OS FANTASMAS DO ITAQUERÃO
Em
plena semana de Halloween e de Finados, o Corinthians foi abalado por mais uma aterradora
notícia: uma infiltração encontrada no Itaquerão está provocando o vazamento de
10 milhões de litros de água e poderá ocasionar um deslizamento de terra
avassalador, atentando contra a segurança de muita gente, entre torcedores e
ocasionais passantes.
De
acordo com o laudo, o deslizamento poderá atingir uma área de estacionamento
que comporta 350 carros e fica literalmente tomada nos dias de jogo. Pior: a
vazante pode passar do estacionamento para a Radial Leste, via expressa que
margeia o estádio onde circulam milhares de carros diariamente.
Se
a tragédia ocorrer durante a realização de uma partida do clube ela será muito grande,
com perdas materiais e humanas na área do estádio e da via expressa.
Fatos
como este dão um atestado se ineficiência de toda uma equipe de técnicos e
engenheiros, e deixam mais ou menos patente que não houve um planejamento
adequado e que provavelmente a técnica e os materiais utilizados fogem às
normas e aos manuais.
As
bruxas estão soltas, e não é de hoje.
Antes
de ser iniciada a terraplenagem, descobriu-se que o local escolhido para a
construção era uma região de oleodutos subterrâneos pertencentes a uma
subsidiária da Petrobrás, o que encareceu terrivelmente os serviços, pois além
da retirada dos dutos houve necessidade de um tratamento especial no solo para
prevenir futuras explosões que poderiam ser causadas por gases retidos no
subsolo.
No
entanto, dinheiro parece não ter sido problema. A Construtora Odebrecht,
responsável pela obra, assumiu todos os custos junto à Caixa Econômica Federal,
uma atitude nunca vista num contrato comercial, ficando a empreiteira se
encarregada das despesas para resolver a compensação financeira somente ao
final da obra.
Isto
deixou na época muita gente com a pulga atrás da orelha, mas hoje em dia tudo
parece muito natural e bem explicado, levando-se em conta todos os escândalos
em que se envolveram a Odebrecht, os diretores da Petrobrás e os
administradores do país, hoje escancarados ao público.
Mas
isso não para por aí.
Sabe-se
que a obra custou um bilhão e duzentos milhões de reais (um bilhão e seiscentos se forem
incluídas as despesas financeiras) quando poderia ter custado quase 40% menos,
o que se explica pelo superfaturamento dessa construtora que pavimentou o
relacionamento com o poder num “toma lá-dá cá” sem precedentes na história da
República.
Com
a diretoria na cadeia, a Odebrecht está abrindo o bico e os tentáculos das suas
declarações começam a atingir políticos e dirigentes esportivos que estariam
mancomunados com a fraude.
Apesar
do preço exagerado, o estádio não apresenta qualidade. Apresenta sim diversas falhas
estruturais que incluem o risco do
deslizamento, a queda de meia tonelada de material do teto, partes com
constante alagamento, vazamento de água na área das lanchonetes, danos na
pintura e a abertura de buracos de grandes proporções no local de entrada dos
torcedores.
Durante
a construção, um enorme guindaste caiu matando dois operários e danificando
toda uma lateral e parte da cobertura que tiveram que ser refeitas.
Problemas
técnicos à parte, o clube se vê às voltas com o um débito de 310 milhões tendo
a Caixa Econômica como avalista. O clube precisa quitar a dívida até 2028 em
astronômicas parcelas de 5,3 milhões de reais por mês, o que a torna impagável
sem a participação de um parceiro externo para injetar dinheiro e usar o seu
nome no estádio, com vantagens a ser estudadas (o chamado “naming rights”).
O
estranho nisso tudo é que a Odebrecht faturou com a fraude, o governo da época
faturou com o prestígio de dar ao clube um estádio que seria usado na Copa do
Mundo (ganhando com isso os votos e a simpatia da torcida corintiana), e os
partidos políticos regados com parte do dinheiro fraudado revigoraram as suas
campanhas e elegeram seus candidatos pelos quatro cantos do país.
Assim,
todo mundo ganhou, menos o clube, que serviu de escada para ações
inescrupulosas sob o aplauso dos seus dirigentes.
Foi
uma vitória de Pirro, porque os Odebrecht estão na cadeia, os governantes da
época estão indiciados em vários processos, os partidos que se prevaleceram
estão naufragando e o próprio estádio está ruindo e na eminência de ser tomado
pela Caixa Econômica por conta das prestações não pagas.
(Artigo
publicado no caderno de Esportes do jornal O Imparcial de 04/11/2016)