AS CORES DO SWING
(Livro de Augusto Pellegrini)
CAPÍTULO 17 - O HOMEM POR DETRÁS DO TRONO
(Continuação)
Em 1927, durante a
efervescência dos anos dourados, a orquestra de Fletcher Henderson era a mais
comentada nas rodas dos críticos musicais de Nova York, que elogiavam o estilo
puramente jazzístico do grupo.
Comparações eram
feitas com outros maestros bem sucedidos do momento, principalmente com o som
cheio de maneirismos de Paul Whiteman e com o estilo intenso e sinfônico de
Duke Ellington. Os críticos consideravam a orquestra de Fletcher Henderson mais
leve, com o jazz fluindo naturalmente dentro de arranjos bem produzidos que
jamais partiam para o exagero, e mostrando uma música que chegava aos ouvidos
dos ouvintes de uma forma menos complicada, pois apesar das firulas repletas de
riffs e de efeitos, o som resultante não deixava de ser simples e fácil
de ser entendido.
Anos mais tarde, o
músico e analista Leonard Feather declarava que, mesmo com a existência de Duke
Ellington, “a orquestra de Fletcher Henderson foi a primeira a
adquirir uma grande reputação perante os músicos e os críticos, tocando o que
realmente se entende por jazz orquestral”. Ele se referia ao fato de que a
maioria das orquestras estava mais preocupada com o seu sucesso comercial, preferindo
interpretar canções de grande apelo popular do que buscar novas alternativas.
Na opinião de Feather, “muitas destas
orquestras utilizavam o jazz apenas como
um mero ingrediente, não como essência”. Evidentemente, esta crítica
específica não se aplicava a Ellington.
Mas, se talento
musical era o que não faltava a Fletcher Henderson, sua habilidade como
empresário deixava um pouco a desejar. Ele era demasiado gentil num mercado
onde predominava a agressividade na busca pelo espaço e pela fama.
Com a saída de Don
Redman, e a consequente necessidade de se concentrar nos arranjos e na parte
musical da orquestra, Henderson permaneceu durante muito tempo tocando em Nova
York, mais exatamente no Roseland Ballroom, em vez de excursionar para outras
cidades e divulgar o seu trabalho, como faziam os outros bandleaders.
Além
disso, ele cometeu um grave erro, o de querer fazer tudo sozinho, misturando a
administração das finanças e o gerenciamento dos contratos com o seu trabalho de
músico e arranjador, incluindo nisso a escolha do repertório. Esta tarefa era
muita coisa para um homem só.
A situação piorou
em 1928, quando ele sofreu um acidente automobilístico que o manteve fora de atividade
por algum tempo. Se ele já era naturalmente um homem do tipo pacato, mais
inativo ele ficou depois de se recuperar do trauma, exatamente numa época onde
cada centímetro quadrado da briga pelo sucesso era disputado por diversas
bandas.
Assim, em 1929,
muitos dos seus músicos saíram do grupo, obrigando-o a praticamente reformular
a orquestra. Henderson manteve o naipe de três clarinetes – herança de Don
Redman – e fez arranjos para ressaltar a importância do saxofone,
aproveitando-se da presença robusta de Coleman Hawkins, a fim de suavizar os
solos mais agressivos que haviam se “trompetizado” sob a influência de Louis
Armstrong. Mas algum tempo depois, Hawkins decidiu sair da orquestra e foi para
Londres iniciar uma turnê com a orquestra de Jack Hylton, um popular bandleader inglês.
Com a saída de
Hawkins e com diversos arranjos preparados para o saxofone, Henderson trouxe
para o seu lado os talentosos Lester Young e Chu Berry.
A lua de mel com
Lester Young não durou muito tempo, pois seu estilo de tocar era diametralmente
oposto ao de Hawkins, que possuía um “drive”
mais encorpado. Young não parecia disposto a ceder aos apelos de Henderson para
tocar com mais garra, e o maestro implicava com o jeito preguiçoso de Young
soprar o seu instrumento.
“Ele me convidava para ir à sua casa e ouvir
as gravações de Coleman Hawkins para
me habituar com o estilo”, contava Young. “Não reclamei nem me senti ofendido, mas deixei claro que Hawkins era Hawkins e que eu procurava o meu
próprio caminho”.
Assim, Lester
Young resolveu voltar para a orquestra de Count Basie.
Mas este era
apenas parte do problema.
Com a Depressão, a
questão financeira começou a pesar e teve uma influência negativa no desempenho
da orquestra. Mesmo assim o grupo continuou com as suas apresentações no
Roseland até 1934, embora sem mostrar o mesmo brilho. O final do contrato com o
Roseland Ballroom coincidiu com a saída de Coleman Hawkins, e com a consequente
mudança na sonoridade da orquestra.
Alguns críticos,
no entanto, creditam o acentuado declínio enfrentado pela orquestra de Fletcher
Henderson no início dos anos 1930 à sua completa indiferença pela interação com
o público. Ele não fazia concessões nem procurava saber o que os ouvintes
estavam achando da sua música, o que ajudou a criar um clima de
descontentamento e preocupação entre os seus músicos.
Além do mais, seu
declínio coincidiu com a ascensão de uma orquestra que também buscava tocar o
jazz dançante, mas o fazia de uma maneira mais moderna e com um “punch” mais vigoroso, escudada em um
músico de talento chamado Benny Goodman e em um produtor de visão chamado John
Hammond.
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