A DESCOBERTA DA PÓLVORA
A
notícia saiu na mídia durante a semana, com o devido estardalhaço:
“Documentos
mostram que a CBF ‘vendeu’ a seleção brasileira – Contrato feito por Ricardo
Teixeira favorece empresário”.
Pode
ter sido uma bomba para muita gente, mas para quem acompanha o futebol e a
seleção, a notícia teve o impacto de um traque junino.
Afinal,
os inexplicáveis amistosos realizados ao redor do mundo e a inexplicável
convocação de jogadores que a rigor não teriam condição de serem chamados
sempre teve um aspecto muito suspeito.
Então
vem o jornal O Estado de São Paulo e revela os dados de um contrato que mostra
como o futebol da seleção brasileira se transformou numa mina de ouro para a
CBF e para alguns empresários. De acordo com o jornal, “a entidade leiloou a
seleção em troca de milhões de dólares em comissões a agentes, cartolas, testas
de ferro e empresas em paraísos fiscais, longe do controle da Receita Federal
brasileira”.
Assim,
de acordo com a denúncia, a CBF não apenas estaria cometendo falta de ética como
também incorrendo em crimes fiscais, puníveis pela lei.
Pelo
acordo, a convocação dos jogadores deveria atender a certos critérios
estabelecidos pelo parceiro comercial da CBF, ou seja, a necessidade de
valorizar este ou aquele atleta com vistas a ser negociado com o mercado
internacional e a escolha do local e dos horários dos amistosos deveriam
obedecer à conveniência da exposição dos convocados e à negociação dos
parceiros da CBF com outros parceiros.
O
jornal publicou a minuta do contrato firmado entre a CBF e a Internacional
Sports Events (nome híbrido meio português-meio inglês), empresa sediada nas Ilhas
Cayman tendo como testa de ferro o Grupo DAG – Dallah Albaraka Group, sediado
na Arábia Saudita.
Pelo
contrato, a CBF cede os direitos de exclusividade para “organizar, hospedar,
realizar, administrar, comercializar e produzir as partidas da seleção brasileira
em qualquer lugar do mundo, inclusive no Brasil”, e assegura que os jogadores
que estarão em campo “serão sempre aqueles considerados titulares”,
ressalvando-se os que eventualmente sejam convocados atendendo aos interesses
dos parceiros.
O
contrato havia sido assinado em 2006 e foi renovado em 2011 por meio de um
aditivo, sendo ambas as vias assinadas pelo então presidente Ricardo Terra
Teixeira e por Moheydin Kamel, sócio do Grupo DAG, em nome da ISE.
Em
2012 a ISE tornou a transação ainda mais nebulosa, sublicenciando o contrato
para a Kentaro, empresa que passou a administrar a operação.
Como
o mandato de Teixeira estava no fim, coube a outro empresário, Juan Figger,
costurar um acordo com a dupla José Maria Marin-Marco Polo Del Nero, que iriam,
cada um a seu tempo, substituir o presidente no comando da entidade.
O
fato é que Teixeira alinhavou todo o esquema e foi um vencedor porque mesmo
fora da CBF continua mandando na seleção (da qual ainda recebe um salário de
cerca de 100 mil reais por mês como “assessor internacional”) ao lado dos seus
parceiros comerciais, porque o contrato somente expira em 2022, a não ser que
haja um distrato entre as partes o que, convenhamos, é muito pouco provável,
considerando os milhões de dólares envolvidos.
Assim,
a não ser que o barco venha a soçobrar por conta de algum mal feito detectado
pela Receita Federal e que daí surjam uma CPI, uma intervenção da Procuradoria
Geral da República ou uma investigação feita pela Polícia Federal, o senhor Teixeira e os seus parceiros comerciais não
terão motivos para preocupação (desde que a seleção não se desvalorize a ponto
de perder mercado, o que também é altamente improvável).
A
notícia bomba do O Estado de São Paulo pode ser uma redescoberta da pólvora,
mas seu poder de destruição é muito pequeno, com exceção do rombo formidável
nos cofres da CBF e nas finanças do Brasil, que vê o seu dinheiro bem guardado
nas Ilhas Cayman sem receber um tostão de imposto.
(Artigo publicado no caderno SuperEsportes do
jornal O Imparcial de 22/05/2015)