sexta-feira, 7 de agosto de 2020





AS CORES DO SWING
(Livro de Augusto Pellegrini)

CAPÍTULO 7 - AS CORES DO SWING
(continuação)

Por estranho que possa parecer, apesar do swing soar mais fácil e confortável para os ouvidos do público, ele ficou mais sofisticado com respeito ao ritmo e à concepção dos arranjos. Os estilos provenientes de Nova Orleans possuíam basicamente uma batida 2 por 2, ao passo que no swing o ritmo obedece ao esquema 2 por 4, com variações para 4 por 4, quando acentua as quatro batidas do compasso.
Evidentemente existiam honrosas exceções no jazz tradicional, como Louis Armstrong, que já se aventurava no 4 por 4 nas suas apresentações. Mas Armstrong era ele próprio uma exceção, com seus efeitos inventivos como, por exemplo, fazer um improviso inteiro baseado em uma nota só, parafrasear uma música usando uma linha harmônica diferente da original e modificar em trezentos e sessenta graus a forma de interpretar uma música quando se punha a cantar.
O swing propiciou a formação das big bands, orquestras que prescindiam de certos instrumentos sinfônicos e das cordas, muito embora as cordas continuassem a ser utilizadas por alguns bandleaders em casos de orquestrações específicas. No swing, as modulações – raramente experimentadas no jazz tradicional – ganharam espaço e traduziam arranjos mais bem elaborados para os ouvidos mais exigentes.
No jazz tradicional, a formação instrumental utilizada pelo grupo, chamada de lineup, evitava a duplicidade ou a pluralidade de instrumentos. A base melódica era formada por um trompete – em geral o líder dos instrumentos e principal solista – um trombone e um clarinete. A base harmônica se resumia praticamente ao piano e ao banjo. O ritmo era ditado pela bateria e pela tuba, o que resultava em um som “duro” e bem resolvido. Em geral, todos os instrumentos tinham a possibilidade de fazer pequenos solos nos improvisos – que muitas vezes eram cuidadosamente estudados – mas ao trompete é que geralmente cabia a primazia de executar a linha melódica principal.
Com o passar do tempo, e com as modificações sofridas pelo jazz tradicional em Chicago, o saxofone começou aos poucos a ocupar o lugar do clarinete, e os grupos orquestrais começaram a usar às vezes dois ou mais saxofones para ajudar na concepção harmônica e melódica.
A tuba cedeu o lugar ao contrabaixo, o que deu à pulsação da música um som mais maleável e agradável, e na bateria a batida do bumbo também ficou menos agressiva.
Apesar da repentina chegada em cena do saxofone, a sua presença no jazz tradicional não era muito estranha. Sidney Bechet, que jamais investiria no swing, era um virtuose do instrumento e alternava o uso do sax-soprano com o clarinete desde o início dos anos 1920, passando paulatinamente a dar preferência para o saxofone, abandonando o clarinete aos poucos até adotar o sax de vez exatamente quando o swing começava a tomar conta do panorama musical. O jazz tradicional perdia um pouco da sua força e característica de origem, mas adquiria uma outra qualidade sonora.
Com respeito à base harmônica, a guitarra tomou o lugar que o banjo ocupava ao lado do piano, a princípio com uma certa desvantagem, pois apesar de possuir uma sonoridade mais harmoniosa, ela não tinha o mesmo volume do banjo, o que viria acontecer somente em 1937, quando o guitarrista Charlie Christian desenvolveu um sistema para amplificar o seu som, criando um captador para uma guitarra elétrica ES-150.
Nas orquestrações, porém, o swing passou por uma mudança considerável – e aqui o arranjador Don Redman teve um papel preponderante.
O lineup se estendeu para uma média de quatorze a dezoito músicos, e os instrumentos eram dispostos em naipes – grupos de instrumentos do mesmo tipo. Assim, uma orquestra de swing apresentava alguns naipes distintos, cada qual com um líder. Existem os naipes constituídos pelos trompetes e pelos trombones (brass section), e o naipe formado pelos saxofones – alto, tenor e barítono – e eventualmente pelo clarinete (reeds section). Estes instrumentos eram geralmente responsáveis pelos solos e pela linha melódica, mas também funcionavam como os agentes de harmonia no background, tocando os riffs, cobrindo as pausas e preparando os acordes e as passagens harmônicas.
Já o piano e a guitarra trabalhavam no auxílio da harmonia e ajudavam na pulsação ao lado do contrabaixo. Com a bateria, que ditava o ritmo, estes instrumentos faziam o que se chamava “a cozinha do swing”.
No swing, cada instrumento, incluindo os do mesmo naipe, funcionava como uma voz individual dentro da multiplicidade de sons, criando acordes “vocalizados” que tinham o dedo do arranjador e que, portanto, eram escritos em partituras, o que de certa forma contrariava a essência improvisada do jazz e dava à orquestra um sentido de execução mais metódico. Diferentemente das orquestras do início do século vinte, as novas orquestras destacavam a atuação dos seus melhores músicos, oferecendo a eles a oportunidade de executarem maravilhosos solos ou pequenas passagens, muitas vezes livres na sua criação, tendo como limitação apenas a quantidade de compassos estabelecida pelo maestro ou pelo arranjador.
Com isso, o swing modificou a antiga concepção de que apenas o bandleader, referência musical da orquestra, tivesse o nome consagrado pelo público. O músico solista muitas vezes roubava a cena e passava a ser tão importante que em muitos casos os ouvintes iam assistir a uma apresentação especialmente por causa deles – não do maestro – ao contrário do que acontecia alguns anos antes.
Foi desta forma que alguns mitos passaram a ser conhecidos e reverenciados, como os saxofonistas Coleman Hawkins, Ben Webster e Chu Berry e o trompetista Roy Eldridge (na orquestra de Fletcher Henderson); o baterista Gene Krupa, o pianista Teddy Wilson, o trompetista Harry James e o vibrafonista Lionel Hampton (na orquestra Benny Goodman); os saxofonistas Johnny Hodges e Paul Gonsalves, o trompetista Cootie Williams e o clarinetista Jimmy Hamilton (na orquestra de Duke Ellington); o trompetista Harry James e os trombonistas Glenn Miller e Jack Teagarden (na orquestra de Ben Pollack); o trombonista Trummy Young, o guitarrista Eddie Durham e o clarinetista Omer Simeon (na orquestra de Jimmie Lunceford); o saxofonista Lester Young, o trompetista Harry “Sweets” Edison e o baterista Jo Jones (na orquestra de Count Basie); os saxofonistas Charlie Parker, Ben Webster e Paul Quinichette (na orquestra de Jay McShann) e muitos outros.

