A LEI, ORA, A LEI
Tenho muitos amigos
advogados, outros tantos amigos juízes, e também promotores e professores de
direito, e com certeza serei alertado para alguma incorreção que estarei incorrendo.
Aceitarei de bom grado qualquer esclarecimento que me seja prestado a fim de
clarear as minhas ideias e corrigir o meu rumo, posto que não sou um
especialista no assunto.
Mas, por não ser
especialista no assunto, falo a língua do cidadão que assim como eu se pergunta
o motivo para tanto desrespeito às leis.
Falta de educação, dirão
alguns. Falta de noções de ética, dirão outros. Faz parte da nossa cultura,
retrucarão terceiros. Falta orientação familiar e escolar, concluirão os mais
precavidos.
Qualquer que seja porém o
motivo, a gente fica com a sensação de que faltam na verdade autoridade e
responsabilidade em se fazer cumprir a lei num país onde as leis não são
levadas a sério por aqueles que cuidam das leis e muito menos por quem as
descumpre.
Existem 181 mil leis na
Constituição brasileira que foram redigidas para serem cumpridas, mas muitas
delas, quer por absoluta inobservância ou impunidade, quer por total falta de coerência,
quer pelas centenas de brechas que oferecem para o jurista arguto ou quer pela
natureza da infração e do infrator, passam batidas e oferecem pouco risco a
quem atenta contra elas.
A Constituição atual data de
1988 e foi escrita debaixo de uma necessidade premente de fazer retornar aos cidadãos
os direitos que haviam desaparecido por causa de um estado de exceção que durou
vinte anos. É, portanto, na velocidade imprimida na História do Brasil nos
últimos vinte e oito anos, uma Carta Magna desatualizada.
Por causa disso, ela acabou
sendo justa e correta para a época em que foi feita, mas foi se tornando
leniente e defasada com o passar do tempo.
Este é o problema de uma
Constituição com excesso de leis, artigos e parágrafos: quis ser muito precisa
e detalhada e acabou sujeita a diferentes interpretações. Uma Constituição
enxuta, com leis em que prevalecessem o bom senso e uma forte noção de direito
talvez oferecesse ao cidadão mais segurança e menos incertezas.
Mas, a que vem tudo isso, pergunta
o leitor acostumado a ler críticas sobre a convocação da seleção, o gol
indevidamente anulado, os problemas do futebol brasileiro e uma ou outra
incursão no passado de algum ídolo do esporte?
É que, mais uma vez tivemos
que assistir a cenas deploráveis de torcedores e policiais se espancando numa
tarde festiva em plena reabertura do Maracanã, num clássico entre os clubes de
maior torcida do Brasil.
Diz a música de Francis Hime
“Maracanã da festa popular, domingo é lá que a poesia vai rolar”, mas o que
rolou foi muita pancada.
Depois da borracha cantar e
da calmaria voltar, 42 torcedores corintianos foram presos (desta vez os
rubro-negros não brigaram com ninguém) e levados para a delegacia para
averiguação e confrontação das fichas policiais. Deles, 11 foram liberados e 31
conduzidos preventivamente ao presídio de Bangu.
Poderia jurar que alguns
deles são os mesmos da morte do menino em Oruro, são os mesmos do quebra-quebra
no Metrô de São Paulo, são os mesmos de outras tantas confusões permeadas por extrema
violência. Ou então, se os baderneiros forem outros, é sinal que o mau exemplo
está se propagando assustadoramente por falta de providências mais enérgicas.
Os briguentos foram fichados
e serão fatalmente liberados, e o STJD (para ficarmos apenas no âmbito
esportivo) simplesmente emitiu uma declaração lacônica proibindo a presença
deles nos jogos do Corinthians até o final do Campeonato Brasileiro e – mais
uma vez – banindo a torcida organizada Gaviões da Fiel dos estádios de futebol.
Só não diz como esta
sentença será operacionalizada.
A Inglaterra padecia do
mesmo mal, mas hoje não se notam resquícios de violência nos estádios porque as
penalidades, principalmente para um torcedor apaixonado, são rigorosas. Lá,
torcedores são banidos dos estádios por infrações bem menos graves do que esta
do último domingo no Maracanã.
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Vejam só, eu deveria estar
prestando uma homenagem a Carlos Alberto Torres, um dos maiores jogadores do
futebol brasileiro, ídolo do Fluminense, do Santos, do Botafogo, do Flamengo e
da Seleção Brasileira, morto nesta última terça-feira, e estou gastando meu
português com três dúzias de delinquentes que não valem uma clicada.
(Artigo publicado no caderno de esportes do
jornal O Imparcial de 28/10/2016)