terça-feira, 17 de novembro de 2020

 


AS CORES DO SWING
(Livro de Augusto Pellegrini)

CAPÍTULO 18 - AS RAZÕES DO DECLÍNIO
(continuação)
       

           Quando a Segunda Guerra estourou, em 1939, os Estados Unidos conseguiram manter distância da zona de conflito por algum tempo, apesar de defenderem abertamente a posição da França e da Inglaterra, que haviam se aliado contra as forças alemãs – estas mais tarde reforçadas pelos italianos – colaborando intensamente com a logística de guerra e auxiliando no esforço bélico com recursos materiais.

Aí então o Japão começou a sua própria guerra, fazendo uma aliança independente com o chamado Eixo, e reforçando a visão apocalítica de um mundo totalitário. O bombardeio de Pearl Harbor, base militar americana no Pacífico, no dia 7 de dezembro de 1941, finalmente forçou os Estados Unidos a entrarem de cabeça no conflito, o que veio adicionar uma série de problemas sociais e econômicos à nação.

O país reagiu entre o indignado e o surpreso ao que se chamou de “vil traição do Império Japonês”, porque o ataque fôra inesperado e, de acordo com os americanos, sem um motivo aparente.

Mas havia um motivo, na verdade.

A Liga das Nações, organismo político apartidário que antecedeu a ONU, liderada pelos Estados Unidos e pela Inglaterra, havia votado uma moção de censura ao Império Japonês pela sua beligerância na Ásia, criando uma relação diplomática insustentável depois da invasão da China pelos nipônicos em 1937. Por outro lado, os japoneses entendiam que uma base militar americana tão poderosa nas cercanias das suas ilhas, se constituia numa forte ameaça à sua segurança nacional. Daí, aproveitando o estado de guerra que reinava no mundo e a desatenção americana, resolveu atacar e destruir Pearl Harbor.

Com a entrada dos Estados Unidos na guerra, o jazz também tomou o seu partido. O swing vestiu o uniforme e se deslocou para as diversas frentes de batalha, com muitos músicos se alistando e partindo para o combate isoladamente ou com orquestras inteiras trabalhando sob intensos bombardeios a fim de contribuir com o moral das tropas.

A revista Downbeat mencionou num dos seus artigos que “os músicos de jazz não são neste momento apenas músicos de jazz: eles são soldados da música”.

Muitas orquestras não saíram do país, mas também contribuíram com o seu quinhão ao se apresentarem de graça para angariar fundos e participar de campanhas de bônus de guerra.

Os blecautes eram constantes, o que arrefecia ainda mais o ânimo de uma população abalada por ver seus filhos partindo para a luta na Europa, na Ásia e no norte da África, e criava por assim dizer um estado de pânico, pois apesar da enorme distância que o país se encontrava das frentes de batalha, sempre havia o temor de que a aviação alemã pudesse atravessar o Atlântico e despejar bombas nas principais cidades do leste americano, o que incluía Nova York e a capital Washington D.C.

E, embora a costa oeste não fosse tão próxima do inimigo japonês, os cuidados tomados com a proteção de San Francisco, Los Angeles e outras cidades à beira do Pacífico foram redobrados.

Além disso, o governo estabelecera um imposto de vinte por cento sobre todo tipo de diversão, o que ajudou na economia de guerra, mas contribuiu ainda mais para o esvaziamento dos ballrooms. Isto, somado ao racionamento de combustíveis e de pneus, complicou o deslocamento das orquestras que firmavam contratos para se apresentar em outras localidades do território americano. Sem a possibilidade de viajar nos seus próprios carros, os músicos tinham que utilizar os luxuosos e caríssimos trens Pullman, o que encarecia e inviabilizava muitas turnês.

Por fim, o esforço de guerra acabou por atingir as fábricas de instrumentos musicais e também as gravadoras, pois a indústria do país teve que dedicar a sua atenção para a produção de armas, equipamentos e apetrechos como botas e cantis, além de uniformes, alimentos e medicamentos para minimizar as dores dos combatentes.

A Segunda Guerra Mundial modificou consideravelmente o elenco de muitas orquestras. Muitos músicos se alistaram, de modo que orquestras famosas, como a de Tommy Dorsey e a de Benny Goodman (Dorsey não foi para a frente de batalha por causa da idade, e Goodman por ter um problema de coluna), tiveram que substituir muitos instrumentistas de peso por rapazolas recém-saídos das escolas, obrigando-se a pagar salários altos por causa da escassês da mão-de-obra e da exigência dos sindicatos, e com isso sofrendo com a queda de qualidade.

Em apenas quatro meses o trombonista Jack Teagarden perdeu dezessete músicos da sua orquestra e a reposição foi dura e onerosa. Em igual ou menor escala, o mesmo aconteceu com Benny Goodman, Benny Carter, e toda uma coleção de big bands.

Com o custo comprometido, muitas orquestras optaram pelo encerramento das atividades, pelo menos por algum tempo, como foi o caso de Count Basie, Fletcher Henderson, e outras tantas.

Os diretores de orquestra tiveram que enfrentar, adicionalmente, movimentos paredistas das gravadoras e a pressão dos sindicatos pela busca de melhores salários e maior flexibilidade nos contratos dos músicos. Entre 1942 e 1944 as gravadoras decretaram greve geral e nem um só disco foi gravado nos Estados Unidos.

Um dos motivos que desencadeou o movimento dos sindicatos e das gravadoras contra as orquestras é que muitos artistas, especialmente os vocalistas, chamados de “crooners” – boa parte responsáveis pela presença de público – eram obrigados a assinar contratos leoninos que os impediam de fazer gravações ou shows independentes. Assim os vocalistas das principais orquestras foram aqueles que mais se beneficiaram com a contestação dos sindicatos, pois muitos deles conseguiram se desligar das amarras que os prendiam aos contratos e investir em suas mais lucrativas carreiras solo.

O caso mais notório foi a alforria que o cantor Frank Sinatra ganhou da orquestra de Tommy Dorsey em 1942, embora neste caso a lenda diga que a Máfia teve mais poder de persuasão do que os sindicatos.

 

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