quinta-feira, 6 de agosto de 2020





NOVOCABULÁRIO INGLÊS
(Copyright Oxford)

(ver tradução após o texto)

CHILLAX

If you blend the words “chill” and “relax”, you get the verb “to chillax”. This word has become more and more common on the internet over the past couple of years, and it simply means “to relax”, “to become calm” or “to take it easy”. Although people use it almost with the same meaning as “to relax”, “chillax” has more of a sarcastic meaning, as in “calm down, this isn’t so serious, you’re overreacting”.
No matter the meaning it can have for different people, remember that this word is used in slang, so don’t go telling your boss, your teacher or an authority “to chillax”!

            “Hey, man just CHILLAX! It’s just a horror movie, not the end of the world”!

            “I think we all just need to sit down and CHILLAX”.

            “CHILLAX, Doug, we’re all adults here”.

                          

TRADUÇÃO

FICA FRIO
Se você misturar as palavras CHILL (acalmar) e RELAX (relaxar), você constrói o verbo “CHILLAX” (ficar tranquilo). O uso deste verbo na internet está atualmente cada dia mais comum. Ele significa simplesmente “relaxar”, “ficar calmo” ou “ficar frio”. Embora as pessoas costumem usar o verbo CHILLAX com o mesmo sentido de RELAX, ele tem uma conotação sarcástica. Para muita gente, ele pode ser usado indistintamente, mas lembre-se de que CHILLAX é uma gíria e seu uso pode não ser muito elegante - quer dizer, não é conveniente usá-lo ao se dirigir ao seu chefe, ao seu professor ou a alguma autoridade.
“Ei, cara, FICA FRIO! Isto é só um filme de terror, não é o fim do mundo!”
“Eu acho que todos nós devemos sentar e “FICAR FRIO.”
“Fica FRIO, Doug, aqui todo mundo é adulto!”
    






