AS CORES DO SWING
(Livro de Augusto Pellegrini)
CAPÍTULO 19 - O BRASIL NA ERA DO SWING
(continuação)
Foi
dos portugueses que
recebemos todo um embasamento harmônico e tonal, além dos instrumentos europeus
populares mais característicos, como o piano, o bandolim (que derivou para o
cavaquinho), o violão, e em menor escala o contrabaixo, o clarinete e o
violino.
Dos portugueses também
adquirimos a noção de síncope, harmonia e composição. Estes elementos, com a
adição do pandeiro originário da Espanha e da percussão peculiar criada pela
junção do índio e do negro, deram à nossa música popular a identidade que
faltava, fazendo surgir a “música dos barbeiros” ou “dos alfaiates” – pontos
onde os músicos se reuniam para tocar – o que seria responsável pelo
aparecimento do choro.
Se o jazz baseava
toda a sua sonoridade no blues (sua
divisão particular, suas notas dissonantes e sua batida invertida com relação à
marcha), a sonoridade da música brasileira composta no início do século vinte deve
muito às modinhas, às canções romanescas e elegias, e às quadrinhas populares
satíricas e maliciosas conhecidas por lundu.
A música que
serviria como futura referência – o choro, ou chorinho – nasceu por volta de
1870, na mesma época em que o jazz começava a ser forjado para representar o
que seria a música americana do novo século. O choro despontou como um jeito
brejeiro de interpretar a música europeia dançante e acabou se impondo como o
primeiro gênero musical genuinamente brasileiro.
O choro era
composto e executado tanto por instrumentistas populares dotados de muita
imaginação e virtuosismo (embora muitos deles não possuíssem educação musical
formal) como por compositores eruditos de grande reconhecimento público, o que
vem demonstrar a enorme abrangência que esta música teve entre os aficionados
da arte musical.
A nossa primeira
geração de chorões, ainda no século dezenove, inclui nomes como Joaquim Antônio
da Silva Calado, Viriato Figueira da Silva e Luiz Virgílio da Silveira. Já o
início do século vinte trouxe Chiquinha Gonzaga, Ernesto Nazareth, João
Pernambuco, Anacleto Augusto de Medeiros, José Gomes “Zequinha” de Abreu e
Alfredo da Rocha Vianna Filho, o Pixinguinha.
Apesar de os
músicos brasileiros da época jamais terem rotulado a sua música como “jazz”,
algumas bandas que interpretavam o choro – e também o samba, o lundu, a polca e
o maxixe (que eufemisticamente era também chamado de “tango brasileiro” para
fugir da má reputação que lhe era atribuída) – se autodenominavam “jazz bands”.
Estas “jazz bands” não possuíam uma noção muito
exata do verdadeiro jazz que era tocado nos Estados Unidos, e para justificar a
sua denominação, incluíam no seu repertório uma série de fox-trots e alguns sucessos do ragtime.
Algumas das bandas chegaram a determinar também um lineup composto por clarinete, trombone e trompete, muito
semelhante ao das bandas de jazz tradicional, sem, no entanto, apresentarem um
resultado musical que fosse condizente com o jazz de Nova Orleans ou Chicago.
Como resultado, no
final dos anos 1920, enquanto as jazz
bands brasileiras ainda tentavam produzir um arremedo do jazz de Nova
Orleans, os americanos já haviam passado esta etapa e vivenciavam a Era do Swing.
Este fenômeno está
detalhado no livro “Jazz – Das Raízes ao
Pós Bop” (2004, Editora Códex, São Paulo-SP), de minha autoria, conforme
abaixo transcrito da página 348:
“Também eram interpretadas outras músicas
trazidas do cancioneiro norte-americano, mas que não podiam ser efetivamente
traduzidas como música de jazz, da qual, na prática, continham apenas o nome, a
origem e as blue notes.
Enquanto o jazz era produzido e consumido nos Estados
Unidos e na Europa, e já havia percorrido alguns estágios, partindo dos estilos
dixieland e chicago, e começava a sua iniciação no swing, o que se fazia no
Brasil era apenas um reflexo distante desta última tendência”.
Por este e por
outros motivos que deram origem a um nacionalismo crescente, como será visto
adiante, o swing – mola propulsora do
jazz durante a década de 1930 e boa parte da década de 1940, acabou jamais
acontecendo no Brasil na mesma medida em que acontecia nos Estados Unidos ou na
Europa.
Quando o Brasil
abriu os olhos e os ouvidos para o jazz, o swing
já havia cedido espaço para o bebop e
suas consequências.
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