TEMPEROS À ITALIANA
(Conto publicado do livro “À Noite,
Todos os Gatos”, em 1998)
(Epílogo)
Garçons corriam como galinhas espantadas.
Carlino, o dono, pôs as mãos na cabeça, a senhora gorda desmaiou e o
empertigado da calva pronunciada engasgou com o risoto de frutos do mar e
estava azul de tanto tossir.
Levantei-me calmamente olhando para o
semblante traquinas de Calcedônia que mirava o bilhete jogado sobre o prato
regado a finas ervas e me dirigi à porta onde outra melindrosa artisticamente
desenhada por entre os caixilhos sorria como Jacqueline Baker.
Dei a volta por detrás da máquina de café
instantâneo – “crema caffè naturale funziona senza vapore” –
enquanto via Fiordermundo enlouquecido como um lutador de “catch-as-can” sendo seguro firmemente pelo robusto porteiro e pelo maître, ainda berrando – “velhaco!”, “vagabundo!”
– para o corpo inerte outrora belo lambuzado de crema di noci e mortalmente ferido, se não na sua saúde, pelo menos
no seu orgulho.
-0-
De volta à calmaria das ruas, decidi que
retornaria no dia seguinte para pagar a conta, isso se Carlino não computasse
tudo por conta do prejuízo e pespegasse uma nota de despesas avolumada na conta
do professor.
Decidi também que voltaria a procurar o
professor depois desta ação de pugilato para voltarmos a conversar sobre
assuntos não ortodoxos como os que regaram o nosso lauto almoço junto com os
Valpolicella, Strega & Cia. e também para melhor observar suas reações de Homo sapiens, pois agora eu tinha
certeza de que ele era realmente o tipo ideal para estrelar o meu próximo
romance. É lógico que eu iria manter uma considerável distância de Calcedônia,
que já mostrara do que era capaz em termos de provocar encrencas.
Passei pelo bilheteiro que continuava
sentado ao lado da jardineira apreciando o cinza da tarde, pensando em de que
forma os palpites podem acontecer no nosso dia-a-dia – o galo cantador, o leão indomável,
o pavão presunçoso, a vaca gaiteira...
Isso posto, considerei com certeza que
gato, cachorro ou macaco, eu tinha comprado o bilhete errado.
Nenhum comentário:
Postar um comentário