinado.
Deus! Já estou fora do túnel. Primeiro,
uma confusão de cores e brilho, e de repente um frio e um pavor inesperados,
esperados. Esperados como a necessidade de enfrentar o meu destino.
Estou na minha outra vida, no meu outro
mundo.
Nasci, como todos pensam, ou morri, como
me sinto?
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