sábado, 14 de outubro de 2017




O LADO DO TORCEDOR

Quem viu as comemorações do povo egípcio na cidade do Cairo no último domingo e não está antenado nas coisas do cotidiano deve ter imaginado que eles estavam celebrando uma vitória cívica, como a capitulação de um país inimigo numa guerra ou, mais modestamente, a eleição de um novo presidente.
Na verdade, tratava-se da conquista de uma vaga na Copa do Mundo, da qual o Egito não participava desde 1990 (esta é a terceira vez que eles conseguem tal façanha – a primeira foi em 1934).
Iguais comemorações foram vistas em outros países – entre eles Argentina, Portugal e Islândia (esta pela primeira vez na história) – e aconteceram mesmo naqueles países cujas seleções ainda terão que passar por uma repescagem para assegurar a vaga, caso de Austrália e Honduras.
Participar de uma Copa do Mundo é uma realização para todo país onde se pratica o futebol, e é possivelmente uma das melhores maneiras de um povo exercitar seu patriotismo. Chegar à Copa e passar pela Fase de Grupos é motivo de orgulho nacional. Chegar entre os quatro finalistas é a realização de um sonho quase inatingível. Ganhar o título é a glória máxima.
O Brasil é o único país que esteve presente em todas as edições do torneio a partir de 1930 até hoje, e foi o primeiro a se classificar para a vigésima-primeira, Russia-2018, totalizando então 21 disputas. Em seguida vem a Alemanha, com 19 participações, pois o país não se interessou pela Copa em 1930 e foi banido em 1950 por uma sanção imposta pela Fifa em virtude dos estragos causados na Segunda Guerra Mundial. A Itália, com 18, a Argentina, com 17 e o México, com 16, vêm a seguir.
É interessante notar que mesmo sendo o país mais vitorioso, com 5 títulos conquistados contra 4 da Alemanha, 4 da Itália, 2 da Argentina, 2 do Uruguai e apenas um da França, Inglaterra e Espanha, a seleção brasileira não provoca o mesmo frenesi entre os seus torcedores que estes outros países proporcionam.
Tudo transcorreu conforme o esperado de 1930 até 1966, quando o escrete teve o torcedor ao seu lado dentro das limitações do acesso às notícias que o cidadão tinha naquela época (sem internet nem transmissão direta das emissoras de televisão, a informação era movida a telegrama e telex). Em 1970, porém, com “noventa milhões em ação”, a torcida brasileira ficou dividida entre aqueles que torciam a favor por uma questão de patriotismo e aqueles que torciam contra, por associarem a ideia de que uma seleção vitoriosa traria um bônus de simpatia ao governo militar então no poder.
A partir daí, com maior ou menor incidência, o torcedor brasileiro oscilou entre torcer pela a seleção, torcer contra a seleção e se manter indiferente, preferindo gastar os seus cartuchos com o seu time do coração.
Anos mais tarde, quando começaram a espocar as primeiras suspeitas de que a CBF não agia com a desejada lisura, somou-se ao grupo “do contra” aqueles que pregavam a derrota da seleção como uma solução para que as coisas fossem mudadas na Confederação.
O caldo entornou de vez e os insatisfeitos engrossaram suas fileiras com a sequência de fiascos da seleção, Alemanha-2006 (quinto lugar com Parreira), África do Sul em 2010 (quinto lugar com Dunga) e Brasil-2014 (quarto lugar com Felipão)
É claro que aqueles que torcem sistematicamente contra o sucesso da “canarinho” somam uma minoria que praticamente desaparece quando as vitórias vão se sucedendo, o que nos faz prever uma grande festa popular tomando conta das cidades do país caso a seleção de Tite consiga trazer o ouro de Moscou após a grande final da Copa em 15 de julho de 2018.  

 (Artigo publicado no caderno de Esportes do jornal O Imparcial de 14/10/2017)






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