sexta-feira, 11 de dezembro de 2015


 
 
 
 
 
A NAU À DERIVA 

Os vascaínos que me perdoem, mas não é possível encerrar o ano sem comentar o destaque negativo do Gigante da Colina, que cai para a Série B pela terceira vez nos últimos sete anos.
É mais do que uma sina, é uma provação!
Independentemente de necessitar de uma quase improvável combinação de resultados na última rodada, o Vasco sequer fez a sua parte, pois não passou de um empate sem gols com o Coritiba.
Também em 2008 e 2013 o time não venceu na rodada final – perdeu por 2x0 para o Vitória e por 5x1 para o Atlético Paranaense, marcando assim os seus rebaixamentos de forma melancólica.
A torcida e os analistas procuram as causas deste desempenho desastroso, e a primeira coisa que vem à mente é a briga política das diferentes alas, pois forças antagônicas vão cavando um fosso cada vez mais profundo que vai solapando os alicerces do clube.
O fato é que o time disputou um primeiro turno tão ridículo que a sua queda já era preconizada no início do returno. Então, mesmo contando com uma série de bons resultados nas últimas partidas, com a direção segura do técnico Jorginho e com o sangue novo do jogador Nenê, já era muito tarde para consagrar o milagre, pois as equipes do bloco de trás também ganhavam seus pontos no suor e na raça.
O cabo de guerra tem de um lado o ex-presidente Roberto Dinamite, que comandou o clube de 2008 a 2014, e o atual presidente Eurico Miranda, que comandava o clube “sub-judice” quando Dinamite assumiu, e retornou ao vencer as eleições no ano passado. Ambos têm a sua parcela de culpa.
Cabe então à diretoria e aos conselheiros corrigir a conduta dos adversários políticos, pregando uma trégua que permita aos jogadores atuar com mais tranquilidade e voltar no ano que vem para fazer um papel decente na Série A.
Afinal, o Vasco é um clube com muita história.
O Vasco da Gama foi fundado em 1898 por um grupo de remadores (daí o nome Clube de Regatas), e recebeu o nome do navegador português porque naquele ano eram celebrados 400 anos da descoberta do caminho marítimo para as Índias.
Nos seus 117 anos de existência, o clube não conquistou nenhum título intercontinental de relevância (apenas dois torneios internacionais em 1953 e 1957), mas ganhou o Campeonato Sul-Americano de Clubes Campeões (um espécie de precursor da Copa Libertadores) em 1948, a própria Libertadores em 1998 e a Copa Mercosul em 2000.
Adicionem-se a esses títulos quatro Campeonatos Brasileiros (1974, 1989, 1997 e 2000), três Torneios Rio-São Paulo (1958, 1966 e 1999), uma Copa dos Campeões Estaduais Rio-São Paulo (1937), uma Copa do Brasil (2011) e um Torneio João Havelange (1993). Como prêmio de consolação, o clube foi campeão da Série B em 2009.
No âmbito estadual, foram 23 títulos cariocas, conquistados entre 1923 e 2015, contra 33 do Flamengo, 31 do Fluminense, 20 do Botafogo, 7 do América, 2 do Bangu, 2 do São Cristóvão e um do Paysandu em 118 campeonatos disputados.
O melhor grupo de jogadores jamais formado pelo Vasco da Gama aconteceu na década de 1940 e início dos anos 1950, quando se constituiu na base da seleção brasileira vice-campeã mundial de 1950.
O time era chamado de “O Expresso da Vitória” e teve entre os seus craques, além dos convocados Barbosa, Augusto, Ely do Amparo, Danilo Alvim, Alfredo, Friaça, Maneca, Admir de Menezes, Jair Rosa Pinto e Chico, também Heleno de Freitas, Tesourinha, Lelé, Jorge, Ipojucan, Sabará e Djalma.
Ao longo da sua trajetória o clube conheceu outros craques, como Fausto dos Santos, Pinga, Orlando Peçanha, Almir Pernambuquinho, Mauro Galvão, Roberto Dinamite, Juninho Pernambucano, Edmundo e Romário, entre outros.
É hora de o comandante tirar a nau do mar proceloso em que se meteu e recolocá-la em águas mais tranquilas.
Sua torcida merece.
-0-

Gol de Placa se despede em 2015 desejando a todos um Feliz Natal e um 2016 melhor. Estaremos de volta no dia 15 de janeiro próximo.  