A VERDADE E A  MENTIRA
(Augusto Pellegrini)

A mentira tem olhos azuis e um rosto angelical
Tem gestos que nos seduz e uma beleza sem par

A verdade, nua e crua, tem a cara bem fechada
Não inventa ou insinua nem tenta ser engraçada

Da mentira todos gostam, porque a verdade espanta
E pouca gente se importa se na verdade ela adianta

A verdade às vezes choca, mas a mentira alivia
Vive-se uma vida torta nesta espúria companhia

A mentira serve, às vezes, pra que outros sejam felizes
Ninguém gosta de reveses e nem aceita deslizes

A verdade às vezes dói, mentira tem perna curta
Vale a pena ser sincero ou mentir por causa justa?

Por outro lado, a mentira provoca a infelicidade
Quando mentimos a alguém com preconceito e maldade

Enquanto isso, a verdade, por mais amarga que seja
Busca por felicidade, por ser fruta benfazeja

Com os fatos distorcidos, a coisa vai, volta e vira
E nos deixa convencidos que este mundo é uma mentira

Enquanto a mentira berra, a verdade só sussurra
E o recado que isto encerra se ouve, mas não se escuta

Portanto, mesmo a mentira sendo coisa corriqueira
Devemos ser verdadeiros, não importa de que maneira
Construindo um mundo honesto sem trapaça ou bandalheira
Tendo a decência como alvo e boa-fé como bandeira

2018



quarta-feira, 5 de agosto de 2020





AS CORES DO SWING
(Livro de Augusto Pellegrini)

