domingo, 29 de setembro de 2013




A Revolta dos Malês

A Revolta dos Malês foi um movimento que ocorreu na cidade de Salvador em 1835, protagonizado por negros islamitas que, apesar de não serem escravos e de exercerem suas profissões livremente – alfaiates, artesãos, carpinteiros – sentiam-se discriminados por serem negros e professarem tal religião.
Com a revolta, eles reivindicavam a aceitação da sociedade branca e cristã e a possibilidade de ascender socialmente.
Eles não conseguiram nem uma coisa nem outra, pois a insurreição não deu certo. Os malês foram presos, os seus líderes mortos, e a vida seguiu em frente.
Os malês do século 21 também são livres e exercem a sua profissão – jogar futebol – e ao contrário dos revoltosos da época do império, têm a aceitação da sociedade, ascendem socialmente e os signatários são mais bem providos financeiramente do que seus pares do passado.
Entre eles se encontram jogadores jovens, outros em fim de carreira, alguns selecionados e outros selecionáveis, todos dispostos a lutar por direitos que dizem respeito à sua profissão, à sua carreira e à sua saúde.
O grupo, formado por 75 atletas, assinou um manifesto solicitando um encontro com as federações e os clubes para discutir o calendário futebolístico do Brasil, principalmente no que diz respeito aos chamados clubes grandes, que são aqueles que têm uma maior quantidade de jogos para jogar e de torneios para participar.
Na pauta, o horário dos jogos noturnos imposto pela Rede Globo, inconveniente tanto para os jogadores como para o público que frequenta estádios.
Fazem parte do levante alguns jogadores de grife, como Alexandre Pato, Rogério Ceni, Alex, Zé Roberto e Juninho Pernambucano, que contam com o apoio de alguns técnicos, como Dunga e Muricy. Felipão não se manifestou.
O documento prevê até uma greve geral durante o mês de dezembro próximo se os insurretos não forem atendidos, o que poderia paralisar o Campeonato Brasileiro na reta final e colocar em risco a participação do Atlético Mineiro no Mundial de Clubes da Fifa, em Marrocos.
Mas, como é possível que jogadores de futebol regiamente pagos, incensados pela mídia e supervalorizados no mercado possam se sentir escravos a ponto de se revoltarem contra os donos do sistema?
O problema com o calendário é que os jogadores se veem forçados a atuar até cerca de oitenta partidas por ano, passando boa parte do tempo em aeroportos e aviões, sem tempo para treinamentos táticos ou técnicos, para a desintoxicação ou o repouso muscular.
Com isso, cai o rendimento em campo, aumentam os riscos de contusão e carreiras são encerradas precocemente.
A CBF ainda não se manifestou, mas é bem provável que o presidente Marin aceda ao desejo dos jogadores e se coloque à disposição para discutir o assunto (eu disse “discutir”, não “resolver”), tentando aparar as arestas.
Alguns dirigentes de clubes, porém, já deram a sua opinião a respeito. Para eles, “os jogadores estão chorando de barriga cheia”.
O problema é que o futebol se transformou em uma máquina de fazer dinheiro, com um universo de patrocinadores, emissoras de televisão que trazem a reboque mais patrocinadores, torneios que distribuem altas somas em dinheiro e a necessidade de uma frequente exposição da mercadoria – os jogadores – para com isso produzirem mais dinheiro em transações mirabolantes e nem sempre muito bem explicadas.
E com isso, os malês modernos acabam se tornando escravos por via indireta.