 

    


(artigo publicado no caderno Super Esportes do jornal O Imparcial de 11/12/2015)

 

quinta-feira, 10 de dezembro de 2015







EU E A MÚSICA - ESSE TAL DE ROCK AND ROLL

Parte I - Um abraço no Gilberto Mineiro

Durante um curto período São Luís movimentou uma casa de espetáculos chamada Equator, que era na verdade um imenso picadeiro com arquibancadas de cimento, mais parecendo um ginásio esportivo. A casa era rústica, tinha problemas de acústica, não oferecia conforto nem um bom serviço de bar e não teve, portanto, vida longa.
Em pouco tempo o prédio foi demolido e o espaço acabou se transformando num grande estacionamento aberto, no que se revelou muito mais adequado, pois assim permanece até hoje.
Quando surgiu o Equator veio com ele a esperança da abertura de um espaço que pudesse congregar as tribos de garotos roqueiros que sobreviviam esparsos pela cidade, pois naquele tempo era difícil encontrar um palco para mandar um rock ou um blues de responsabilidade.  
Os proprietários de bares e casas noturnas tinham um grande preconceito contra o rock, que eles consideravam uma “música de alto volume que não atraía o público consumidor, interpretada por músicos que assustavam as pessoas com aquele som ameaçador”.
Para a tristeza do rock, o Equator deixou de ser uma esperança para os roqueiros e acabou se transformando, no seu curto período de existência, em uma casa de reggae, o ritmo jamaicano que na época havia tomado conta da cidade com suas radiolas e seus dreadlocks, fazendo com que muitos apreciadores criassem o hábito oticamente pouco saudável de se colocarem ao lado das potentes caixas de som e com que muitos casais voltassem a dançar agarradinhos, longe da febre das disco houses.
O rock caminhava com dificuldade, embora conseguisse ser exibido em alguns lugares com o pequeno sucesso que a sua pouca aceitação na cidade permitia, como as ruas do Projeto Reviver, o Bagdá Café, o Créole Bar, o Restaurante Peixe na Telha – e que boa memória ainda tenho da sua proprietária, nossa saudosa amiga Neirimar! – apostando no talento de meninos como Adriano Correa, Aldreder, Alexander Carvalho, Elvis, Glad Azevedo, Paulo Pellegrini e outros. 
Estávamos no início dos anos 1990.
Era sábado, e neste dia, graças às artimanhas do diligente produtor, estava sendo realizado no Equator não uma festa de reggae, como seria de se supor, mas um festival de rock como a gente sonhava, com diversas bandas locais se apresentando, algumas mais ativas e experientes e outras ainda com o rótulo de garage bands, contando com a presença de um público jovem bastante participativo.
As garage bands eram formadas por jovens adolescentes que se reuniam nas suas casas depois das aulas e não tinham um grande conhecimento musical teórico nem qualquer ambição profissional, embora alguns deles tivessem seguido carreira, mesmo se paralela a alguma outra atividade acadêmica.
