segunda-feira, 12 de outubro de 2020

 


AS CORES DO SWING
           (Livro de Augusto Pellegrini)

CAPÍTULO 15 - O EFEITO SWALL STREET
           (continuação)

Por estranho que possa parecer, mesmo com um índice de desemprego e falências jamais experimentado, havia no ar alguma expectativa de que a situação econômica desfavorável não durasse muito tempo, e de que tudo não passava afinal de um mal estar passageiro.

Pelo menos era assim que entendiam alguns dos sábios do sistema econômico, que consideravam os problemas de Wall Street apenas uma crise um pouco mais aguda do que o normal. Na opinião destes financistas, o sistema se estabilizaria por si só, por meio dos intrincados mecanismos da oferta e da procura, e a volta à normalidade seria apenas uma questão de semanas.

Antes da derrocada, quando o milagre econômico já dava mostras de ser bom demais para ser verdade, o economista britânico John Maynard Keynes, um dos pais do capitalismo liberal, dava seu palpite a respeito do futuro dos Estados Unidos, com base no crescimento do volume de negócios nas Bolsas de Valores.

Numa palestra proferida na Universidade de Cambridge–Inglaterra em 1927 enquanto promovia a divulgação do seu livro Liberalism And Labour, Keynes garantia que “we will not have any more crashes in our time” (“nós não teremos mais nenhuma quebra de Bolsa nos nossos tempos”), se referindo ao Reino Unido em especial, mas tendo como base os alicerces de Wall Street.

No dia 12 de janeiro de 1929, o presidente da poderosa Pierce Arrows Motor Car Co., Myron E. Forbes, declarava de uma forma otimista numa reunião de acionistas que “there will be no interruption of our permanent prosperity” (“não haverá qualquer interrupção na manutenção do nosso lucro”), opinião que seria confirmada em setembro, portanto um mês antes da tragédia, pelo economista americano Irving Fisher, que tranquilizava o mercado e os acionistas, afirmando que “there may be a recession in Stock prices, but not anything in the nature of a crash” (“poderá haver alguma recessão nos valores da Bolsa, mas nada que possa significar uma quebra”).

No fatídico 24 de outubro, mesmo quando o pânico já havia se instalado e que os castelos de cartas começavam a ruir, o presidente do Conselho do Banco Continental Illinois de Chicago, Arthur Reynolds, ainda estava persuadido de que tudo não passava de uma instabilidade passageira. Ele declarou aos seus diretores, convocados para uma reunião de emergência – “This crash will not have effect on business” (“esta quebra não terá nenhum efeito nos negócios”), o que mostra uma certa ingenuidade e prova a confiança ilimitada que os capitalistas da época tinham no sistema.

Em muitas outras declarações, figurões como o economista Stuart Chase (que se notabilizou pela luta em defesa do consumidor e pelas críticas feitas à propaganda enganosa), o Secretário do Tesouro Andrew W. Mellon, o respeitado autor e analista financeiro Reed W.McNeel e o presidente da Equitable Trust Company, Arthur W.Loasby, se preocupavam em tranquilizar a população e mostravam claramente não acreditar que a situação fosse tão séria.

Eles não queriam admitir, mas na verdade o país experimentava a sua pior crise desde a Guerra Civil de 1861, que viria gerar mais de quinze milhões de desempregados. Em 1933 a taxa de desemprego atingiria à marca sufocante de 25%, correspondendo a um quarto de toda a força de trabalho americana. Poucos eram os americanos que tinham dinheiro para gastar, e a situação se agravava nas classes mais pobres e entre os negros.

Os problemas financeiros iam desde o fechamento de instituições financeiras até falências no comércio e na indústria, o que provocaria intensos problemas sociais, como a fome, as doenças e a insegurança, com grupos de pessoas saqueando pontos estratégicos onde gêneros alimentícios e medicamentos pudessem ser encontrados.

A crise de 1929 não se limitou aos Estados Unidos. Ela se espalhou pelo mundo e fez estragos em diversos países, especialmente na Alemanha, Austrália, Itália, França, Reino Unido e Canadá. O Brasil e o restante da América do Sul não foram tão fortemente afetados por não serem na época países industrializados, e a União Soviética, fechada à economia capitalista, não deu sinais de sentir o problema.

Na Alemanha, a recessão influenciou na história do país e do mundo, pois fez surgir o Partido Nacional Socialista, propiciando o nascimento político de Adolf Hitler.

Com toda esta convulsão atingindo Wall Street, o coração financeiro de Nova York, todas as atividades dos Estados Unidos sofreram um considerável abalo, e a música não seria uma exceção.

A maioria dos músicos profissionais procurou refúgio em casas clandestinas onde tocavam por uma ninharia numa situação de risco total, pois ninguém garantia que os contratos seriam cumpridos conforme combinado. Além do mais, a violência campeava na noite das grandes cidades, onde a Máfia controlava seus territórios na base da bala.

Louis Armstrong logo percebeu que “o mar não estava para peixes” e mudou a sua estratégia de conduta. Ao invés de procurar contratos de médio prazo com as melhores casas noturnas de metrópoles como Chicago ou Nova York, ele afivelou as malas e começou a fazer turnês curtas que iam até a Califórnia. Para assegurar que o público se faria presente, Armstrong modificou seu repertório, dando ênfase às músicas mais populares e menos jazzistas, como “My Sweet”, “Memories Of You”, “Just A Gigolo”, “Blue Again” e “Them There Eyes”, às quais adicionava o seu estilo brincalhão.

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