domingo, 2 de agosto de 2020





AS CORES DO SWING
(Livro de Augusto Pellegrini)

CAPÍTULO 6 - A EXPANSÃO MUNDIAL DO SWING
(continuação)

Alguns compositores eruditos, na linha da chamada “European Music” (de acordo com a terminologia usada por André Hodeir) tentaram embarcar na aventura do jazz mesmo sem compreender exatamente o que era jazz naquele início de século. Na sua obra “L´Histoire D’Un Soldat”, que mistura ao mesmo tempo narração, dança, pantomima, teatro e música, Igor Stravinsky incluiu duas peças baseadas no ragtime (“Ragtime Pour Onze Instruments” e “Piano Rag Music”). Maurice Ravel introduziu o foxtrot em algumas partes da sua fantasia lírica “L’Enfant Et Les Sortilèges” e em dois concertos repletos de blue notes (“Concerto In G” e “Concerto Pour La Main Gauche”).
Darius Milhaud foi quem chegou mais perto do jazz quando compôs “La Création Du Monde” com muitos motivos do Harlem e do blues, a começar pela utilização da música “Saint Louis Blues”, de W.C.Handy, como principal referência da composição.
Mais tarde, Stravinski e Hindemith se envolveriam com a música de Benny Goodman, mas este envolvimento se daria estritamente no campo erudito.
Indo num rumo diferente, George Gershwin e Leonard Bernstein combinaram a música erudita com o jazz, mas não chegaram fazer música dançante, que era a tônica do swing.
Em 1900, a música americana ainda não havia sofrido as transformações que a levariam a ser chamada de jazz, mas o espírito de um novo som estava presente na forma de execução das marchas e no ragtime estilizado que John Philip Sousa levou para Londres e Paris com a sua banda. Além do mais, a presença do banjoísta Vess L.Ossman na orquestra trouxe um rompimento de todas as estruturas harmônicas e formas de improviso que os ouvidos daqueles europeus conservadores poderiam conceber na época.
Possivelmente, a celebridade que mais abalou os alicerces da música europeia tenha sido o clarinetista e saxofonista-soprano Sidney Bechet, que se apresentou em 1919 com a Syncopated Southern Orchestra de Will Marion Cook. O maestro suíço Ernest Ansermet proclamou que “Bechet era um gênio”, e anos mais tarde o músico americano teria uma estátua na Riviera Francesa erigida em sua homenagem.
Diversos outros músicos americanos começaram a levar para o território europeu, primeiro os rudimentos do jazz e depois o jazz já totalmente formatado, e muitos músicos do Velho Continente assimilaram com muita propriedade o espírito da nova concepção musical, sendo incentivados a compor e executar coisas semelhantes. No início dos anos 1920, muitas obras com este sentido de renovação já haviam sido produzidas por músicos europeus, alguns decididamente copiando os sons americanos, outros tentando criar um jazz com identidade própria.
O swing fez parte desta nova realidade ao lado do dixieland, e já durante os anos 1930 existiam excelentes grupos orquestrais na Alemanha, na França e na Inglaterra, que no futuro marcariam presença no mundo das big bands com a consolidação das orquestras de Kurt Edelhagen, Max Gregor, Peter Herbolzheimer e Werner Baumgart (na Alemanha), de Claude Bolling, Francy Bolland e Les DeMerle (na França), e de Humphrey Littleton, Ted Heath e Chris McGregor (na Inglaterra), somente para citar as mais conhecidas.
É verdade que no início da Era do Swing os europeus – com exceção dos músicos – viam o jazz mais como uma nova forma de dançar do que como um estilo revolucionário de música, mas ficava patente que alguma coisa diferente estava acontecendo.
E assim, de repente, um continente que tivera que se contentar por muitos séculos com o seu próprio folclore e com as sempre belas e instigantes – mas pouco inventivas – músicas regionais (como as tarantelas italianas, as czardas húngaras, as danzas flamencas, e a coreografia campestre das danças russas e cossacas) podia agora universalizar toda a sua arte musical, fazendo com que holandeses, franceses, italianos, belgas e quem mais fosse pudessem interpretar o mesmo tipo de música, sem maiores necessidades de qualquer ensaio ou mesmo de um prévio conhecimento entre si!
A influência da música americana no continente europeu se fez sentir especialmente nos anos que se seguiram após a Segunda Guerra, em especial na Inglaterra, onde cresceu de forma assustadora, propiciando uma grande escalada do blues – vide Eric Clapton, Jeff Beck, John Mayall, Long John Baldry e outros – e de orquestras diversas, como as de Sidney Lipton, Chris Barber, Freddy Randall e principalmente Ken Colyer.
O jazz chegou na Europa nos primeiros anos do século vinte e de lá nunca mais saiu. Pelo contrário, ele se expandiu, criou raízes próprias e menos de um século depois já rivalizava com os Estados Unidos no interesse do público e na quantidade de intérpretes, compositores, gravações, programas radiofônicos, festivais, clubes e locais de apresentação.


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