AS CORES DO SWING
(Livro de Augusto Pellegrini)
CAPÍTULO 9 - A MARATONA
(continuação)
Na
tarde-noite da
estréia lá estavam Phil e Susan, de mãos dadas como dois namorados, vestidos
com a sua melhor roupa de domingo e ansiosos para o início da aventura, ele
trazendo na face o sorriso apalermado dos apaixonados, ela com a expressão
triunfante dos vencedores brilhando num rostinho bonito.
Eles receberam o
número vinte e sete pintado num quadrado de pano que foi costurado às pressas
nas suas costas, e juntos com os demais participantes foram colocados a par das
instruções finais: todos os casais dançariam ininterruptamente até que
sobrassem apenas cinco duplas, quando um júri composto por três pessoas –
“especialistas”, segundo o orientador – iria determinar quais seriam os
vencedores do primeiro ao quinto lugar. Os prêmios, que ainda não haviam sido
estipulados, seriam pagos na noite desse mesmo dia, na presença do público.
Muitos produtores
de shows estariam presentes – ele afirmou – portanto era possível que algum
casal caísse nas graças de algum deles para estrelar, quem sabe, na Broadway,
ou até mesmo – frisou ele, arregalando os olhos – em Hollywood!
Finalmente o
Senhor Benson se retirou de cena, deixando um auxiliar encarregado de continuar
com a peroração, alertando para detalhes específicos como alimentação,
necessidades especiais de higiene e atendimento médico. Não estava descartada
uma desclassificação antecipada, que poderia acontecer a critério exclusivo da
organização, sem direito a qualquer tipo de reclamação.
Todos assentiram
mudamente, como soldados que se preparam para iniciar uma batalha decisiva.
Soou então uma
sirene estridente e irritante, marcando o início do concurso, ao som da
orquestra de um tal Dale Johnson, que atacou um conhecido sucesso de Cab Calloway denominado “The Man
From Harlem”.
Com mais de
sessenta casais rodopiando no enorme tablado foi iniciada a maratona, cujo
final era inteiramente imprevisível. Do lado de fora chapéus eram atirados para
o alto, e gritos de “hurrah” podiam
ser ouvidos mesmo por quem estivesse longe, como se o público estivesse num
rodeio do meio-oeste.
O baile seguiu
noite adentro, e quem se postasse a uma centena de metros de distância podia ver
um enorme salão iluminado e sonoro, servido por janelões generosos que
ventilava o ambiente e tornava a música quase etérea.
-0-0-0-
No início, tudo
parecia muito divertido.
Alguns casais –
não era o caso de Susan e Phil – esbanjavam precocemente uma energia que iria
fazer falta no futuro, sem atentar para a duração imprevista da maratona que
ali se iniciava.
Passados oito
dias, lá estavam Susan e Philip, completamente alheios ao mundo exterior,
vagando como dois fantasmas, sem conseguir sentir as pernas, magros,
macilentos, com a roupa suja e amarrotada, os sapatos rotos e os pés em
pandarecos.
Lá fora o sol se
punha, preguiçoso, marcando o final de mais um dia de provação.
Do centro do
ringue se espalhava um odor acre e nauseabundo que pairava por todo o
auditório, mesmo com a ventilação que provinha de um largo portão e dos
janelões laterais estrategicamente abertos.
Dos sessenta
casais que haviam iniciado a empreitada ainda restavam sete, Phil e Susan
incluídos. Os pares haviam perdido a noção de espaço, e apesar da imensidão do
tablado ainda de trombavam e se esbarravam, como que procurando um apoio
inconsciente.
Os olhares sem
brilho se cruzavam no vazio, sem se ver, como se todos fossem espectros.
De repente, Susan
sentiu que o chão começou a se deslocar, como se tivesse apoiado sobre rodas.
Olhou para o alto e viu as lâmpadas de iluminação a gás girando como se fossem
levantar voo, completamente fora de foco para os seus olhos opacos.
Ela tentou
resistir, mas a sensação era mais forte. Susan foi levada pelo turbilhão, se
agarrou a Philip com todas as forças que lhe restavam e deixou cair seu corpo
sobre o dele.
Ela se viu
flutuando, e a dor que sentiu quando bateu a cabeça com força no tablado fê-la
pensar que o céu tivesse desabado sobre eles.
Abriu novamente os
olhos e viu Phil também caído, a boca aberta salivando e a face pálida e sem
expressão, enquanto ouvia gritos e gargalhadas que pareciam vir de um túnel de
vento.
A aventura chegara
ao fim.
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