A VILA DA DISCÓRDIA
Foram
detectados sérios problemas de infraestrutura na Vila que serve de alojamento
aos atletas. Os problemas estão sendo solucionados, com a finalidade de permitir
o deslocamento e a mobilidade das pessoas. A organização dos Jogos é objeto de
crítica e muitos atletas de diversos países manifestam um alto grau de
insatisfação, no que são referendados pela imprensa estrangeira.
O
leitor deve achar que estamos nos referindo aos prédios onde australianos,
argentinos, suecos, italianos e bielorrussos se recusaram e entrar por conta de
problemas elétricos e hidráulicos – fios desencapados, vazamentos – além da
sujeira generalizada nos apartamentos e corredores a poucos dias da abertura
dos XXXI Jogos Olímpicos de Verão do Rio de Janeiro (alguns deles contrataram
empresas especializadas por conta própria para poderem ter condições de
habitação).
Mas
não é bem assim, pois o primeiro parágrafo se refere aos Jogos Pan-Americanos
de 2007, retratando o afundamento do calçamento das ruas e vias de acesso que
circundavam a Vila dos Atletas, com muitas poças e poeira dificultando a
circulação das pessoas.
Na
época não houve uma reclamação acintosa por parte das delegações nem a sugestão
do prefeito – então César Maia – de colocar um canguru, camelo ou elefante para
adoçar a sensibilidade dos convidados.
Em
nove anos, com exceção do prefeito, nada mudou, e se mudou o fez para pior:
além das condições dos imóveis, fazendo levantar suspeita sobre a qualidade
estrutural da obra, o atual prefeito expôs o nome do Brasil ao mundo e o seu
próprio nome ao ridículo quando se comprometeu a colocar um canguru na frente dos
prédios ocupados pelos australianos para amenizar a falta de competência na
entrega das obras.
A
chefe da delegação australiana respondeu que não precisava de cangurus, mas sim
de encanadores e eletricistas (e de um prefeito mais bem-educado, esqueceu de
completar).
Como
iria se sentir o nobre prefeito que já foi subprefeito, vereador, deputado federal e secretário do governo,
portanto afeito às obrigações litúrgicas e diplomáticas de um político, se o
governo da Austrália se comprometesse a colocar chimpanzés na frente de um
eventual alojamento brasileiro em Auckland para tornar a delegação feliz?
Os
citados Jogos Pan-Americanos ensejaram reclamações por parte dos atletas de
beisebol e mountain bike / BMX que consideraram as instalações da Cidade do Rock
e do Morro do Outeiro impróprias para a realização das provas.
De
antemão podemos garantir que haverá uma chiadeira geral com respeito às provas
náuticas realizadas no mar ou na Lagoa Rodrigo de Freitas, cuja poluição salta
aos olhos, não necessitando sequer de uma análise laboratorial.
Em
2009, dois anos depois do Pan, quando o Brasil (no caso, o Rio de Janeiro) foi
escolhido para sediar a Olimpíada, seus responsáveis – Governo Federal,
representado pelo Ministério dos Esportes, Governo Estadual, Prefeitura,
Secretarias e membros do Comitê Olímpico – já tinham estado às voltas com os problemas,
previstos ou imprevistos, de 2007.
Nada
mais lógico na época que fossem pensadas soluções antecipando os problemas de
2016, considerando que as dificuldades na organização de uma Olimpíada, que
congrega cerca de 200 nações e mais de 10.000 atletas é sem dívida mais
complicada do que a dos Jogos Pan-Americanos, que reuniram 662 atletas de 42
países quando da sua realização.
Os
cuidados devem ser os mesmos, mas a complexidade aumenta em todos os sentidos –
alimentação, estrutura, diferença de costumes, equipe de apoio, rigor no
controle dos atletas e dos demais membros das delegações – principalmente com
respeito à segurança, numa época onde a ameaça do terror assombra a todos, em
especial aos cidadãos dos países mais diretamente envolvidos neste conflito
invisível, como França, Alemanha, Inglaterra, Bélgica e Estados Unidos.
O
estado de alerta que domina os governantes brasileiros e a população do Rio de
Janeiro acaba tirando um pouco o brilho das competições, mas nesta hora todos
os dedos se cruzam e todas as orações são feitas para que tudo transcorra em
ordem e lisura.
Isso
contando com a colaboração do poder criminoso paralelo do Rio, que
aparentemente vai minimizar os ataques às UPPs para que a Vila da Discórdia não
se transforme em Vila da Vergonha.
Ou
da Tragédia.
(Artigo
publicado no caderno de Esportes do jornal O Imparcial de 29/07/2016)