PÁGINAS ESCOLHIDAS
COISAS
(1988)
(Augusto Pellegrini)
O
JANTAR
Duas lágrimas, uma de cada olho.
Só aquilo me deu vontade de mandar o diabo para o diabo.
Duas lágrimas são duas lágrimas, e além do mais tendo a mão como anteparo para que eu não visse os olhos tristes e o rosto vermelho, pedindo para ser mordido.
E nossas mãos se apertando,
em mudo desespero.
Nat Cole ao fundo cantando aquelas melodias de alguns anos atrás, de alguns séculos atrás, o que me faz sentir neste instante como um pré-histórico da pré-história, a mente funcionando sem funcionar, um remoinho de pensamentos, por que? por que?, duas lágrimas, dois rios, um desabafo sem palavras e a cena ficando cada vez mais fora de foco…
Além do vidro imenso da parede do
restaurante estão os edifícios frios e a tarde fria. Sobre a mesa uma cerveja
fria com copos mortos de espuma seca, a música fria, nossas mãos também frias e
duas lágrimas quentes.
(Drama de um casal clandestino lamentando um
amor proibido)
Nenhum comentário:
Postar um comentário