AS CORES DO SWING
(Livro de Augusto Pellegrini)
CAPÍTULO 3 – A MAGIA DO SWING
Mas
afinal, qual a magia do swing e quais
são as causas do seu sucesso?
Se
analisado dentro do aspecto puramente social e antropomórfico, o swing tem como referência a Depressão
nos Estados Unidos, do mesmo modo que o culto do jovem pela rebeldia trouxe à
luz o rock and roll nos anos 1950 e
1960, a curtição inconseqüente e o niilismo motivariam a discoteque e a música dos anos 1970, o ressentimento social traria
como conseqüência o heavy rock dos
anos 1980 e o escapismo produziria o extreme
metal (death, punk, stoner) do
final do século vinte.
Mas
a explicação para a existência do swing
vai além disso.
Na
verdade, é difícil definir o que venha a ser swing, mas morfologicamente, considerando que o próprio termo
significa balanço ou pulsação, podemos chegar à conclusão de que se trata de um
ritmo contagiante com base num compasso mais maleável e mais gingado do que
aqueles observados no jazz tradicional ou na música de orquestra convencional,
que eram as referências americanas da época. Este movimento dançante contínuo,
conhecido como “jive”, se manifesta
através de uma multiplicação de sons obtidos por meio das intervenções dos
naipes de instrumentos vocalizados, conhecidas como “riffs”.
O swing foi o primeiro estilo musical que
falou diretamente ao coração humano coletivo, fazendo a alma rir, e gerando no
corpo uma necessidade incontrolável de se movimentar e de manifestar a sua
emoção sem depender exclusivamente do ritmo ditado.
Alguns
dirão que as danças folclóricas provocam a mesma reação, e que o próprio jazz
tradicional também provoca uma ação cinestésica que se manifesta com palmas e
com a marcação do ritmo com os pés. Mas, ao contrário destas referências, o swing convida os casais a dançarem
livremente, como se quisessem voar, cada qual se expressando como convém à sua
própria vontade.
O swing faz um enlace entre a emoção e uma
sensação puramente material, pois ao invés de ser simplesmente um veículo que
auxilia na dança de salão ou de apenas possuir um efeito contemplativo como outros
estilos de jazz, ele provoca uma manifestação predominantemente física através
dos acordes, do ritmo e do movimento.
O swing possui uma cadência terrivelmente
excitante e sugere uma aceleração no ritmo – o que na verdade não acontece –
contendo na sua essência todas as boas influências musicais descobertas pelos
pioneiros da Louisiana, às quais foi acrescentado um brilho cintilante.
O swing é uma música que reúne o balanço
sincopado do ragtime, a harmonia
dolente do blues, a força percussiva
do stomp e a melodiosidade das
grandes orquestras, e tem o efeito de uma injeção de adrenalina na veia. O swing é uma fusão musical que abriga sob
o mesmo manto a intuição do negro escravo, o misticismo da música religiosa, a
interpretação irriquieta dos pianistas dos barrelhouses
e dos cabarés mal afamados, a irreverência dos músicos de Nova Orleans, a
organização das bandas militares e a suntuosidade das orquestrações europeias.
Além
disso, o swing possui uma referência
histórica, pois marca a introdução maciça dos vários tipos de saxofone na
música de jazz de modo que todos eles pudessem ser soprados ao mesmo tempo. Com
isso, houve uma mudança radical no line-up
do jazz, já que as formações de dixieland
geralmente utilizavam clarinete, trompete e trombone na linha de frente e via-de-regra
ignoravam o saxofone. O swing não
apenas adotou o saxofone, como adotou todos seus tipos de uma só vez!
O swing também concorreu para que o violão
ou guitarra tivesse maior destaque em termos de harmonia, introduziu modulações
nos arranjos orquestrais e tornou possível uma música de som mais aberto e
generoso, e de timbre variado, sem jamais perder a característica do jazz como
seu elemento base.