Menos participativos do que o público jovem, alguns homens e mulheres maduros que assistiam ao festival davam a impressão de que lá estavam apenas por conta dos seus pimpolhos que soltavam provavelmente seus primeiros gorjeios em público, mostrando aos presentes aquela guitarra e aquele baixo recém-adquiridos, sem as marcas ou os riscos causados pelo uso. 
Aparentemente os meninos se divertiam mais enquanto acertavam o som das guitarras e falavam “um-dois-sssommmm” ao microfone do que quando se punham realmente a tocar.
As apresentações haviam começado às quatro da tarde misturando alguns trabalhos autorais esforçados com alguns covers bem ensaiados, e a expectativa era a de que mais gente chegasse durante o transcorrer dos shows, sendo previsto o seu gran finale apenas lá para as dez da noite.
O Equator Rock Festival foi mais um evento produzido por Gilberto Mineiro, radialista e produtor musical com uma vida dedicada ao rock, que tinha a seu encargo um programa semanal de radio que mantém até hoje, embora com outro nome e em outra emissora. Mais tarde ele passaria também a trabalhar com música alternativa, drum & bass, som do mangue, acid jazz, world music, nova MPB e outras coisas do gênero.
Gilberto Mineiro é o que se pode chamar de uma cabeça pensante, inteligente e provocador seja na música ou fora dela, embora geralmente procure canalizar as suas discussões para o campo da qualidade musical, sendo implacável com aquilo que ele considera de baixo nível. Com ele, sempre temos a garantia se uma boa conversa.
Como apreciador do velho e bom rock and roll eu também lá estava, totalmente envolvido por aquele recital de guitarra, baixo e bateria no meio de jovens cabeludos, a maioria trajando preto, alguns portando correntes e outros adereços punk, outros dançando as suas gingas e cabeçadas, mas tudo dentro de muita alegria e – pasmem! – muita paz e ordem, ao contrário do que certamente temiam os pais e acompanhantes, e os donos de bar mal avisados.
Aquilo foi o início de uma nova era.
Hoje em dia, o rock saiu da toca e se apresenta em diversos bares, pubs, restaurantes e casas noturnas, praias e praças, puro ou na forma de blues, e ao contrário de que temiam os proprietários dos locais, a distorção das guitarras e o frenesi da bateria seguem atraindo público de todos os matizes.
Graças à teimosia de bandas pioneiras como Daphne, Alcmena e Paul Time, e mais tarde Página 57, The Mads, Pandha S.A. e tantas outras, e graças ao trabalho de produção e divulgação de Gilberto, o rock passou a ser participante da cena musical da cidade.
Enquanto eu acompanhava o entusiasmado balanço de uma das bandas do Equator Rock Festival, um jovem de não mais do que quatorze anos me observava, curioso.
Trajando roupas sem qualquer espalhafato e sem nenhuma parafernália que denunciasse sua apreciação pelo que estava acontecendo no local, ele tomou coragem e fez a pergunta que o estava intrigando, dada a minha idade avançada para aquelas estripulias: “Mas, tio, você gosta mesmo disso?!...”
Eu respondi com toda a sinceridade histórica que o momento merecia: “Meu filho, quando ‘isso’ começou a acontecer, eu tinha mais ou menos a sua idade. E nunca mais parei de ouvir e de gostar...”

