PÁGINAS ESCOLHIDAS
COISAS
(1988)
(Augusto Pellegrini)
POUCOS
TRECHOS COM CLAUDETE
Se é frio,
não o sinto.
Tenho o calor que me percorre as veia e um ardor no rosto crepitante que deve
estar vermelho, mas não de vergonha.
Por mais que me olhe eu não consigo me ver, nem meus óculos me veem, eles
principalmente, se eu estivesse for a de mim não seria a mesma coisa. Ou talvez
fosse, pensando melhor, e eu não me visse nem assim, como um fantasma não se
vê, e eu sou um fantasma, vagando assim deste jeito.
Em outros termos, digo que me encontro – mesmo não me encontrando – caminhando como
um pião, cerca de trinta graus de excentricidade, um pendulante satélite
girando ao redor das portas fechadas, riscando o chão com a minha ponteira rodopiando
em volta das latas de lixo da madrugada.
Não sou excêntrico, estou excêntrico, isto sim.
E aquela luz amarela projeta a minha sombra de marionete na calçada.
(O autor,
devidamente embriagado, depois de sair da boate onde acaba de conhecer Claudete,
a mulher misteriosa)
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