Assim
como os pop-stars de hoje, muitos
músicos de swing eram venerados tanto
quanto os principais astros de Hollywood. Suas fotografias e algumas
indiscrições sobre as suas vidas particulares eram estampadas nas páginas dos
jornais e revistas, cuja leitura fazia a cabeça de muitos aspirantes que
sonhavam com um futuro parecido, e levava ao delírio muitos fãs que
acompanhavam as aventuras e as desventuras dos seus artistas preferidos.
Guardadas
as devidas proporções, pode-se perfeitamente comparar o comportamento
irrequieto das gerações que surgiram com o rock-a-billy
até o evento Woodstock – e das subsequentes correntes de vanguarda – ao
comportamento não conformista dos jovens americanos dos afamados anos 1920 e
1930, juventude conhecida como “flaming
youth”, composta de swingers e bad boys, todos à procura de emoções
fortes e de alguma futilidade, mas também de uma música excitante para
descarregar a adrenalina concentrada há décadas por conta de uma educação
rígida e patriarcal.
Adicionalmente,
além de mexer com o comportamento social, o swing
trouxe também uma alteração no comportamento das orquestras.
Com
a sua chegada, o papel do líder do grupo mudou radicalmente. A postura de
alguns maestros da escola antiga, como Paul Whiteman e Paul Ash, que se
colocavam à frente da orquestra movimentando a baqueta como se estivessem
regendo uma orquestra sinfônica, foi substituída paulatinamente por bandleaders que também tocavam
instrumentos e, como tal, se limitavam a alguns gestos quando queriam indicar
algum acidente musical, como alterações no andamento e na tonalidade da música,
ou marcar a entrada dos naipes de instrumentos ou a alternância dos solistas. Bandleaders como Duke Ellington, Benny
Goodman, Glenn Miller, Tommy Dorsey, Artie Shaw e Harry James variavam
sucessivamente o seu papel entre orientar a orquestra e tocar os seus respectivos
instrumentos.
Da
mesma forma, músicos que simplesmente faziam parte do grupo nos tempos dos
maestros de baqueta passaram a ter mais oportunidade de aparecer durante a
apresentação, solando suas passagens e se tornando às vezes tão famosos quanto
seus chefes, a ponto de também merecerem destaques nas páginas dos jornais e
das revistas. Músicos como Gene Krupa, Cootie Williams, Coleman Hawkins, Lester
Young, Roy Eldridge e muitos outros começaram as suas bem-sucedidas carreiras
desta maneira.
As
orquestras de swing eram bastante
versáteis, pois ao mesmo tempo em que aqueciam a música, dando a ela um brilho
e uma pulsação alegre e motivadora, elas também podiam acalmar o ambiente com
baladas românticas e sentimentais, utilizando uma cadência relaxante que
substituía com vantagem a valsa e outras músicas açucaradas de cunho
exageradamente piegas. Se por um lado havia as eletrizantes “Opus One” (Sy
Oliver e Sid Garris), “Flying Home” (Benny Goodman, Eddie DeLange e Lionel
Hampton) e “Sing, Sing, Sing” (Louis Prima), do outro lado o público podia
suspirar ao som de “Stardust” (Hoagy Carmichael e Mitchell Parish), “Serenade
In Blue” (Mack Gordon e Harry Warren) ou “I’m Gettin’ Sentimental Over You” (Ned
Washington e George Bassman) – e tudo isso podia seu ouvido todas as noites,
seja nos ballrooms, nos hotéis ou nas
emissoras de rádio.
Algumas
orquestras – caso de Artie Shaw e posteriormente Dizzy Gillespie – foram mais
além, adicionando ao molho alguns ingredientes latinos inspirados no mambo,
ritmo cubano criado por Orestes López e Chachao López que invadiu Nova York em
1939 – sem, no entanto, abdicarem do jazz, presente no balanço, na sonoridade e
nos riffs da música. Outras – como as
do próprio Artie Shaw e também de Harry James – não abriram mão de naipes de
violinos para ajudar no equilíbrio melódico e na harmonia refinada quando
necessário.
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