CAPÍTULO 7 - AS CORES DO SWING

A história da música nos Estados Unidos tem uma estreita relação com as mudanças sociais e com as influências históricas sofridas pelo povo americano no início do século vinte.
Um estudo profundo de sociologia vai levar o leitor à conclusão de que a aceitação pelo público – e pelos músicos – dos estilos musicais que foram surgindo e se modificando ao longo do tempo não aconteceu por acaso. Ela se deveu principalmente às grandes convulsões sócio-econômicas acontecidas no país.
O êxodo de muitos habitantes da Louisiana e de outros estados vizinhos Rio Mississipi acima se deu em virtude de diversas razões que incluíram desde a Primeira Guerra Mundial e a crescente industrialização do norte do país até a procura de melhores condições de vida e de empregos assalariados. Quanto aos músicos de Nova Orleans, a sua migração se deu mais pelo desemprego, face ao fechamento de muitas casas noturnas da cidade, do que propriamente por uma necessidade, digamos artística, de expandir seus horizontes.
Tanto isto é verdade que, apesar do jazz tradicional ter se espalhado por diversas regiões do país, a sua trajetória foi claramente direcionada para o norte – Saint Louis, Kansas City, e principalmente Chicago – pois era lá, mesmo com a Lei Seca e outras restrições, que o show business reluzia.
O músico da Louisiana – fosse ele negro ou creole – era definitivamente caseiro, e se não fosse por estritas razões de sobrevivência ele jamais se preocuparia em deixar a sua casa, a sua terra, os seus amigos e o clima do sul para se aventurar para o norte, sujeito ao frio inclemente de certas épocas do ano e às chuvas e trovoadas da vida, emoldurados pela discriminação devido à sua raça ou origem.
De qualquer forma, o país estava mais alegre, pois em 1918 tinha acabado a Primeira Guerra Mundial, e o som otimista do dixieland parecia ter se expandido exatamente para retratar este estado de espírito.
É importante mencionar este clima de alegria, porque nem os hinos solenes utilizados em Nova Orleans para os funerais, nem o lamento sofrido do root blues pegaram carona com os músicos que foram para Chicago a caminho de uma metrópole mais realista e possivelmente insensível a essas dores da alma. Assim, este estilo “down” de interpretar o blues de Nova Orleans se manteve como referência da música tradicional do sul, mas não viajou rio acima.
As grandes orquestras que floresceram em Chicago nos anos 1920 eram o reflexo do refinamento de uma sociedade que continuava comemorando o final da guerra e o início da importância que os Estados Unidos passaram a ter para o mundo.
As pessoas estavam vivenciando um impacto tecnológico até então não experimentado. A telegrafia e as radiocomunicações encurtavam distâncias, as indústrias do rádio e do cinema estavam florescendo, músicas eram reproduzidas por discos que eram vendidos e tocavam nas rádios, os aviões começavam comercialmente a cruzar os ares, os médicos já conseguiam enxergar por dentro dos pacientes através das chapas de raios X, e os automóveis passaram a ser produzidos em série.
Nas ciências, Freud e Einstein desfilavam suas teorias revolucionárias e os homens aguardavam com expectativa outras inovações tecnológicas para aprimorar o seu grau de conforto.
No campo da música, surgia finalmente em fevereiro de 1917 a primeira gravação de jazz, pela Victor Talking Machine Company – as músicas “Dixieland Jazz Band One-Step” e “Livery Stable Blues” – feita por um grupo de músicos de Nova Orleans (ironicamente brancos, todos eles) a Original Dixieland Jass Band, liderada por Nick LaRocca. A partir daí, por toda a década de 1920 foi aberto o espaço definitivo para gravações da música de jazz e suas assemelhadas, o que fez proliferar um grande número de músicos talentosos.
Na verdade, o primeiro músico de jazz convidado para uma gravação foi o trompetista negro Freddie Keppard, em 1914. Keppard, no entanto, recusou porque temia que com a gravação muitos trompetistas encontrassem facilidades para copiar o seu estilo. Freddie Keppard era um músico de mão cheia, mas sua cabeça, como se vê, era mais ou menos vazia.
Com todas estas coisas se sucedendo, a década de 1920 tornou-se propícia para o surgimento de alguma novidade que consolidasse as tendências populares e ao mesmo tempo criasse um som que representasse a cara e a disposição do povo americano naquele momento.
Daí surgiu o swing.
O swing foi o resultado de uma padronização maciça que tomou conta do país antes de eclodir a Segunda Guerra Mundial.
A ordem do dia era dançar, mas não da maneira tribal nascida das brincadeiras das spasm bands de Nova Orleans na virada do século dezenove para o século vinte, como propunha a agitação do dixieland, nem da maneira sofisticada e elegante como convinha às orquestras de dança que divertiam a elite do alto da costa leste. A ordem do dia era dançar de uma forma descompromissada, contagiante e frenética, o que fez com que jovens e adultos, homens e mulheres, estudantes e profissionais, pobres e ricos, negros e brancos lotassem os salões e exercitassem a sua alegria através da música das big bands.
Em 1933, enquanto a Era do Swing ganhava corpo, as pessoas tinham muito que comemorar, apesar de a Depressão ainda se fazer presente: a nova política do recém-eleito presidente Franklin Delano Roosevelt revogava a Lei Seca e prometia um período de recuperação financeira, convocando o povo americano para uma cruzada de otimismo, como que antevendo a necessidade de uma forte união entre as pessoas para enfrentar a nova convulsão que aconteceria dali a alguns anos, desta vez de âmbito mundial.
É claro que a transformação – alguns diriam “aprimoramento” – do dixieland e do estilo chicago, de um maravilhoso primitivismo musical cheio de asperezas, para o melodioso swing a partir dos arranjos mais arredondados, e o distanciamento cada vez maior das raízes do puro jazz de Nova Orleans recheado de gospel, blues e stomp, também fizeram a sua parte na aceitação e na aclamação popular.

segunda-feira, 3 de agosto de 2020





AS CORES DO SWING
(Livro de Augusto Pellegrini)

