sexta-feira, 19 de junho de 2015


 
 
 
NEYMARDEPENDÊNCIA 

Em 1966 o Brasil levou para a Copa da Inglaterra uma seleção meia-boca, acreditando que o tricampeonato (havíamos vencido em 1958 e 1962) viria num estalar de dedos.
Uma preparação pífia, feita em cinco lugares diferentes por força de acordos com prefeitos de estâncias, a chamada de quarenta e sete jogadores para agradar a todos e uma convocação final equivocada foi o início de uma caminhada que estava fadada ao fracasso.
Os jogadores foram para a Europa sem nenhuma noção de conjunto. Alguns foram convocados fora da sua real posição e outros – caso de Garrincha e Pelé – viajaram fora das suas melhores condições físicas (Pelé não jogou contra a Hungria e Garrincha não jogou contra Portugal, e perdemos as duas partidas, ambas por 3 x 1).
Mesmo machucado, e com Garrincha definitivamente fora de combate, Pelé era a esperança brasileira, pois a equipe contava com alguns jogadores medianos e com os veteranos Gilmar, Djalma Santos, Bellini e Orlando sem a mesma pegada de quatro ou oito anos atrás. Havia ainda os promissores Tostão, Jairzinho e Gérson, mas estes iriam brilhar apenas quatro anos depois, na Copa do México.
Na véspera da partida contra Portugal, o jornal A Gazeta Esportiva publicou uma manchete que mostrava bem a angústia do torcedor brasileiro: “Pelé, jogai por nós!”, isto é, com a ausência de Garrincha, mesmo no ocaso da sua carreira, o time era Pelédependente.
A história todos sabem – perdemos e ficamos fora da Copa – mas ficou a lição que não se pode depender apenas dos lampejos de um único jogador para que um time seja vitorioso, pois afinal, o futebol é um esporte coletivo.
Nas Copas que se seguiram, conquistando o título ou não, o Brasil não era dependente de nenhum jogador, pois o elenco sempre teve mais do que um jogador para desequilibrar e atormentar a vida dos adversários.
Houve um hiato de craques entre 1990 e 1998, mas mesmo assim ganhamos o caneco em 1994 com um futebol pragmático e sem brilho, graças a Deus e a Romário.
Em 1970 tínhamos Carlos Alberto, Gérson, Tostão, Pelé e Rivelino; em 1974 tínhamos Rivelino, Paulo Cesar Caju e Jairzinho; em 1978 tínhamos Cerezo, Zico e Reinaldo; em 1982 tínhamos Junior, Falcão, Zico, Cerezo e Sócrates; em 1986 tínhamos Sócrates, Zico, Muller e Careca; em 1990 tínhamos Romário, Muller e Careca.
Depois da década de 1990, voltamos a ter protagonistas nas Copas de 2002, com Rivaldo, Roberto Carlos, Kaká e Ronaldo e em 2006, com Kaká, Ronaldinho Gaúcho e Ronaldo. Em 2010 começou a fase em que se acentuou significativamente a falta de um ou mais protagonistas ou – podemos definir assim – a ausência de craques e de um técnico que construísse uma equipe a partir do material que tinha em mãos.
Em termos de quantidade de craques, o momento presente não me parece muito promissor, e isto já ocorre desde 2012, seja com Mano Menezes, seja com Felipe Scolari, seja com Dunga. Nas três situações, com especial destaque para a Copa de 2014, o time se mostrou extremamente dependente de Neymar, quer por causa do seu distanciamento técnico dos demais, quer por causa da tática aplicada, que nunca chegou a mudar, fosse o treinador o Mano, o Scolari ou o Dunga: dá um chutão na direção de Neymar e seja o que Deus quiser; se ele dominar a bola a oportunidade de gol vai aparecer! 
No momento o que temos é um punhado de jogadores com alguma habilidade e boas noções de fundamentos, mas o único que desequilibra é Neymar.
Os outros dependem de um técnico que os posicione em campo, que treine jogadas ensaiadas e que explore com inteligência o potencial e as características de cada um.
Isto pode acontecer com o tempo, e é bom que aconteça, porque este elenco que aí está, sujeito a duas ou três modificações, é o que temos para disputar as Eliminatórias da Copa 2018 contra as equipes sul-americanas que estão ficando dia a dia mais atrevidas e mais difíceis de serem batidas.
O Peru, derrotado na bacia das almas, e a Colômbia, que acabou com a invencibilidade Dunga, não me deixam mentir.
Em suma, o craque nós temos, mas precisamos de um time, ou então voltamos à mesma oração de 1966 – “Neymar, jogai por nós! – clamor que no momento não faz sentido.
E que não deu certo em 1966.
 

(Artigo publicado no caderno SuperEsportes do jornal O Imparcial de 19/06/2015)