A LUXÚRIA
(Augusto Pellegrini)
Luxúria é uma coisa que gera margem a
dúvidas.
Apesar de no dicionário ficar
subentendido como “o suprassumo da libertinagem”, isto é, sacanagem da grossa,
e também como o “superlativo da natureza em viço” – e eu disse viço, não vício
– esta palavra não é mais usada na sua forma e dimensão real ou então já não se
peca mais como antigamente.
Até o pecado anda perdendo a graça.
Antes era tudo proibido, tudo escondido,
saboroso como a maçã do Jardim do Éden, mesmo com o risco iminente de que
surgisse um vetusto senhor de barbas brancas e olhar iracundo, o dedo em riste
e o cajado a brandir para a expulsão perene do pecador.
Na terra das celebridades, dos reality
shows e da internet, porém, o pecado vai assumindo a sua forma eletrônica, e a
sensualidade vai invadindo as nossas casas pelas frestas da porta e da janela,
através de livros, revistas, jornais e vídeos, e aí a luxúria se
descaracterizou, virou artigo de consumo e, sendo “prêt-à-porter”, perdeu
aquela antiga imponência.
Já não se despem as mulheres com os olhos,
pois elas já vêm despidas, já não se imagina o que uma freirinha teria de sobrenatural
porque ela já é supernatural, já não se escondem segredos por debaixo das
batinas franciscanas.
Até a palavra “luxúria” perdeu aquele
grandiosismo, aquela majestosidade, aquele lirismo, aquela magia.
Mas a luxúria continua presente no
desfile da escola de samba, no espartilho de madame Du Barry, no olhar de
Casanova, no busto tridimensional das Sofia Lorens do século 21, em Baco com
seus cachos de uva, no tapete persa, na odalisca e no perfume francês.
Luxúria não é uma mulher vulgar se
fazendo de fácil e sim a maior das cortesãs fazendo o jogo do difícil para o
amador apaixonado.
Luxúria não é a simples intimidade da
alcova e sim a própria alcova transpirando desejos incontidos.
Luxúria é champanhe com cortinas de
veludo vermelho ao fundo. E violinos ao luar.
Luxúria não é o “strip”.
Luxúria é o “tease”.
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