FINAL DO CAPÍTULO 6 - A EXPANSÃO MUNDIAL DO SWING

Durante a sua época áurea, o swing representou para a classe média americana a soberania do país, e foi um dos seus motivos de orgulho.
Mesmo quando teve que enfrentar os tempos magros da Depressão e as suas consequências funestas, o país se sentiu motivado e fortalecido pela força do swing.
Afinal, o swing conseguira o que centenas de discursos de políticos e previsões de economistas não haviam logrado: trazer confiança ao povo. E esta confiança aconteceu por conta da alegria da música.
Nem mesmo o ingresso na Segunda Guerra Mundial, fato que normalmente levaria a população à tristeza e ao pessimismo, conseguiu arrefecer o ânimo norte-americano.
Pelo contrário, orquestras se uniram para promover bailes com a finalidade de angariar fundos que seriam transformados em bônus de guerra. Muitos músicos se alistaram não exatamente para pegar um fuzil e sair pelo front atirando na cabeça dos soldados inimigos, mas para manusear o seu instrumento e participar de um esforço concentrado a fim de restaurar o otimismo e o alto astral das tropas.
Entre outras, duas das mais formidáveis e mais bem pagas orquestras do país abdicaram dos cachês altíssimos e do glamour dos salões para se embrenharem nas selvas das ilhas do Pacifico, sujeitas a um oceano de mosquitos e doenças tropicais, ou nos campos de batalha da Europa Ocidental, sujeitas à lama e ao inverno rigoroso: as orquestras de Artie Shaw e Glenn Miller.
Mas o swing também se tornou querido porque fez o povo dançar. E como o povo gostava de dançar o swing!
Apesar de uma parte do público considerar que jazz era uma música para ser ouvida, permitindo no máximo a batida dos pés ou o balanço do corpo, outra parte achava maravilhoso poder combinar as duas coisas – ouvir e dançar.
Esta combinação de jazz com dança foi o que de fato provocou a grande aproximação entre o swing e o povo americano, originando um namoro e um casamento que duraram cerca de trinta anos.
Como o swing tinha na sua alma a parte negra do blues, pela primeira vez na história do país, brancos e negros se uniram ao redor de uma única ideia, ainda que fosse musical. Esta comunhão ressaltou um sentimento de orgulho nacional que ajudou muito a fortalecer o espírito americano durante a Segunda Guerra e perdurou após o evento, se constituindo numa das molas propulsoras do progresso local e da integração americana com o resto do mundo que se iniciara durante o intervalo das duas Guerras, 1918 a 1938.
Dizer que o swing foi o responsável pela importância que os Estados Unidos tiveram resto do mundo no mundo seria um exagero, posto que esta importância acabou se evidenciando também nos campos econômico, político e científico. Devemos admitir, no entanto, que foi a partir do jazz tradicional dos anos 1910-1920 e do swing dos anos 1930-1940 que a música americana se impôs praticamente em todo o mundo, mesmo com a relutância dos blocos comunistas que durante muito tempo vetaram a sua execução nos seus territórios, mormente nos tempos de Guerra Fria.
Mas mesmo em Moscou, Praga, e se duvidar, até em Pequim, ouvidos ávidos pela boa música apreciavam o swing, o jazz e o rhythm & blues trancados em porões e escondedouros clandestinos, desafiando o poder da autoridade.
O swing contribuiu para que as raízes americanas se fincassem no solo europeu e colaborou para que uma grande simpatia popular fosse devotada aos Estados Unidos também em outros campos de atividades.
Depois da Coca-Cola, lançada na Europa no começo do século vinte, o swing foi a mais marcante marca registrada dos Estados Unidos da América no solo europeu.
E, assim como a Coca Cola, o swing chegava para ficar.

domingo, 2 de agosto de 2020





AS CORES DO SWING
(Livro de Augusto Pellegrini)

CAPÍTULO 6 - A EXPANSÃO MUNDIAL DO SWING
(continuação)

