segunda-feira, 14 de dezembro de 2020

 


DÚVIDA
(Augusto Pellegrini)

Com um olho aprova, com outro fulmina
Maldita sina

Com um pé me segue, com outro me chuta
Me catapulta

Um olho me vê, outro me nega
E não me enxerga

Uma mão me afaga, outra me espanca
E me desbanca

Um braço abraça, outro me empurra
Me trata às turras

O peito suspira e arrota forte
O bafo da morte

O olhar me adula, o olhar condena
À pesada pena

Sorri de amor, sorri de escárnio
Riso do diabo

O gesto benze, o semblante enxota
Me vê de costas

Sinto paixão, sinto ódio intenso
Mas me convenço

Que o lado certo, o lado primeiro
É o que me cabe

E o lado segundo, reles e imundo
É o que não vale

Inconsequente, só vejo aquilo
Que me interessa

E em meio à dúvida tiro proveito
Do que me resta.  


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