A BUSCA E A FUGA
(Augusto Pellegrini)
Olhos verdes me fitam, mas não com a
expressão que eu desejava. Não era esse olhar, um olhar de mil olhos olhando
para dentro de mim, perfurando vísceras e alma, um devasso devassado.
Estes mil olhos me cercam e me antagonizam
e me agonizam e me agoniam, e me perseguem, sou levado pela força do olhar como
se estivesse num labirinto, sem vontade, sem defesa, uma fera acuada.
Tento escapar e escapo por uma porta,
mas me vejo num beco sem saída. Sigo tateando pelas paredes que se multiplicam
à procura de outra porta, a verdadeira, como se existissem portas verdadeiras,
como se existisse alguma saída.
Enfim uma porta se abre e eu vejo à
minha frente um jardim a perder de vista, com enormes figueiras, tulipeiras e
rododendros tingindo o teto copado com múltiplas cores, e também vejo samaúmas e
jacarandás enquanto o sol esforça para jogar seus raios sobre a relva espessa e
pela senda por onde corro.
Corro buscando a saída de um jardim que
parece não ter fim e tenho a impressão de que o jardim também corre, mas no
sentido contrário e com a mesma velocidade e com o mesmo pânico, só para anular
os meus passos. Não deve ser fácil pertencer a este jardim e a este mundo.
Diviso um portão que também está fugindo
em vez de se aproximar, mas num supremo esforço eu chego ao lado de fora.
De repente, tudo muda. Não sinto mais o
peso dos olhos verdes a me perscrutarem, nem os galhos transformados em garras a
me perseguirem, nem o musgo a me agarrar os pés e me vejo finalmente livre.
A rua está deserta e lá ao fundo um
homem caminha à procura do seu horizonte.
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Quando eu ando solitário pelas ruas
penso às vezes coisas que seguramente já foram pensadas por outros solitários
como eu.
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