 

domingo, 6 de dezembro de 2015


 
 
 
 
 
 
O BARULHO DOS MOTORES 

Terminou mais uma temporada do Campeonato Mundial de Fórmula Um, deixando o aficionado brasileiro tão desanimado quanto um torcedor de futebol do Mamoré-MG – para ficarmos longe das polêmicas.
Faz tempo que os nossos pilotos não “correspondem” e por consequência o número de aparelhos de televisão desligados caiu tanto a ponto de a TV Globo cogitar se vale a pena continuar transmitindo pelo canal aberto.
Está difícil convencer o torcedor a vibrar com Felipe Massa ou a ficar empurrando o frágil carro de Felipe Nasr com a força do pensamento. Massa está cada dia mais chato e antiético, transferindo para os outros os problemas criados pelas suas próprias deficiências. Nasr ainda pode crescer.
Somente aqueles que gostam realmente do esporte – como eu – se aventuram a assistir às corridas madrugadoras da China, do Japão ou da Austrália e se emocionam com pegas de pilotos ingleses e alemães, na falta de brasileiros competitivos.
Mas de 1988 a 1994 todo brasileiro tinha por hábito não despregar os olhos da televisão aos domingos para acompanhar as corridas, muitas vezes sacrificando a praia, o almoço na casa dos parentes e o próprio futebol, naquele tempo em que o futebol andava relativamente em baixa, como hoje.
Eram tempos de Ayrton Senna.
A Fórmula Um é muito antiga, vem de 1950 e já produziu muitos ícones, como Juan Manuel Fangio, Jack Brabham, Graham Hill, Jim Clark e Jack Stewart, num período romântico que se estendeu durante cerca de vinte anos, quando a tecnologia começou a auxiliar os pilotos a conduzir os seus veículos.
No Brasil, a marca Fórmula Um começou a se evidenciar nos anos 1970, e teve como prêmio a conquista de um bicampeonato (1972 e 1974) pelo piloto Émerson Fittipaldi, naquela época em que as transmissões deste tipo de evento ainda engatinhavam, com poucas câmeras, informação limitada e poucos televisores a cor.
A TV Globo contava com uma equipe de esportes da qual participavam Julio Delamare, Luciano do Valle, Ciro José e o jovem Reginaldo Leme, e a sua primeira transmissão se deu em 1972. O primeiro título de Émerson Fittipaldi, porém, foi narrado pelo seu pai, o ex-piloto e radialista Wilson Fittipaldi, chamado de “O Barão”.
Nelson Piquet inaugurou uma nova década com o título da temporada de 1981, completado por um tricampeonato em 1983 e 1987, e foi então que o torcedor brasileiro começou realmente a tomar gosto pela coisa.
Galvão Bueno foi contratado pela Globo em 1981 para ser o “segundo” de Luciano do Valle, e assumiu a titularidade em 1982 com a ida de Luciano para a Record.
A Fórmula Um é a competição de automobilismo mais antiga que existe e consequentemente a que continua tendo mais charme, o que provoca uma larga audiência em todo o mundo.
Pode-se dizer que apesar da atual entressafra, o Brasil se encontra bem representado na história da categoria. Começou com Émerson que conquistou dois títulos numa época em que dirigir um daqueles bólidos era estar sentado em um tanque de gasolina a uma velocidade de mais de 100 km/h. Seguiu em frente com três conquistas de Piquet numa época onde os engenheiros contavam menos do que hoje, o piloto dirigia no braço e sujava a mão de graxa para preparar o motor junto com os mecânicos.
Aí apareceu Ayrton Senna, para se transformar no maior ídolo das manhãs de domingo, com três títulos (em 1988, 1990 e 1991) conquistados com muito arrojo e determinação, a ponto de ainda ser, até hoje, considerado o melhor piloto de Fórmula Um de todos os tempos, inclusive por alguns pilotos vencedores, como Michael Schumacher (o único heptacampeão), Sebastian Vettel (tetracampeão) e Lewis Hamilton (tricampeão e atual detentor).
Todo ano são feitas modificações no regulamento das corridas – como pontuação, pneus, pit-stop – e na tecnologia dos carros visando aumentar a competitividade e equilibrar as forças entre os diversos pilotos participantes, mas não se pode dizer que os membros da FIA estão conseguindo grandes progressos, e com isso aumentar o interesse pelas corridas.
Mesmo assim, os patrocinadores e parceiros continuam investindo muito dinheiro na categoria, que lota autódromos em todo mundo com um público cada vez mais participativo.
O brasileiro é mais modesto. Apenas sonha com um piloto que possa lhe devolver as alegrias que Senna – e por que não Émerson e Piquet? – lhe proporcionou nos últimos anos do século passado.   

                                                                                              

 (Artigo publicado no caderno SuperEsportes do jornal O Imparcial de 04/12/2015)