Alguns compositores eruditos, na linha da chamada “European Music” (de acordo com a terminologia usada por André Hodeir) tentaram embarcar na aventura do jazz mesmo sem compreender exatamente o que era jazz naquele início de século. Na sua obra “L´Histoire D’Un Soldat”, que mistura ao mesmo tempo narração, dança, pantomima, teatro e música, Igor Stravinsky incluiu duas peças baseadas no ragtime (“Ragtime Pour Onze Instruments” e “Piano Rag Music”). Maurice Ravel introduziu o foxtrot em algumas partes da sua fantasia lírica “L’Enfant Et Les Sortilèges” e em dois concertos repletos de blue notes (“Concerto In G” e “Concerto Pour La Main Gauche”).
Darius Milhaud foi quem chegou mais perto do jazz quando compôs “La Création Du Monde” com muitos motivos do Harlem e do blues, a começar pela utilização da música “Saint Louis Blues”, de W.C.Handy, como principal referência da composição.
Mais tarde, Stravinski e Hindemith se envolveriam com a música de Benny Goodman, mas este envolvimento se daria estritamente no campo erudito.
Indo num rumo diferente, George Gershwin e Leonard Bernstein combinaram a música erudita com o jazz, mas não chegaram fazer música dançante, que era a tônica do swing.
Em 1900, a música americana ainda não havia sofrido as transformações que a levariam a ser chamada de jazz, mas o espírito de um novo som estava presente na forma de execução das marchas e no ragtime estilizado que John Philip Sousa levou para Londres e Paris com a sua banda. Além do mais, a presença do banjoísta Vess L.Ossman na orquestra trouxe um rompimento de todas as estruturas harmônicas e formas de improviso que os ouvidos daqueles europeus conservadores poderiam conceber na época.
Possivelmente, a celebridade que mais abalou os alicerces da música europeia tenha sido o clarinetista e saxofonista-soprano Sidney Bechet, que se apresentou em 1919 com a Syncopated Southern Orchestra de Will Marion Cook. O maestro suíço Ernest Ansermet proclamou que “Bechet era um gênio”, e anos mais tarde o músico americano teria uma estátua na Riviera Francesa erigida em sua homenagem.
Diversos outros músicos americanos começaram a levar para o território europeu, primeiro os rudimentos do jazz e depois o jazz já totalmente formatado, e muitos músicos do Velho Continente assimilaram com muita propriedade o espírito da nova concepção musical, sendo incentivados a compor e executar coisas semelhantes. No início dos anos 1920, muitas obras com este sentido de renovação já haviam sido produzidas por músicos europeus, alguns decididamente copiando os sons americanos, outros tentando criar um jazz com identidade própria.
O swing fez parte desta nova realidade ao lado do dixieland, e já durante os anos 1930 existiam excelentes grupos orquestrais na Alemanha, na França e na Inglaterra, que no futuro marcariam presença no mundo das big bands com a consolidação das orquestras de Kurt Edelhagen, Max Gregor, Peter Herbolzheimer e Werner Baumgart (na Alemanha), de Claude Bolling, Francy Bolland e Les DeMerle (na França), e de Humphrey Littleton, Ted Heath e Chris McGregor (na Inglaterra), somente para citar as mais conhecidas.
É verdade que no início da Era do Swing os europeus – com exceção dos músicos – viam o jazz mais como uma nova forma de dançar do que como um estilo revolucionário de música, mas ficava patente que alguma coisa diferente estava acontecendo.
E assim, de repente, um continente que tivera que se contentar por muitos séculos com o seu próprio folclore e com as sempre belas e instigantes – mas pouco inventivas – músicas regionais (como as tarantelas italianas, as czardas húngaras, as danzas flamencas, e a coreografia campestre das danças russas e cossacas) podia agora universalizar toda a sua arte musical, fazendo com que holandeses, franceses, italianos, belgas e quem mais fosse pudessem interpretar o mesmo tipo de música, sem maiores necessidades de qualquer ensaio ou mesmo de um prévio conhecimento entre si!
A influência da música americana no continente europeu se fez sentir especialmente nos anos que se seguiram após a Segunda Guerra, em especial na Inglaterra, onde cresceu de forma assustadora, propiciando uma grande escalada do blues – vide Eric Clapton, Jeff Beck, John Mayall, Long John Baldry e outros – e de orquestras diversas, como as de Sidney Lipton, Chris Barber, Freddy Randall e principalmente Ken Colyer.
O jazz chegou na Europa nos primeiros anos do século vinte e de lá nunca mais saiu. Pelo contrário, ele se expandiu, criou raízes próprias e menos de um século depois já rivalizava com os Estados Unidos no interesse do público e na quantidade de intérpretes, compositores, gravações, programas radiofônicos, festivais, clubes e locais de apresentação.