domingo, 9 de agosto de 2020





AS CORES DO SWING
(Livro de Augusto Pellegrini)

CAPÍTULO 7 - AS CORES DO SWING
(Continuação)

O swing surgiu como não só como um avanço inevitável da música de orquestra, mas também como um instrumento de agregação. No entanto, devido a exigências de empresários e donos de casas noturnas, ele acabou tendo que se curvar às diferenças raciais existentes naquele tempo nos Estados Unidos. Quando os músicos se reuniam para formar as suas bandas, a discriminação racial muitas vezes obrigava negros e brancos a se juntarem em formações específicas.
Geograficamente, dentro da área destinada à diversão pública, a própria Nova York contribuía com esta divisão: os brancos ficavam num quadrilátero chamado Times Square, o local das casas de espetáculos como os teatros da Broadway e os restaurantes dançantes; os negros se situavam no Harlem, um bairro-gueto onde a música fluía de uma maneira descontraída, fazendo lembrar o clima de Nova Orleans.
Esta divisão acabou por determinar dois estilos distintos de swing, o “swing das orquestras brancas” e o “swing das orquestras negras”.
O swing das orquestras brancas era mais formal, tocado dentro de esquemas bem estudados e de um fraseado mais comportado. Aparentemente, os instrumentos faziam aquilo que deles se esperava, e o som forte, alegre e melódico tinha como maior finalidade fazer o público dançar.
Apesar das inúmeras casas de espetáculos espalhadas pelo Times Square e adjacências, o ponto alto das apresentações era o Roseland Ballroom, na Broadway, para onde se dirigiam os brancos da cidade e de outros lugares à cata de diversão e de boa música. Em alguns lugares, nem sempre os negros podiam entrar. O swing novaiorquino era um prolongamento jazzístico do que as grandes orquestras haviam feito dez anos antes em Chicago.
Já o swing das orquestras negras se concentrava no famoso Savoy Ballroom, o ponto alto da apresentação das orquestras no Harlem, e possuía uma linha de interpretação que abraçava o novo estilo orquestral, mas deixava espaço para que o sentimento do blues se manifestasse. Os mais abastados e mais influentes, frequentavam o Cotton Club, que era mais refinado. Ao contrário do Roseland, o Savoy e o Cotton Club permitiam a entrada de negros e brancos, e era comum serem vistos casais miscigenados deixando pra trás o tal do preconceito e dançando com todo fervor.
O swing do Harlem era mais inventivo, e os negros apreciavam dançar ao som das suas orquestras não apenas por se sentirem “em casa”, mas também porque percebiam nelas a inefável presença das origens.
As orquestras negras tiveram como precursores os maestros Fletcher Henderson e Jimmie Lunceford, na mesma época em que Paul Whiteman era consagrado o “Rei do Jazz” ser ter conseguido achar o caminho das pedras.
Por este motivo, Fletcher Henderson, o mais influente dos dois, marcava a sua presença não apenas com relação às orquestras compostas por músicos negros, mas também como arranjador dentro da grande parte das orquestras “brancas”. A sua orquestra foi a primeira banda de swing a fazer sucesso no Harlem. Por sua causa, o termo “Harlem Swing” passou a significar uma marca de qualidade.
Henderson ingressara no mundo da música quase que por acaso, pois sua intenção, ao se mudar para Nova York, era continuar os estudos de química e matemática iniciados no Atlanta University College. Como era, porém, um pianista razoável, ele começou a trabalhar com algumas empresas editoras de música primeiro como demonstrador e depois como diretor de gravação e pianista exclusivo, chegando a acompanhar algumas famosas cantoras de blues, como Bessie Smith, Ida Cox, Alberta Hunter e Ma Rainey, o que inevitavelmente acabou por lançá-lo em definitivo no mundo artístico.
Sua concepção de maestro era diferente, pois ele via a orquestra como uma empresa e a si próprio como um gerente, o que criou uma relação diferente entre ele e os seus músicos.
Com a chegada de Louis Armstrong em 1924 após deixar a banda de King Oliver, e com a posterior chegada do saxofonista Coleman Hawkins, do clarinetista Buster Bailey e do saxofonista-arranjador Don Redman, a orquestra de Fletcher Henderson evoluiu e pode ser chamada com segurança de “a primeira orquestra jazzística de swing”, embora o termo ainda não existisse no momento.
Diferentemente das orquestras de Paul Whiteman e Jean Goldkette, somente para citar duas das mais famosas, a música de Fletcher Henderson, nascido no sul (embora na Geórgia, não na Louisiana) representava o espírito do jazz que teve origem nos plantadores de algodão e continha na sua harmonia a marca indelével do blues.
Na esteira de Henderson apareceram a orquestra de Cab Calloway (um bandleader vindo do centro-oeste que cantava e contava piadas durante o show), a de Chick Webb (um baterista corcunda e anão que era considerado um tanto biruta pelos músicos em geral, mas era extremamente técnico) e a de Count Basie (pianista vindo de Kansas City trazendo com ele o estilo “swing-blues” que havia sido moldado pelo seu antecessor Benny Moten, e que no futuro seria rotulado como “kansas city).
Havia também a orquestra do pianista Earl Hines, antigo parceiro de Louis Armstrong, e a do saxofonista Benny Carter. Hines, um expoente do jazz originário da Pennsylvania, se rendera ao swing, adaptando o seu estilo francamente tradicional à novidade musical novaiorquina. Já Carter decidira se transformar em bandleader ao herdar a direção dos McKinney Cotton Pickers com a saída de Don Redman.
Além dessas orquestras, também se destacavam os grupos de Andy Kirk e Erskine Hawkins.
Andy Kirk, um saxofonista nascido em Denver-Colorado, aprendeu música sob a tutela de um tal Wilberforce Whiteman – ninguém menos do que o pai de Paul Whiteman. Kirk se mudou para Kansas City onde efetivamente trabalhou como bandleader, rivalizando com Benny Moten como a principal banda da cidade.
Erskine Hawkins era um trompetista que, devido ao seu sopro, ficou conhecido como “o anjo Gabriel do século vinte”. Ele também tocava bateria e trombone, e se tornou famoso não apenas como bandleader, mas também como um dos compositores da música “Tuxedo Junction”, que no início dos anos 1940 se constituiu num dos maiores sucessos da orquestra de Glenn Miller.



Nenhum comentário: